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Rumo ao fim do “padrão dólar”?
por : Paula Bach

09 Sep 2011 | Sob as condições gerais de uma quase segura recessão nos EUA e Europa, uma profunda instabilidade financeira com permanentes quedas nas bolsas e a persistente ameaça de crises bancárias...

Sob as condições gerais de uma quase segura recessão nos EUA e Europa, uma profunda instabilidade financeira com permanentes quedas nas bolsas e a persistente ameaça de crises bancárias, grandes massas de capitais internacionais se dirigem até ativos que são considerados “reservas de valor” [refúgios de valor]. A mercadoria ouro, que atuou como equivalente geral e resseguro dos intercâmbios internacionais junto com o metal de prata durante o século XX e sob a forma de equivalência geral com o dólar até o fim dos acordos de Bretton Woods em 1971, é o mais importante destes ativos. Junto ao ouro, não obstante, também atuam como reserva de valor outros ativos como o é fundamentalmente o franco suíço que não casualmente foi a última moeda em abandonar completamente o padrão ouro mantendo até o ano de 1998 um respaldo em ouro de 40% dos francos em circulação. Mas se o incremento do preço do ouro, que alcança hoje a cifra histórica de 1.900 dólares a onça (aproximadamente 28 gramas), não prejudica diretamente a moeda nem a economia de nenhum país em particular, não ocorre o mesmo com a sobrevalorização das moedas nacionais. A revalorização do franco suíço associada a seu papel de refugio de valor, perturba diretamente a economia do dito país na medida em que seus produtos e serviços valorizados em francos se tornam progressivamente menos competitivos no mercado internacional. Esta situação conduziu o governo suíço a implementar uma desvalorização lastreando [atando] o valor do franco ao do euro a través do estabelecimento de um mínimo de 1,20 francos por cada euro que o Banco Nacional da Suíça alertou que vai defender comprando todos os euros e moedas que sejam necessários. A medida detonou uma bancarrota da divisa helvética de 9% frente as principais moedas com uma importante perda de lucros dos capitais que haviam apostado o franco e uma possível tendência a uma maior exclusividade do ouro como reserva [refúgio] de valor.

Desvalorização competitiva e crise monetária internacional

A medida defensiva da Suíça ao adotar um tipo de cambio semi-fixo constitui de fato uma desvalorização competitiva já que o governo se dispõe a defender as condições de lucro de suas próprias multinacionais da indústria e o turismo que entrariam em situação temerária ante um franco que se revaloriza ao ritmo da crise econômica mundial. Com esta medida considerada histórica a Suíça abandona o sistema de tipo câmbio flexível que vigorava no país desde 1973, isto é, dois anos depois do fim dos acordos de Bretton Woods.
A desvalorização do franco é um efeito derivado da crise econômica, financeira e monetária internacional que tem como uma de suas formas mais agudas de manifestação a extrema vulnerabilidade tanto do dólar como do euro. É provável que esta medida coloque em questão (ainda que de forma indireta) a efetividade dos mecanismos monetários, tanto de variação da taxa de juros quanto de emissão monetária, aos que os Estados Unidos apelaram para burlar sua decadência econômica e seu endividamento crescente desde a década de ’70, e estejam agregando um fator qualitativo ã crise do “padrão dólar” que vem desenvolvendo-se desde o estalar da crise econômica mundial em 2007/2008 e que teve distintas manifestações e episódios como a incipiente “guerra de moedas” dos fins do ano passado ou as múltiplas e recorrentes discussões ao redor da utopia de estabelecer um novo sistema monetário internacional.

Ponto de inflexão

Tanto o manejo da dívida do Estado Norteamericano como o sistema de “cambio flutuante” da maioria das moedas, constituíram desde os anos 70 mecanismos chaves que permitiram sustentar a supremacia do dólar facilitando-lhe aos Estados Unidos descarregar a crise sobre seus competidores. Em 1973 Estados Unidos estabelece um sistema de câmbio flutuante das moedas provocando uma forte desvalorização do dólar frente ao marco e ao iene [yen] restaurando por essa via a crítica situação da competitividade norteamericana e conseguindo retornar as condições de superávit comercial. Um forte incremento das taxas de juros em 1979 (que provocou a crise das dívidas latinoamericanas e inaugurou a “década perdida” na região) restabeleceu o poder do dólar que havia entrado em uma espiral descendente como subproduto da derrota militar no Vietnã, o ascenso de massas iniciado no ano de 68 e a progressiva perda de competitividade da economia norteamericana. Mais tarde em 1985, uma nova desvalorização do dólar que se operou no marco dos denominados Acordos de Plaza, reestabeleceu a competitividade do dólar frente ao iene [yen] fundindo a economia japonesa na depressão por mais de uma década. Estes mecanismos junto ao endividamento acelerado desde os anos ’80 subvencionado em particular pela “economia” da China, Japão e os países árabes, foram elementos de muito peso que no marco do processo de restauração neoliberal que se impôs desde a década de ’80, permitiram sustentar a supremacia do dólar. Sem ir mais longe das medidas de “relaxamento quantitativo” implementadas nos últimos anos pelo governo de Obama, contribuindo para a desvalorização do dólar e favorecendo a débil recuperação da economia norteamericana desde fins de 2009. Mas o desenvolvimento das condições da atual crise impõe sérios obstáculos ã continuidade destes mecanismos. A manutenção das taxas de juros em um nível próximo a zero e novas medidas de “relaxamento quantitativo” que a Reserva Federal norteamericana [FED – Banco Central dos EUA] anunciaria durante o mês em curso encontram novos limites tanto na situação da dívida dos Estados Unidos como em uma possível propagação de medidas similares a adotada pelo governo da Suíça. Esta situação pode estar anunciando um ponto de inflexão à livre flutuação da maioria das moedas que vieram atuando como um handicap para Estados Unidos desde o fim dos acordos de Breton Woods.

A política do governo helvético está indicando o alerta de um possível “já não mais” do câmbio flutuante (claro está com maior ou menor intervenção do estado) das moedas. Se imaginamos um contexto em que as autoridades monetárias dos distintos países atuaram imitando a suíça e controlando os tipos de câmbio, as modificações que os Estados Unidos operem sobre sua taxa de juros e as próprias medidas de “relaxação quantitativa” poderiam acabar resultando neutras, ou seja, não modificariam o valor do dólar e por tanto agregariam um limite a atualmente reduzida capacidade norteamericana de empurrar a crise sobre seus competidores mediante manipulações monetárias. A combinação do limite ã possibilidade do endividamento do governo norteamericano somada a um possível fim da livre flutuação da maioria das moedas redundaria em sérios obstáculos para as políticas monetárias dos Estados Unidos. Ambos aspectos ameaçam em perspectiva a efetividade já limitada tanto das políticas de redução da taxa de juros de curto prazo como das medidas de facilidade quantitativa que buscam modificar a taxa de juros de prazo largo. Estas questões tenderiam a debilitar ainda mais o papel do dólar a nível internacional. No marco da instabilidade e das tendências recessivas mundiais, estamos vendo sintomas de possíveis desvalorizações competitivas e guerras de moedas que ainda sem existir moeda alguma que substitua, questionaram mais em profundidade a continuidade do “padrão dólar” e derivarão em um incremento das contradições fortalecendo as tendências a um maior enfrentamento entre os estados capitalistas.

Quinta-feira, 8 de setembro de 2011

tradução: Iuri Tonelo e Flávia Adamski

 

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