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Manu Georget, dirigente da CGT em Philips Dreux: 10 dias de controle operário na França
por : PTS, Argentina

23 Aug 2010 | Durante a realização da VII Conferência da Fração Trostskista – Quarta Internacional, com delegados e delegadas das diferentes organizações que a conformam, La Verdad Obrera (jornal semanal do PTS, organização-irmã da LER-QI na Argentina) entrevistou Manuel Georget, dirigente sindical da CGT de Philips Dreux, da França, e militante do NPA (Novo Partido (...)

Durante a realização da VII Conferência da Fração Trostskista – Quarta Internacional, com delegados e delegadas das diferentes organizações que a conformam, La Verdad Obrera(jornal semanal do PTS, organização-irmã da LER-QI na Argentina) entrevistou Manuel Georget, dirigente sindical da CGT de Philips Dreux, da França, e militante do NPA (Novo Partido Anticapitalista) do “Coletivo por uma Tendência Revolucionária”. No começo de 2010, os trabalhadores da fábrica de televisores Philips Dreux da França mantiveram, durante 10 dias, uma experiência de controle operário frente ao anúncio da patronal de fechamento e demissões. Manu será orador no ato internacionalista em homenagem a Trotsky, neste domingo, 22, no estádio Racing, em Buenos Aires.

La Verdad Obrera: Conte-nos: como começou sua experiência na fábrica Philips. Quando começou a trabalhar lá?

Manu Georget: Comecei a trabalhar na Philips de Dreux em 1987, quando havia duas plantas de produção de televisores, e nesse momento haviam 7000 operários que, juntos ao pessoal precarizado, somavam um total de 12000 assalariados na fábrica.

Houveram lutas importantes durante os anos 80. Mas uma das lutas mais importantes foi em 1997, quando os operários efetivos e precarizados lutaram juntos para que os trabalhadores precários tivessem as mesmas condições de salário e de trabalho que os trabalhadores de “colarinho azul” (efetivos). A partir desse momento, Philips começou a realocar parte de sua produção e para isso fez uma joint venture com a empresa LG, para evitar responsabilidades e a partir desse momento começaram as demissões.

LVO: Como foi o início de sua militância na fábrica?

MG: Nesse processo, eu trabalhava na fábrica de cima chamada “Radio 1”. Tinha esse nome pois antes era uma empresa estatal chamada Radiola, que estava dividida em duas plantas: Radio 1 e Radio 2. Eu trabalhava na parte onde se faziam os componentes, a parte mais concentrada da produção, enquanto na outra planta, onde trabalhavam majoritariamente mulheres, fazia embalagens. Nesse momento, me transferiram para a planta “Radio 2” com as mulheres. Nessa planta nunca havia existido lutas e o sindicato da CGT era dirigido por uma companheira jovem, que era engenheira. Quis fazer uma prova e terminei provocando uma guerra por salários e vi que a companheira não só levou ã frente a guerra por aumento de salário mas também fez com que me reconhecessem como delegado do sindicato e, dessa maneira, não puderam me demitir por haver me envolvido na greve.

Junto com esta companheira, começamos a construir o sindicato CGT na Philips, que para nós tinha que ser um sindicato classista e de massas, mas víamos que para ser um sindicato com essas características, classista, era necessário que fosse separado da política da CGT majoritária, que impulsionava uma política traidora.

LVO: Como começaram a organizar o sindicato?

MG: Para fazer o que chamávamos de “a dissidência” da CGT, necessitávamos ter uma legalidade para poder ter um sindicato próprio. Ao mesmo tempo, demos uma luta para que os altos executivos não pudessem votar nas eleições da fábrica. Antes, haviam três categorias ou setores que participavam nas eleições: os operários, os técnicos e os empregados (administrativos), e os executivos podiam votar nas eleições dos operários. Os operários e os técnicos só votavam em seu setor mas os executivos podiam votar em seu próprio setor e dos operários.

