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Entre crise econômica e movimento da oposição direitista
por : Milton D’León

22 Feb 2015 | Uma série de atos vem marcando a realidade política do país nos últimos dias, entre eles, dois que se destacam. Por um lado, o início do novo sistema cambial que vem acarretando uma forte deflação da moeda em meio a uma crescente escassez, inflação e recessão. Por outro, as ações de uma oposição direitista relembrando um ano de ações que buscaram forçar a (...)
Entre crise econômica e movimento da oposição direitista

Uma série de atos vem marcando a realidade política do país nos últimos dias, entre eles, dois que se destacam. Por um lado, o início do novo sistema cambial que vem acarretando uma forte deflação da moeda em meio a uma crescente escassez, inflação e recessão. Por outro, as ações de uma oposição direitista relembrando um ano de ações que buscaram forçar a saída do Governo de Maduro que terminaram em fracasso, mas que nestes primeiros meses do ano estão buscando retomar com a boa ajuda do direitismo continental e do Governo Obama.

Pela primeira vez em doze anos, com apenas um formulário preenchido e a apresentação do documento de identidade, qualquer pessoa, a partir desta quinta-feira, pode comprar de maneira oficial um máximo de 300 dólares a um câmbio de 172,05 bolívares por dólar, uma quantidade quase 30 vezes superior aos 6,3 bolívares por dólar do câmbio oficial fixo mais baixo, e quase 15 vezes também superior ao segundo câmbio oficial que opera por meio de leilões e que começará a operar a 12 bolívares por dólar.

Trata-se da abertura de operações ao varejo de terceiro tipo de câmbio oficial, conhecido como Sistema Marginal de Divisas (Simadi). Este opera em livre flutuação segundo o “mercado”, que complementa o primeiro sistema fixo cuja taxa é de 6,30 bolívares por dólar (com prioridade para compra de alimentos, medicamentos e insumos básicos), e o Sistema Complementário de Administração de Divisas (Sicad) a taxa de 12 bolívares por dólar. O Sicad será destinado a importação de produtos e insumos para o setor produtivo, mas flutuará por um sistema de leilào, esperando que em pouco tempo alcance uma média entre 12 e 50 bolívares por dólar. Tanto o Sicad como o Simadi não implicam mais que outra série de desvalorizações que leva a cabo o Governo de Maduro, que se empenha em negá-lo, onde inclusive o terceiro sistema é uma macro-desvalorização, e não é outra coisa senão a legalização do mercado paralelo.

Embora este mecanismo de Simadi começou a funcionar semana passada para o comércio de somas superiores a 3 000 dólares e ilimitado por meio dos bancos, a novidade de hoje foi a venda ao varejo. Para abastecer este mercado, o Banco Central da Venezuela (BCV), anunciou na quarta-feira mais de 4,2 milhões de dólares a 23 entidades entre casas de câmbio, bancos e a Bolsa Pública de Valores por um sistema de leilào destinado a venda de um efetivo, com um tipo de câmbio resultante de 171,62 bolívares por dólar. Neste novo sistema, os vendedores de divisas poderão ofertar a quantidade que quiserem, sem embargo aos compradores do varejo, superior ao limite diário de 300 dólares, não poderão adquirir mais de 2000 dólares mensais ou mais de 10000 anuais.

Como havíamos explicado em outros artigos, o Governo nacional autorizou as empresas que adquirem dólares com o mecanismo Simadi para a importação de produtos, para que repassem este tipo de câmbio a estrutura de custos, o que significa um forte impacto nos preços que encarecem a vida do povo venezuelano, principalmente aos setores pobres e assalariados que suas rendas se encontram estancados e seus valores reais caindo.

Em meio a uma situação econômica opressiva

O Governo impulsiona estas políticas em meio a uma forte recessão econômica que não encontra saída e ameaça aprofundar-se este ano, o aumento de preços devido ã alta inflação que oficialmente fechou em 68,5% em 2014, que no serviço de alimentos alcançou os 86,7%, e se relacionarmos com a inflação anual de 2013, teremos um salto de 124% no custo de vida. Ao mesmo tempo se vive uma aguda escassez que golpeia fortemente e que se tem agravado nos últimos meses de janeiro e fevereiro, tão alta que desde o Governo se deixou de publicar este indicador econômico. A escassez está cada vez maior, forçando milhares de pessoas a entrarem as filas em busca de produtos básicos. A cesta básica foi-se pelas nuvens enquanto os salários e rendas das casas populares vão para baixo, desvalorizando-se permanentemente.

