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Histórica jornada de manifestação na França
por : Ciro Tappeste , Juan Chingo

18 Oct 2010 | Depois de três jornadas de mobilizações contra a reforma previdenciária desde o final do verão europeu (7 e 23 de setembro e 2 de outubro), o governo apostava a favor de um retrocesso das manifestações. Entretanto, é evidente que há um salto do movimento social, cuja perspectiva frente a ausência de direção ainda é (...)

Depois de três jornadas de mobilizações contra a reforma previdenciária desde o final do verão europeu (7 e 23 de setembro e 2 de outubro), o governo apostava a favor de um retrocesso das manifestações, mais ainda levando em conta que o Senado terminou votando apressadamente os principais artigos da lei para que Sarkozy pudesse mandar uma clara mensagem ã opinião pública: “já está tudo decidido, não adianta que se manifestem, a lei já foi votada”. Entretanto, a jornada de greve e manifestações na França de 12 de outubro foi histórica. Apesar das diferenças entre os dados comunicados pelo ministério do Interior e pelos sindicatos, ambos concordam que houve um aumento do número de manifestantes com relação ao passado 23 de setembro, isto é, 1,23 milhões de manifestantes para a polícia e 3,5 milhões segundo os sindicatos, constituindo a mobilização mais numerosa nos últimos 20 anos (ver quadro). Se o número de grevistas é estável no setor público, com 30% de acatamento ã greve, a grande novidade são os chamados ã paralisação por tempo indeterminado em vários setores e a entrada em cena da juventude.

A entrada em cena dos secundaristas

Os secundaristas e os estudantes universitários são setores chave que participaram em todos os precedentes grandes movimentos sociais na França, com um protagonismo central em 2006 durante a luta contra o CPE de Villepin e cuja entrada na luta o governo temia. Em várias universidades (Rennes II e Marsella, París-Tolbaiac, Paris-8, Estrasburgo etc.), organizaram-se grandes assembléias para decidir as ações que seriam empreendidas mesmo mal tendo começado as aulas esta semana. Mais de 300 liceus secundaristas se mobilizaram de distintas maneiras e/ou graus, com bloqueios ou piquetes estudantis que permitiram que várias colunas de secundaristas se somassem ás marchas em distintas cidades.

A entrada deste setor foi duramente questionada pelo governo, que acusa a extrema esquerda e setores do PS de manipulá-los. É que, como disse um responsável da ordem pública em uma grande cidade de província: “Com os secundaristas, forçosamente menos controlados que os adultos nos cortejos sindicais, tudo se torna imprevisível” [1]. Em particular, o Ministério da Educação e o Elíseo temem os bloqueios e a violência que acompanham a mobilização dos jovens [2]. Mas longe de toda manipulação, a entrada dos secundaristas (e possivelmente dos universitários se o movimento se mantém algumas semanas) responde a causas profundas. Além da degradação da escola pública, os jovens rechaçam a degradação das condições de entrada em uma vida profissional e na maturidade. Os secundaristas e os universitários sabem que 23% dos menores de 25 anos estão sem emprego (10% acima da média européia), cifras que se agravam nos bairros populares onde um jovem a cada dois estão desempregados. Também sabem que aqueles que têm a sorte de ter um emprego trabalham em condições cada vez mais precárias, enquanto a explosão dos preços imobiliários nos últimos 30 anos torna ilusória a aspiração de viver em uma casa independente, questão essencial para o desenvolvimento de uma personalidade adulta. Isso sem falar da violência cotidiana a que são submetidos pela polícia, ou, mesmo nos colégios pela obsessão da uniformização vestimentária ou pelo endurecimento das regras internas dos liceus e da negação de direitos dos secundaristas. Neste marco, o alongamento da idade de aposentadoria não só é visto por eles como um aumento da carga trabalhista para seus familiares, senão que torna ainda mais complicada e mais tardia ainda sua entrada no mercado de trabalho.