Se era uma fábrica muito grande, pela quantidade, isso não fazia muito dano, mas com todas as demissões que fizeram, em um momento os executivos vinham e podiam decidir sobre a política dos operários. Mudar isso foi a primeira política que impulsionamos como CGT dissidente.

Foi um combate jurídico importante mas muito longo, que ao final conseguimos ganhar e que se transformou em lei para todos os operários da França. A partir de então tivemos a política de estender o sindicato dissidente da CGT desde a Philips para outros setores da região, construindo uma espécie de coordenação com trabalhadores de vários setores da indústria e do comércio em Dreux. Com isso conseguimos reforçar as finanças do sindicato e começar a fazer política, começamos a editar um jornal mensal do sindicato.

LVO: Como enfrentaram as ondas de demissões dos últimos anos?

MG: Em 2003 houve uma primeira onda de demissões pela mudança de tecnologia, de tubo de raios catódicos a LCD, então a patronal organizou uma primeira onda de demissões de 250 trabalhadores. Foi uma greve muito forte e muito longa, que terminou com a traição de um sindicato pelego (pro patronal), que havia sido criado pela empresa alguns anos antes para acabar com a hegemonia que tínhamos na fábrica.

Em 2008 houve uma nova onda de demissões e foi uma greve ainda mais dura, que durou 11 semanas, na qual os trabalhadores lutavam pela manutenção de seus postos de trabalho e não por indenizações, e que particularmente foi ofensiva não apenas por que mantiveram um piquete na porta da fábrica mas também porque decidiram bloquear toda a zona industrial (em Dreux) instalando vários piquetes ao redor das outras fábricas por toda a cidade e fazendo assembléias durante o dia. Durante 11 semanas, essa greve indefinida, que tinha conquistado grande adesão entre os trabalhadores, bloqueou o conjunto da zona industrial, onde as fábricas não funcionavam pelos piquetes dos operários da Philips.

Depois de 11 semanas de greve o sindicato da patronal de Force Ouvrière (Força Operária), que não havia participado da greve e que inclusive foram expulsos pelos trabalhadores no começo da mesma, sem nenhuma consulta com os operários, assinou um acordo com a patronal no qual aceitava as demissões. No total, foram 287 demitidos em 2008 e Force Ouvrière não só firmou o acordo para que demitissem os trabalhadores mas também acordou com a patronal e com o Ministério do Trabalho que poderiam demitir os sindicalistas (delegados), mas somente os da CGT. Além disso, há que ter em conta que esses 287 trabalhadores eram a base radical na fábrica, eram a base da CGT.

Nesse momento não me demitiram mas fiquei só no sindicato já que haviam demitido todos meus companheiros. E por isso demos uma luta em primeiro lugar pela reincorporação dos companheiros da CGT.

LVO: Como começou o processo de coordenação com setores em luta?

MG: Nesse momento me dei conta de que o que havia sido feito a nível local de coordenação e a ação em Dreux, tinha que ser feito a nível nacional. Então peguei meu carro e comecei a recorrer as fábricas que estavam em conflito e comecei a conhecer e a me relacionar com os dirigentes das principais lutas como Molex, Continental e Goodyear, que são os setores mais de vanguarda, para construir uma coordenação das lutas. Com esses setores foi que se começou a organizar a primeira oposição da história da CGT, que era a corrente na CGT por um sindicato classista e de massas. Foi assim que muitos que eram da CGT começaram a se organizar pela primeira vez e convocamos uma reunião para organizar essa oposição sindical na CGT.

Demos uma luta na Justiça e conseguimos a reincorporação dos sindicalistas (delegados) da CGT em Dreux. A justiça nos deu razão afirmando que os motivos econômicos que haviam dado a patronal não se justificavam. Nesse sentido, conquistamos a reincorporação dos sindicalistas e, ainda que de forma mais lenta, segue o processo pela reincorporação do conjunto dos demitidos de 2008.

