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A crise segue aberta no país e regionalmente
04 Jul 2012 | Frederico Franco, ex-vice de Lugo, instalado no Palácio López graças ao golpe “institucional” de 22 de junho, busca consolidar seu governo e conjurar as duas frentes que o questionam: o isolamento internacional...

Por: Eduardo Molina

Frederico Franco, ex-vice de Lugo, instalado no Palácio López graças ao golpe “institucional” de 22 de junho, busca consolidar seu governo e conjurar as duas frentes que o questionam: o isolamento internacional impulsionado por Brasil e Argentina e o rechaço de setores populares. O golpe encoberto nos mecanismos constitucionais recorreu a uma paródia de julgamento político “expresso” (em 24h), com o pretexto do massacre de Curuguaty (onde morreram uma dezena de camponeses e vários policiais). Há tempo se falava de um eventual julgamento político e quando Lugo precisou tratar de um câncer, tentaram usar sua doença como pretexto para retirá-lo do poder. Agora, a operação se resolveu com ampla maioria congressual graças ao pacto entre o Partido Liberal (PRLA, partido burguês tradicional que formou parte da aliança encabeçada por Lugo) e a oposição direitista “colorada”. Os golpistas também tem o apoio da maioria da classe dominante e os “fatores de poder” (câmaras empresariais e latifundiários, Forças Armadas, Igreja e mídia). Contudo, Lugo ainda detém certa legitimidade política e social em meio a uma crise que segue aberta.

O imperialismo

O porta voz do Departamento de Estado, Darla Jordan, chamou os “paraguaios a atuarem pacificamente, com calma e responsabilidade, no espirito dos princípios democráticos paraguaios”, sem condenar o golpe nem qualifica-lo como tal, enquanto a diplomacia norte-americana manobra na OEA com seus aliados, como México, Guatemala etc., para ganhar tempo e evitar uma condenação argumentando que “chegar a conclusões de maneira precipitada não seria produtivo”, o que equivale a facilitar a consolidação de Franco.

De fato, parece pouco provável que as elites de Assunção levaram adiante o golpe sem contar com algum sinal de que ele seria mantido, e ainda menos provável que a embaixada não sabia o que estava sendo tramado, já que mantem estreitos laços com o exército, a polícia e as elites do país. O imperialismo parece muito disposto a dar um visto de aprovação. A oligarquia paraguaia é historicamente uma estreita aliada dos EUA. Sob Lugo esses laços não foram quebrados e, pelo contrário, o imperialismo manteve facilidades aeroportuárias no Chaco (estratégicas para planos de desenvolvimento militar para o Cone Sul), assessores e ingerência na polícia e Forças Armadas, e conseguiu inclusive a aprovação de uma Lei Antiterrorista.

Um golpe com sabor de soja e cheiro de esterco

O problema candente no Paraguai é a enorme concentração de terras: 85% do sólo está nas mãos de 2% dos proprietários – latifundiários e empresas dedicadas ã soja e ã pecuária –, enquanto centenas de milhares de famílias camponesas e indígenas não tem terra. Essa oligarquia consolidou seu poder sob a ditadura stronnista e os governos que lhe sucederam, entrelaça seus negócios com a corrupção nas grandes represas binacionais, o contrabando e o narcotráfico e está ligada na agroindústria ás transnacionais do ramo como Monsanto. A política de Lugo de cooptação e negociação com os movimentos camponeses, com falsas e não cumpridas promessas de reforma agrária, irritou profundamente, mas ainda que Lugo foi se inclinando a uma maior repressão contra as ocupações de terra e outras mobilizações, isso não foi suficiente para os latifundiários.

Uma crise regional

O golpe abriu uma crise regional, ao romper o equilíbrio geopolítico no coração do Cone Sul e afetar diretamente os interesses do Brasil. Não só pelos interesses de agricultores de origem brasileira (os assim chamados “brasiguaios”), o abastecimento energético com Itaipú etc., mas sim porque “a remoção de Lugo representa um teste para a liderança do Brasil na América do Sul” (The New York Times, 26/06). Os acontecimentos em Assunção poderiam derivar em que o país se convertesse em um calço pró norte-americano entre o Brasil e a Argentina.

O antecedente de Honduras e as possíveis saídas políticas

São várias as similitudes com o antecedente do golpe em Honduras, avalizado por EUA e cujo objetivos (manter Honduras na órbita pró-ianque) foram garantidos com as eleições que consagraram a Porfírio Lobo e a derrota do movimento de resistência, enquanto que a política de gestos diplomáticos do Brasil, Venezuela e outros países se mostrou completamente impotente e terminou reconhecendo a Lobo. É possível que mantendo a cobertura constitucional com Franco, se termine negociando um adiantamento das eleições previstas para abril de 2013, o que permitiria legitimar a queda de Lugo e assegurar um novo governo de direita, possivelmente com Horácio Cartés, pré-candidato do Partido Colorado e que poderia terminar sendo o principal beneficiado do golpe ainda que Franco tenha assumido o governo.