As tendências ã radicalização: a paralisação por tempo indeterminado em vários setores chaves da economia

Em vários setores de trabalhadores lançaram-se chamados ã paralisação por tempo indeterminado contra a reforma. É o caso do transporte público urbano, dos ferroviários da SNCF, do setor da energia e, sobretudo da química com a grande maioria das refinarias francesas paradas pelos trabalhadores, o que poderia gerar um desabastecimento de combustível em várias zonas do país. A isto é necessário somar regiões inteiras nas quais o movimento grevístico contra a reforma previdenciária, conjuntamente com demandas específicas por condições de trabalho como a reforma dos portos, estão paralisadas há dias e até mais de duas semanas no caso de Bouche-du-Rhône, a zona de Marselha, a segunda cidade do país, com paralisações entre os empregados municipais, do fisco, os trabalhadores do porte de Fos e da refinaria. No porto desta cidade, 85 navios estão ã espera, com 56 navios cisterna (petroleiros) e 29 navios de carga, devido ao movimento que afeta a todas as atividades portuárias. Esta situação inquieta enormemente a setores da burguesia que começam a mostrar seu nervosismo frente a esta situação.

A determinação de alguns setores é forte. Michel Denis, representante da central CGT da refinaria Total de La Mede (Bouche-du-Rhône), de 28 anos, “sabe que terá que trabalhar pelo menos até 2044. ‘Neste trabalho, quando se passa os 55 anos torna-se muito duro trabalhar, especialmente pelas mudanças de turno”. Ele está “...disposto a ir até o final” “Se apresentamos um pré-aviso de greve de vinte e quatro horas prorrogável, insiste, não é para se divertir nas manifestações, senão para mostrar nossa determinação” [3]. O mesmo clima se vê no sindicato da estação Montparnasse em Paris, no qual com 110 votos a favor e quatro abstenções, ninguém votou contra a continuidade da greve. “Um centena de votantes, mais que na véspera, mas nada para que possamos nos exaltar tampouco”, disse o jornalista. Um rapaz experimentado com a cara amarrada diz: “Mas temos margem. Em ’95 nas assembléias haviam aqui 200 pessoas’. Esta manhã igualmente haviam “caras novas”. Algumas não sindicalizadas. Sinal, para uma trabalhadora ferroviária que “a coisa começa a solidificar-se, existe menos resignação porque as pessoas começam a compreender a enormidade que é a reforma, e a compreender que é hora que temos que nos jogar’” [4].

Localmente a vanguarda está se organizando para decidir que tipo de ações adotar para prosseguir com as greves. Naqueles setores nos quais nacionalmente as direções sindicais chamam a seguir com a paralisação, a greve prossegue. É o caso, por exemplo, das estações ferroviárias da capital nas quais os trabalhadores unanimemente votaram a favor da paralisação indefinida nas assembléias da manhã. Naqueles setores nos quais as burocracias não chamam a seguir com a paralisação, os setores mais combativos se organizam e votam greves prolongadas: é o caso, por exemplo, dos docentes secundaristas na região parisiense.

A burocracia sindical, principal obstáculo para frear a reforma das aposentadorias e derrotar Sarkozy

Está claro que a batalha se converteu nas últimas semanas em um combate político. A raiva vai para além de ser dirigida só a contra-reforma das aposentadorias: existe um anti-sarkozysmo crescente, as conseqüências da crise que se fazem sentir mais e mais no setor privado, as tensões derivadas de uma série de reformas do Estado, tais como a da Saúde, fazem se sentir, para não repetir a já dita na cólera dos secundaristas.

Frente a esta situação, e ã pressão da base, a burocracia sindical fez o impossível para seguir controlando o movimento, chamando jornadas de ação cada vez mais imediatas, como ações de pressão, como a nova jornada do sábado, dia 16 (ou seja, duas em uma semana, e possivelmente decidam outra na quinta-feira, dia 14, quando se reúnem de novo, o que mostra a bronca existente), movimento in extremis para conseguir alguma saída deste conflito – por sua parte cada vez mais difícil e complicado – que lhes permita lavar a cara depois de tanta luta. Mas estas direções, não somente a CFDT, mas também a CGT, que deixa por ora correr a greve a nível setorial para não chocar-se abertamente com a base, são inimigas da radicalização do conflito, e não fazem nada para desenvolvê-lo ou para sustentá-lo a nível nacional, aproveitando por sua vez o temor da perda salarial no setor privado – tanto nas grandes empresas industriais como nas Pymes – frente a uma direção que não quer chegar a um embate decisivo. De fato, estas direções jogam objetivamente (e subjetivamente?) a favor de uma mudança presidencial em 2012. Se um governo não muda depois de tais reivindicações de massas há que buscar uma saída política... mas pelas urnas!!!, dirão os dirigentes sindicais oficiais, depois que a reforma passar, com um enorme desgaste para Sarkozy. Enquanto isso, as tendências ã radicalização encontram um governo duro que não cederá facilmente, e carecem por ora da mais mínima direção alternativa que possa sustentar um enfrentamento global com o governo. Por ora é esta a grande debilidade do movimento, que sequer conta com uma direção embrionária como a que teve o movimento anti-CPE, através da Coordenação Nacional, que reunia os delegados de todas as assembléias e que sustentou a luta pela retirada da lei.

