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Europa

A Grécia em uma armadilha

30/04/2010

A economia grega está numa armadilha. Uma “espiral mortal em direção ao default”, conforme Paul Krugman. Quanto mais os capitais financeiros internacionais suspeitam que a Grécia pode deixar de pagar suas dívidas, maiores interesses lhe cobram para provê-la de fundos. Mediante este mecanismo, a dívida que hoje alcança 113% do PIB cresce de maneira cada vez mais acelerada, as possibilidades de pagamento se tornam cada vez mais duvidosa com a qual o preço dos bônus cai, os juros crescem e o risco de default se torna mais intenso. Após o acordo incerto de 25 de março [1] dias atrás, a Comissão Européia, o Banco Central Europeu e o FMI buscaram, sem êxito, acalmar os mercados financeiros internacionais em relação ã situação da Grécia. Elaboraram um “plano de salvamento” mais concreto em cifras que o anunciado previamente, ainda que igualmente indefinido em relação aos prazos e ás condições de sua efetiva aplicação.

Segundo o acordo, que só será levado em prática em caso de emergência, os membros da eurozona aportariam no primeiro ano com 30 bilhões de euros (a Alemanha contribuiria com aproximadamente 28% seguida da França, Itália e Espanha) a uma taxa de juros de 5% enquanto o FMI aportaria 15 bilhões de euros a uma taxa de cerca de 3%. O anúncio, não obstante, ainda que tenha acalmado levemente os mercados por uns poucos dias não conseguiu reverter a situação que, pelo contrário, foi piorando. Desde janeiro a Grécia tomou emprestado 25 bilhões de euros e teriam cobertos seus vencimentos daquele mês. O problema é que deve enfrentar vencimentos de 11 bilhões em maio, e cerca de 40 bilhões antes do final do ano. Nos últimos dias os bônus a dez anos a Grécia emite por sua dívida chegaram a pagar 7,8% de juros, cifra recorde que está por cima da taxa que forçou o pré-acordo do Eurogrupo.

A Grécia, além disso,viu cair por terra a esperança de colocar nos EUA um bônus criado para reunir parte dos fundos necessários para afrontar os vencimentos de maior, como também fracassou há um tempo na tentativa de obter financiamento na Ásia. Frente a esta situação, nos últimos dias a Grécia solicitou oficialmente a “ajuda” oferecida pela eurozona e o FMI. Atualmente se encontra em Atenas uma delegação de ambas as instituições, negociando as condições do “salvamento”.

A histeria européia sobre as condições de um plano que anuncia em cotas responde a múltiplos fatores. Entre isso, ganhar tempo buscando impor relações de força mais categóricas entre os grandes participantes da zona euro. Ainda que a Alemanha tenha tentado mostrar ao mundo quem realmente manda na eurozona e impôs suas condições na primeira rodada [2], se viu obrigada a retroceder no segundo acordo frente ás pressões da França e da Itália.

Por sua vez, desde o ponto de vista da política interna, o tempo é uma questão chave, pois em 9 de maio há eleições regionais na Alemanha, onde existe uma forte oposição da população a dar qualquer plano de salvação ã Grécia. Mas para além destes fatores, o resultado consiste um verdadeiro jogo de desgaste sobre a economia grega. Quanto mais se atrasa a definição do “plano de salvamento”, mais caro custa ã Grécia se financiar no mercado de capitais e mais próximo fica do default. Nestas condições, a taxa de juros altíssima que é oferecida pela eurozona se torna “favorável” se comparada com os juros cobrados pelo mercado. Assim, enquanto os capitais financeiros mundiais (fundamentalmente europeus – em primeiro lugar alemães e depois franceses) se garantem taxas de juros superlativas pelo dinheiro que lhe empresta, a Grécia se vê obrigada a ajoelhar-se cada vez mais frente ás condições que a Europa e o FMI lhe exigem a em troca de “ajuda”.

Com “ajudas” como esta…

Durante o período de bonança os bancos alemães, franceses e britânicos financiaram o endividamento público e privado da Grécia, as multinacionais alemãs e francesas foram se apoderando do mercado grego estimulando seu déficit comercial e avançaram entre outras coisas sobre o controle de sua rede telefônica e energética. Frente ao avanço da crise vão por muito mais. Agora, os membros da eurozona, pedem em troca do “resgate” que o governo grego privatize um conjunto de empresas estatais como a telefônica, as metalúrgicas e a loteria. Em que consiste o resgate? Se trata de emprestar ã Grécia os fundos a um juros muito superior ao que a Alemanha paga no mercado (que obtém fundos a cerca de 3,5%) para que a República Helênica “honre suas dívidas” com os piratas alemães e franceses. Mas como os bancos alemães e franceses são os maiores credores da Grécia, a operação consistiria em realidade em um resgate de seus próprios bancos, cobrando juros muito mais altos que o que pagariam no mercado.