UNASUL

É preciso ver até onde Brasil, Argentina, Venezuela e demais países da UNASUL levarão seu rechaço ao golpe na reunião convocada para sexta, 29, em Mendonza. Por enquanto, o Brasil parece ser mais cauteloso (chamou a consultas seu embaixador e adiantou que não colocaria sanções econômicas). Tão pouco Argentina parece desposta a ir muito mais a frente por essa via.

O que menos querem Dilma, Cristina e outros governos da região, é que a crise paraguaia derive em uma desestabilização maior, ou que, por exemplo, a guerra camponesa pela terra alente conflitos similares em seus próprios territórios. Ainda assim, é difícil que possam aceitar sem mais o golpe consumado e por ele, o elemento mais agudo e dinâmico até agora é o da crise política e diplomática regional, um complexo e incerto processo de negociações por vir.

A política de Lugo

Lugo, que até o último momento fez concessões e buscou pactuar com a direita (depois do massacre de Caraguaty nomeou um representante da direita como ministro do interior), aceitou a destituição em seu primeiro discurso público. Só depois, sob o alento brasileiro e argentino, se animou a iniciar uma tímida campanha de denúncia insistindo em que as demonstrações sejam pacíficas. Agora, desistiu de assistir a reunião da Unasul “para não pressionar aos governos”, o que ratifica que não está disposto a encarar uma luta a fundo contra o golpe. É possível que independente de suas denúncias, seu verdadeiro objetivo se limite a se manter ã frente do bloco anti-golpista e conseguir alguma negociação para seguir vigente como a “alternativa progressista”. Se, durante seu mandato, o não cumprimento das promessas eleitorais, como a reforma agrária e outras, havia gerado descontentamento e afastamento da sua base social, enquanto que permitia o fortalecimento da direita, agora, com essa política, mostra que não está disposto a afetar os interesses da oligarquia paraguaia nem chamar as massas a se mobilizarem como seria necessário para derrota-la.

Como desenvolver a resistência?

Esse papel do ex-bispo é o que explica a escassa resposta nas ruas nos dias posteriores ao golpe do dia 22. Contudo, se bem em Assunção parece se manter a calma, com o correr dos dias varias organizações (como a Associação Nacional de Acampados e o Movimento Popular Camponês) tem anunciado mobilizações e até algumas concentrações em localidades do interior. Entretanto, a Frente Guasú – luguista – e outros setores anunciaram a formação de uma Frente pela Defesa da Democracia com uma política de “resistência pacífica” e insinuando o pedido de adiantamento de eleições. Essa linha de pressão sobre o regime e confiança nos “governo amigos” não serve ás necessidades de luta para derrotar o golpe e frustrar os planos da oligarquia e o imperialismo.

Por um programa de mobilização operária e camponesa

Defendemos o direito democrático elementar das massas exigirem a reposição de Lugo, mas ao mesmo tempo chamamos a não se subordinarem a sua política capituladora e confiar só em suas próprias forças. É preciso desenvolver a mobilização operária e camponesa, independentemente e com seus próprios métodos de luta e auto-organização, com um programa de ação que combine a luta contra o golpe e os planos de Franco, com as demandas operárias, que vem sendo o grande motor da mobilização agrária. Isso inclui a demanda de uma Assembleia Constituinte livre e soberana para se discutir e decidir todos os grandes problemas nacionais. Ao calor dessa luta poderá se abrir a perspectiva de um governo operário e camponês como única garantia ã íntegra resolução das demandas do povo trabalhador.

Solidariedade internacional com a luta do povo paraguaio

Evo, Cristina e outros governos “progressistas” da região (incluindo Rafael Correa e Hugo Chávez) usam a denúncia do golpe paraguaio para afirmar que haveria diversas conspiração em marcha, como chantagem contra setores de trabalhadores e camponeses que se mobilizam por demandas legítimas. Não há uma linha generalizada de golpes nesse momento, mas o que não dizem é que é sua própria política de colaboração com a burguesia e as transnacionais, para que a crise seja paga pelo povo trabalhador, o que favorece a direita. Longe de confiar em suas declarações contra o golpe, a solidariedade efetiva com o povo paraguaio recai nos povos irmãos.

Na Argentina, mas também no Brasil, vivem milhões de irmãos paraguaios, emigrantes jogados fora do seu país pela miséria e a opressão, e que hoje são parte das classes trabalhadoras do Cone Sul. Estão chamados a cumprir importante papel na luta contra o governo de Franco e para impulsionar junto ás organizações sindicais, estudantis, de direitos humanos etc., da Argentina, do Brasil e de todo o continente, uma grande campanha de solidariedade internacional com a luta anti-golpista do povo paraguaio exigindo a ruptura de relações com Franco e fora as mãos imperialistas do Paraguai!

quinta-feira, 28 de junho de 2012

 

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