O desenvolvimento da auto-organização operária, de assembléias para que abarquem cada vez mais e mais todos os trabalhadores em greve, ao mesmo tempo em que a busca da convergência e da coordenação dos distintos setores profissionais se torna decisiva, assim como o combate contra as direções sindicais para ir desmascarando-lhes o papel, que hoje gozam de muito prestígio, como mostra o ascenso espetacular da popularidade dos sindicatos no conjunto da população. Estes são os eixos de intervenção dos membros do Coletivo por uma Tendência Revolucionária do NPA, que tanto em Chartres, através do peso na vanguarda operária de dirigentes operários como Manuel Georget de Phillips, em Paris, na periferia parisiense de Seine Saint-Denis, em Yvelines ou em Mulhouse, desde o sindicato da Peugeot que impulsionou o corte da estação de trem depois das jornadas do dia 12; estamos intervindo e buscando apoiar e desenvolver as tendências mais progressivas do movimento. Por sua vez, como dissemos na declaração que editamos frente ao 12, lutamos no interior do NPA, porque: “o papel do NPA deveria ser fazer uma polêmica pública contra a orientação das burocracias sindicais e de tomar medidas concretas para dar o combate pela greve geral. Fazer agitação para prorrogar a greve não é suficiente. Os trabalhadores ainda tem uma confiança massiva na direção sindical, que identificam com os sindicatos históricos que as gerações anteriores haviam conseguido de suas conquistas e/ou aos sindicatos de base, que defendem todos os dias. É necessário ajudar, a um só tempo, tanto a mobilização dos trabalhadores como sua tomada de consciência acerca da política das direções sindicais. Quanto aos ativistas sindicais e trabalhadores combativos, desgostosos com a política da direção sindical, têm a necessidade de sentir que sua indignação é compartilhada e sua vontade de fazer enfrentar-se com a direção é apoiada. Por isso devemos lutar de forma indissociável por:

1. A auto-organização dos trabalhadores: assembléias, comitês de luta, comitês de greve, a coordenação dos setores em luta pelos delegados eleitos, mandatados e revogáveis;

2. A interpelação pelas assembléias como por nossos sindicatos em todos os níveis das direções sindicais, exigindo-lhes que lutem pela retirada das reformas, que deixem de negociar ou de querer negociar, que não chamem novas “jornadas de ação” depois de 12 de outubro, ao custo de desanimar desta vez os trabalhadores, mas que chamem de imediato a greve geral ilimitada a partir de 12 de outubro. Estes requisitos serão ainda mais eficazes, exercerão mais pressão sobre os dirigentes sindicais, se forem tomadas por setores que começarão efetivamente uma greve indefinida a partir de 12 de outubro e que terão um peso político considerável” [5].

Em conclusão, a situação está evoluindo rapidamente e os próximos dias serão decisivos. É evidente que há um salto do movimento social, cuja perspectiva frente a ausência de direção ainda é incerta. Não obstante, os riscos de radicalização estão bem presentes, questão que teme o Partido Socialista, que através de Ségolène Royale agora pede desesperadamente a suspensão da reforma, acusando o governo de ser responsável pelo que aconteça nas ruas nos próximos dias. A situação permanece aberta.

O recorde anterior de 19 de março de 2009 (durante a crise), 1,2 milhão, é superado, da mesma maneira que os cortejos anti-CPE (1.030.000, a 4 de abril de 2006) contra a reforma Fillon (1 milhão, a 13 de maio de 2003) e contra o plano Juppé (932.000, 12 de dezembro de 1995). Os sindicatos haviam contado 3.100.000 manifestantes anti-CPE (4 de abril de 2006), o recorde anterior.

 

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