O ano de 2009 foi marcado na França pelo que se conhece como “demissões parciais” (suspensões), ou seja, quando a patronal obriga os trabalhadores a trabalhar menos horas pois não há produção. Esta foi uma das razões porque as marchas de começo de 2009 foram tão massivas. Em Philips notava-se que a patronal estava preparando o fechamento, porém, não haviam sido ainda resolvidos os casos das demissões de 2008 mas já víamos que vinha uma nova ofensiva da patronal. Nesse marco, eu e minha companheiro Natalie começamos a pensar na alternativa de controle operário e dissemos: “Não vamos mais fazer greves fazendo churrasco desde fora, mas vamos nos colocar na ofensiva.”

O processo de coordenação seguiu se organizando e durante o mês de julho de 2009 se colocou de pé o que se chamou de “Coletivo contra os Patrões Delinquentes”. Quando estavam fechando a fábrica New Fabris, a qual os trabalhadores ameaçaram explodir com um tanque de gás, chamou-se uma marcha na cidade em que se encontrava a fábrica, na metade do verão a finais de julho, que contou com a presença de 3000 pessoas, algo muito raro na França. A partir deste momento continuou se organizando reuniões com setores de vanguarda em distintas cidades e se decidiu realizar uma grande atividade na qual estiveram presentes mais de 1000 pessoas. Depois disso, realizou-se uma marcha em Paris, que foi chamada por setores de vanguarda.

LVO: Como foi a experiência de controle operário que fizeram na Philips?

MG: Em uma festa realizada pelos trabalhadores em novembro de 2009 foi a primeira vez que se falou do controle operário.Quando voltamos das férias em janeiro de 2010, fizemos uma assembléia para discutir com os trabalhadores, ainda que fosse muito difícil porque quase toda a base da GCT havia sido demitida em 2008 e as pessoas que haviam ficado na fábrica eram trabalhadores que nunca haviam feito uma greve. Nesse momento, ao ver que a patronal ameaçava com o fechamento, nos disseram: “Vocês sempre falam do controle operário. Porque não provamos?”

No início, quando começamos a colocar em pé o controle operário, houveram trabalhadores que diziam: “Ninguém me controla”. Então, um trabalhador lhes disse: “Se não querem tomar seu destino em suas próprias mãos vamos quebrar e o patrão vai nos comer”. Assim, todos começamos a trabalhar. Como os setores administrativos também participaram do controle operário, o primeiro que fizeram, como faltavam matérias primas, foi desviar uns caminhões com componentes para fabricar televisores, que estavam indo para a Hungria e os trouxeram ã fábrica para começarmos a produzir.

Não tínhamos para produzir muito, havia para 5000 televisores mas o importante era demonstrar que a fábrica podia funcionar e que podia pagar os salários dos operários. Não tivemos tempo, não chegamos a colocar ã venda os televisores que fabricamos mas o interessante foi que num período tão curto de controle operário, apenas 10 dias, algumas grandes cadeias de venda de eletrodomésticos começaram a ligar para perguntar a quanto vendíamos. Pudemos fazer uma experiências com os poucos televisores que produzimos e os trabalhadores estavam começando a compreender que se vendiam um televisor a 600 euros, produzindo 5000 televisores, e eles eram 147 operários, em um mês poderiam juntar 20.000 euros, uma soma que não alcançavam nem em um ano de trabalho.

Nesse momento, a direção nacional de Philips na França convocou os sindicatos para a oficina central, dizendo que o controle operário é ilegal. A CGT respondeu que eles não tinham nada a ver, que era uma decisão dos operários, enquanto que Force Ouvrière não só disse que não tinha nada a ver mas também que a empresa podia fazer o que quisesse com a fábrica, inclusive retomá-la. Aí começaram a fazer muita pressão, com agentes de segurança privada e fiscais da justiça que chegaram na fábrica e ameaçaram processar nove trabalhadores, ameaçando que eles teriam que pagar por tudo o que estava sendo feito na fábrica porque era algo “ilegal”. Sob as ameaças da empresa, acabou-se votando, com a colaboração da Force Ouvrière, o fim do controle operário. Nós propusemos seguir a luta, tendo em conta que poderíamos nos apoiar em uma resolução da justiça, que era favorável a nós e que dizia que os fundamentos econômicos do fechamento da fábrica não eram válidos.