Não obstante, o governo continua sobrecarregado pelos compromissos da dívida externa, justo quando os preços do petróleo desabaram, reduzindo as rendas a mais da metade. Apenas para ressaltar cifras mais recentes: no ano de 2013 pagaram-se 5,8 bilhões de dólares, ao final de 2014 cancelaram 7,1 bilhões, e segundo dados da Barclays Capital, a Venezuela deverá pagar em 2015 quase 11 bilhões de dólares entre títulos soberanos e dívida da estatal Petróleo da Venezuela. Para tentar afugentar rumores de omissão, Maduro declarou que demonstrará a “honra” que desfruta desde Chávez no que diz respeito a pagar a dívida, enfatizando que o país “mantém um registro impecável com o pagamento de cada uma de suas obrigações”, e que continuará pagando “até o último dólar”.

Assim vemos como o Governo sede as pressões internacionais, como também aos pedido dos empresários locais em liberar preços ou autorizar o aumento dos mesmos, principalmente os da cesta básica, e aumenta as facilidade para a aquisição de divisas, autoriza demissões nas fábricas, enquanto implementa uma série de medidas de ajuste por etapas.

A única coisa que ocorre ao Governo é transferir ao povo, para além de seu argumento banal de bem-estar social, liberando preços, como os 48% no aumento da farinha de fubá – elemento essencial na dieta popular- , ou os 40% no transporte público urbano, de onde o aumento dos combustíveis vêm de encontro, que será uma das mais baixas do mundo e terá como resultado um repasse automático a todos os bens essenciais.

Uma direita que enfileira suas armas para aproveitar as crises

Por sua vez, a direita, em meio ás crises que o país atravessa, busca capitalizá-la convocando mobilizações políticas massivas que não chegam a ser como tal e tem alcançado poucos resultados. Inclusive os impactos das mesmas não chegam a ter força para romper ou “cerrar fileiras” (alguns analistas políticos chamam de “coesão”) que vem tendo as forças chaves do chavismo em redor de Maduro, mostrando-se sem fissuras significativas, e sem incidir tampouco decisivamente nas próprias Forças Armadas. Tudo isto apesar do apoio que vem tendo o bloqueio opositor a partir da direita continental e do próprio presidente Obama com resoluções que busca sancionar integrantes do Governo Maduro.

Neste mês de fevereiro, a direita não deixou de aproveitar a recordação das ações impulsionadas pelo setor mais duro do círculo do bloco opositor, quando tensionou o país durante os meses de fevereiro e março do ano passado, aproveitando também a data do dia da Juventude, chamando a mobilizações pela liberação de Leopoldo López (detido durante esses meses e o principal articulador junto a Maria Corina Machado e Antonio Ledezma no que se deu a conhecer como “A Saída” para forçar a derrubada do Governo). Mas além dos atos que tiveram certo eco nos meios, por seu determinado caráter de violência, os chamados não apresentaram a massividade esperada, e o Governo Maduro aproveitou para aplicar mão dura.

O pouco impacto que se teve é reconhecido pelos analistas, como a historiadora Margarita López Maya, que tem uma inclinação a atuar junto ao bloco opositor, quando constata que “sem embargo, convocatórias para mobilizações políticas massivas tem alcançado poucos resultados...”. Ressaltando que “agora existem vários fatores que inibem e freiam as ações da rua”, entre eles “que há uma percepção negativa generalizada sobre os resultados de esforços coletivos anteriores” e que “o conquistado não satisfez as expectativas, no que faz ver o custo de sair ã rua muito alto e com escassos resultados”. Mas onde somente esta analista vê, a força dura de resposta do Governo, não atenta também ã falta de capacidade do bloco de direita de convocar grandes manifestações massivas que costumavam ter em outros momentos

O povo trabalhador deve irromper no cenário nacional

Mas a situação que se configura no país é a de maior tensão, inclusive maior que a do ano passado, numa combinação de crises econômicas e crises políticas que reinam no país, em meio a uma etapa convulsiva em que se vive. Tudo isto no marco em que o chavismo já não conta mais com as condições econômicas e políticas para seguir governando como antes, aceleradas após a morte de Chávez, em meio também a uma fase de completa decadência do mesmo chavismo. A própria crise do chavismo não se faz mais intensa, entre outros motivos, porque a oposição de direita não avança tão rápido como querem por suas divisões internas, e também não configura-se uma nova correlação de forças que lhe conceda hegemonia, ainda que trabalham para isto, aproveitando a crise.

Nesta situação aberta, a classe trabalhadora em aliança com o conjunto dos explorados, como o campesinato e o povo pobre, deve irromper com força e independência frente ao governo e a oposição. Trata-se de uma classe que representa uma enorme força potencial que, ao aparecer no cenário nacional com suas próprias demandas e métodos de luta, pode introduzir novos valores nesta equação, fazer-se pesar na nova configuração de forças que se disputa no país com uma política de independência tanto do chavismo quanto da oposição, e evitar que continuem descarregando a crise sobre suas costas.

 

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