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Nenhuma negociação com os golpistas
por : Claudia Cinatti

12 Jul 2009 | A dez dias do golpe de Estado que derrubou o presidente Zelaya a situação ainda segue indefinida. Tudo indica que o intento frustrado de retorno de Zelaya e a mobilização massiva de 5 de julho contra o golpe foi um ponto de quebra na consolidação do governo golpista de Micheletti, abrindo uma série de variantes políticas que ainda permaneciam (...)

A dez dias do golpe de Estado que derrubou o presidente Zelaya a situação ainda segue indefinida. Tudo indica que o intento frustrado de retorno de Zelaya e a mobilização massiva de 5 de julho contra o golpe foi um ponto de quebra na consolidação do governo golpista de Micheletti, abrindo uma série de variantes políticas que ainda permaneciam indeterminadas.

A fortaleza inicial que de fato possuía o governo, sustentado pelo conjunto das instituições do Estado hondurenho - a Corte Suprema de Justiça, o Congresso e as Forças Armadas -, além dos empresários, da Igreja Católica e dos grandes meios de comunicação, parece ter-se debilitado depois de enfrentar uma semana de crescentes mobilizações populares, que teve como seu ponto mais alto, até o momento, a manifestação de dezenas de milhares de hondurenhos (alguns falam de até 100.000 pessoas), principalmente trabalhadores, camponeses, professores e estudantes, que se mobilizaram até o aeroporto de Toncontín, onde desceria o avião no qual viajava Zelaya, e foram brutalmente reprimidos pela política e o exército. O saldo dessa repressão foi de ao menos dois manifestantes mortos, centenas de feridos e outros tantos detidos.

Possivelmente a ação popular mudou a relação de forças dos primeiros dias, durante os quais os golpistas trataram de naturalizar sua ação tentando demonstrar que contavam com uma base majoritária. A perspectiva de que a mobilização popular contra o golpe cresça e se radicalize, parece ter acelerado a implementação de uma saída negociada, política auspiciada pelos Estados Unidos e a OEA.

Efetivamente, ao fechamento deste artigo concluía a reunião entre Zelaya e a secretária de Estado norte-americana Hillary Clinton, na qual se acordou abrir uma instância de negociação entre Zelaya e Micheletti, com a mediação do presidente da Costa Rica, Óscar Arias. Segundo Hyllary Clinton, este “é o melhor caminho a seguir, neste momento, mais que tentar retornar frente ã implacável oposição do regime de fato” e que “em lugar de outra confrontação que possa resultar na perda de vidas, tentemos o processo de diálogo e vejamos aonde leva”. Enquanto Zelaya saiu da reunião com declarações triunfalistas, e afirmou que não se trata de uma “negociação”, senão de uma “retirada ordenada dos golpistas” está claro que Zelaya desde o momento do golpe já renunciou a qualquer ação que possa abrir um questionamento ã reacionária Constituição de 1982, apontando seu retorno como a única possibilidade de uma resolução política ã crise sem arriscar desatar uma mobilização que possa sair do controle.

Ainda não se conhecem os termos da negociação nem mesmo se pode prever seu resultado. O que sim parece é que frente ã perspectiva da derrota do golpe a mãos da mobilização popular, a burguesia hondurenha e seu governo golpista, a OEA, Zelaya e o imperialismo decidiram tentar uma resolução política ã crise, preservando ás instituições estatais que deram o golpe de Estado.

O duplo jogo do imperialismo e da OEA

Como é publicamente reconhecido, o governo de Obama (e o embaixador norte-americano em Honduras) estava a par dos planos da burguesia hondurenha de destituir Zelaya. E não podia ser de outra maneira tendo em conta que o imperialismo norte-americano mantém uma base militar permanente no território hondurenho e que compartilha com os golpistas o objetivo de limitar a influência do bloco da ALBA na América Latina. Entretanto, a destituição não terminou ocorrendo por alguma via “legal”, senão por meio de um golpe de Estado clássico, algo que contradiz a imagem que pretende dar o governo de Obama em relação a uma mudança na política imperialista. Isto fez que Obama tivesse que repudiar a ação militar, ainda que nos feitos isso só significou a interrupção de alguns exercícios militares conjuntos com as tropas hondurenhas. Os Estados Unidos atuaram através dos países mais a fins ã política norte-americana na OEA, como o Canadá ou o próprio secretário geral José Insulza, para impulsionar a linha de abrir uma negociação com os golpistas, desalentando o retorno de Zelaya a Honduras sem um acordo com o governo de Micheletti.