A Grécia, além disso, deveria ceder-lhes, por semelhante favor, engrenagens centrais de sua economia. Isso significa um plano ainda pior – se é que isto é possível – que a estafa do Plano Brady ao qual distintos países latino-americanos foram submetidos nos anos 90, sob a mão do Consenso de Washington. Por sua vez, o FMI em troca de uma taxa de juros menor exige, como advertiu seu diretor geral Dominique Strauss-Kahn, um processo geral de deflação, isto é, reduzir ainda mais salários e preços para que a Grécia aumente sua “competitividade”. Como conclusão, o FMI junto com o Eurogrupo e outros membros da União Européia por fora da zona do euro, como a Suécia, exigem além da entrega de setores chave da economia grega ao capital mais concentrado europeu uma redução mais profunda do déficit (que implica um estrangulamento do emprego público – que conta com um milhão de trabalhadores – das aposentadorias) , e um corte brutal dos salários públicos e privados (se comenta que estariam exigindo a abolição dos convênios coletivos de trabalho) para que a Grécia, mantendo-se nos marcos do euro conseguisse voltar a ser “competitiva” frente ã Alemanha e a ã França. Deste modo, obteriam o superávit comercial necessário para “honrar suas dívidas”. O pequeno problema desta genial estratégia é que a Grécia durante seus onze anos de permanência no euro foi convertida em cliente da Alemanha e França, que estimularam persistentemente seu déficit comercial alentando um progressivo processo de desnacionalização de sua economia. Diga-se de passagem, um dos fatores que permitiram a Alemanha grande competitividade externa foi que durante os anos 90 foi o país que mais claramente manteve uma política de redução de custos salariais. Os salários brutos nominais aumentaram 1% entre 1996-2006 na Alemanha, enquanto que no resto da zona euro cresceram quase 2,8% (Dados extraídos do jornal La Jornada 7-04-2010). Para que a Grécia alcançasse os níveis de competitividade tão só em termos salariais, já não de uma Alemanha, mas de uma França, deveria reduzir o custo laboral (isto é, os salários) cerca de 25% (Les Echos, jornal de economia de Paris, 31-3-2010)

Grécia: um espelho

A Grécia está se transformando em um caso sintomático.Todos olham a Grécia e se vêem na Grécia. O Eurogrupo e a União Européia com a cumplicidade do FMI estão esticando, devido ás suas próprias debilidades, a corda demasiadamente. O ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, acaba de dizer ao semanário ‘Spiegel’ que “não podemos permitir que a Grécia seja um segundo Lehman Brothers”. As condições catastróficas da economia grega já estão deixando transcender que sua dívida impagável terá que ser reestruturada de alguma maneira. O problema é se esta “reestruturação” se produzirá de forma caótica como aconteceu com a Argentina em 2001, ou de forma relativamente “ordenada” com a colaboração direta dos abutres alemães, franceses e do FMI.

Se a Grécia entra em default é muito provável que seja seguida por outros países que se encontram em uma situação similar como Portugal, Irlanda e pior ainda Espanha e Itália que, de conjunto, enfrentam vencimentos para o ano em curso superiores aos 40 bilhões de euros. Em uma situação semelhante a viabilidade do euro ficaria fortemente questionada. As contradições inter-estatais que durante um período de relativa “bonança” foram subsumidas sob relações imperialistas um tanto light, em época de crise se põem de manifesto de forma descarnada. As desigualdades entre estados já não podem conviver sob a fórmula da moeda única, o euro, e sob a falácia do “supra-estado” europeu. Mas se a Grécia aceita todas as condições e se o “resgate” finalmente se concretiza é muito provável que se produza um salto na luta de classes que também arrisca ser contagioso. Seria outra via pela qual o euro e o “supra-estado” europeu se veriam seriamente questionados. A Grécia está frente a uma encruzilhada profunda. As variantes oferecidas tanto pelos capitais financeiros internacionais como pelos Estados imperialistas europeus e pelo FMI, a conduzem invariavelmente para uma tragédia moderna. A disjuntiva da Grécia se coloca entre a tragédia do capital e desenvolvimento da luta de classes no caminho da revolução operária e socialista.

Mas muito para além da Europa, no distante espelho grego também se vêem refletidos outros “grandes”, como os EUA. Os Conselheiros do governo de Obama como Paul Krugman olham a Grécia e sofrem…porque quanto más se agrava a crise grega mais medo eles têm, devido a que mais explícita fica a vulnerabilidade do próprio endividamento norte-americano. Mais temem então que se imponham os “falcões partidários do dinheiro escasso”, isto é, os que estão por aumentar as taxas de juros que, caso se imponham, como disse Krugman “pode acontecer qualquer cosa”. A economia capitalista mundial se esquivou de uma depressão graças ao salvamento quase imediato dos Estados. Mas agora, estes, tendo só chutado a crise para adiante, se converteram no alvo principal. Estamos frente aos primeiros elementos de um novo capítulo da crise econômica internacional [3] que é aquele da crise da dívida pública, e a Grécia é o espelho em que, para além dos tempos em que este episodio se desenvolve, todos se vêem refletidos.

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