A meados de fevereiro de 2010 os operários receberam telegramas em suas casas dizendo para não irem trabalhar na segunda-feira seguinte pois a fábrica havia fechado. Nós, desde a CGT, tratamos por todos os meios, chamando por telefone a todos, tratando de usar os meios de comunicação, de avisar aos trabalhadores que não levassem em conta a carta da patronal e que viessem trabalhar na segunda. Nessa segunda-feira, cedo nos enteramos que alguns trabalhadores haviam recebido outro telegrama no qual a patronal dizia que tinha outra proposta, que era reincorporá-los na Philips desde que aceitassem a transferência para a Hungria com um salário de 450 euros e colocavam como condição falar húngaro fluentemente. Isso foi um escândalo, estavam todos escandalizados pois se propunha aos operários franceses que aceitassem receber um salário de 450 euros, mas o que ninguém denunciou é que os operários húngaros recebem salários de 450 euros. Nesse momento o conflito ganhou repercussão nacional e no meio desse escândalo saiu o ministro da Indústria a defender a Philips dizendo que não eram delinqüentes e chamou uma reunião com os operários e os sindicatos em Paris.

Passou uma semana e, enquanto se mantinham os piquetes, saiu uma liminar da justiça que dizia que o lock out da empresa era ilegal e que a empresa devia retomar a produção. Justo no mesmo dia que a direção da empresa havia declarado que a fábrica não produziria nunca mais. Três dias depois dessa importante vitória, o sindicato Force Ouvrière fez um acordo com a patronal para aceitar o fechamento em troca de indenizações. Na França, existe um mecanismo escandaloso que permite que um sindicato, ainda que minoritário e não tenha o apoio dos trabalhadores, faça um acordo com a patronal.

O conflito terminou, como todos sabem, em uma derrota. Uma derrota importante, no entanto, considero que estou deixando algum legado aos trabalhadores que lutarão no futuro com essa experiência de controle operário.

Visita a Zanon e Stefani sob controle operário: “Que a herança de León Trotsky seja aproveitada para levarnos ã vitória”

Na Philips Dreux nós fizemos uma experiência de controle operário que por mais que tenha terminado em uma derrota, nos deu uma alternativa de luta diferente da que hoje na França é defendida pelos reformistas que pedem apenas indenizações. A derrota que sofremos foi responsabilidade da burocracia e dos sindicatos pelegos (pró patronais) que traíram a classe operária. No entanto, a experiência de controle operário levou a uma tomada de consciência de que há outra alternativa possível na França e na Europa, uma alternativa de luta que nos levará ã vitória.

Minha viajem para a Argentina é importante pois toda a Europa e o mundo estão conhecendo uma crise que golpeará nossa classe muito violentamente e sei muito bem que vocês na Argentina já conheceram uma crise no ano de 2001 para a qual tiveram que responder os trabalhadores e o povo.

Um exemplo disso é a luta dos trabalhadores de Zanon, onde estive na semana passada e pude ver como organizam e controlam a produção de sua fábrica, mostrando uma valentia exemplar frente aos capitalistas que buscavam colocá-los de joelhos e descarregar sua crise sobre eles.

Estou muito orgulhoso de estar na Argentina e quero agradecer a todos os companheiros argentinos que me permitiram estar aqui e no próximo domingo 22 de agosto estarei com todos meus companheiros internacionalistas no ato pelo 70° Aniversário do assassinato de León Trotsky. Quero agradecer também aos companheiros de Zanon e Stefani que me receberam e me mostraram sua luta que começou há 8 anos, como uma resposta ã crise de 2001, e que tem demonstrado que se o controle operário é possível na Argentina, ele é possível também na França e no mundo inteiro. Quero fazer uma homenagem a León Trotsky que nos deixou uma herança importante e espero que essa herança seja aproveitada para a vitória dos trabalhadores.

 

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