Durante sua estadia em Moscou, Obama inclusive chegou a declarar que os “Estados Unidos não pode nem deve buscar impor nenhum sistema de governo a outro país, nem presumir de eleger que partido ou indivíduo deve governar um país” e que os “Estados Unidos apóia a restituição do presidente democraticamente eleito de Honduras, ainda que tenha se oposto ás políticas norte-americanas”. Desta maneira, Obama intenta maquiar a política imperialista que foi e é a ingerência no que considera seu quintal em função de proteger seus interesses estratégicos na região.

Por sua vez a OEA, que saiu a condenar o golpe, não reconheceu o governo de Micheletti e finalmente suspendeu a Honduras do organismo, aplicando o artigo 21 da Carta Democrática, seguindo a orientação do imperialismo norte-americano de impulsionar uma saída pactuada com os que deram o golpe. Ainda que com um discurso duro, a OEA (que com razão é chamada o “ministério das colônias” dos Estados Unidos), deixou correr o golpe, evitou toda medida que levaria a um isolamento categórico do governo golpista, e se pronunciou só por “revisar” as relações de cada país com Honduras. A OEA tirou o aval ao retorno de Zelaya, já que se este era acompanhado por Insulza e outros presidentes e o regime hondurenho não os permitisse a entrada ou intentasse detê-lo, abriria-se uma crise política de proporções, que haveria dificultado enormemente o objetivo de encontrar uma saída negociada.
Redobrar a mobilização para derrotar o golpe

Os trabalhadores, camponeses, estudantes, jovens e os pobres que de fato sofrem a repressão do regime, os ataques do exército e da polícia com seu saldo de mortos, o toque de recolher, o estado de sitio, as perseguições e as detenções, não têm nenhum interesse em encontrar uma saída negociada que não fará mais que dar impunidade aos golpistas para impor suas condições, e dessa forma, garantir o direito a seguir explorando os trabalhadores e o povo hondurenho, que já sofre um dos índices de pobreza mais altos do continente.

O presidente Zelaya, ainda que hoje tenha atritos com o imperialismo e com os capitalistas hondurenhos por ter tomado algumas tíbias medidas que contradizem seus interesses e por ter proposto a possibilidade de uma reforma da Constituição, pertence ã mesma classe e fará tudo o que estiver ao seu alcance para evitar que a luta contra o golpe termine desencadeando uma dinâmica revolucionária que leve os trabalhadores e o povo pobre a enfrentar o conjunto das instituições do Estado burguês. Por isso os operários, camponeses, estudantes e setores populares que estão lutando contra o golpe, não podem depositar nenhuma confiança política em Zelaya ou em uma saída negociada que terminará sendo uma das vias para preservar as instituições e os políticos que perpetraram o golpe.

O caminho para derrotar aos golpistas é redobrar a mobilização independente, fortalecer a greve geral e organizar a autodefesa frente aos ataques das forças repressivas (algo que Zelaya se encarregou explicitamente de desalentar) para impor o juízo e castigo aos golpistas e seus cúmplices e a liberdade de todos os detidos. O conjunto das instituições do Estado está comprometido com o golpe e com a preservação da reacionária Constituição de 1982, redatada pelos partidos da burguesia em acordo com o imperialismo. A única saída progressiva para as massas hondurenhas é a realização de uma Assembléia Constituinte Revolucionária, convocada sobre a base da queda revolucionária do regime, por um governo provisório das organizações operárias e camponesas, na perspectiva da luta por um governo operário e popular baseado em organismos de autodeterminação das massas.

É necessário organizar a mais ampla mobilização dos trabalhadores, camponeses, estudantes, organizações de direitos humanos, e todas as forças que se reclamam antiimperialistas e democráticas em toda a América Latina, em solidariedade com o povo hondurenho, pela derrotada do golpe e contra toda negociação com os golpistas, já que só a mais contundente resposta de massas não só é o que pode esmagar o golpe em Honduras, mas também desalentar eventualmente outros intentos similares na região.

 

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