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Pablo Iglesias e a impossibilidade de superar o capitalismo “sozinhos”

05/11/2014

Pablo Iglesias e a impossibilidade de superar o capitalismo “sozinhos”

Pablo Iglesias e a impossibilidade de superar o capitalismo “sozinhos”
Nas últimas semanas, a moderação do discurso do líder do Podemos, Pablo Iglesias, tem sido diretamente proporcional ao aumento da intenção de voto nas pesquisas. Uma entrevista realizada no Equador pelo apresentador Jordi Évole, do programa espanhol Salvados, foi o cenário escolhido para um salto de moderação: “Somos muito pequenos para enfrentar o capitalismo sozinhos”.

A entrevista no famoso programa de televisão transmitiu-se no mesmo dia em que se encerravam as votações por internet dos documentos que dariam forma e conteúdo ã nova formação política, nas quais as propostas de Iglesias e seu grupo se impuseram por ampla maioria.

Na entrevista realizada no Equador, país onde esteve para reunido com o presidente Rafael Correa (antes havia estado com Evo Morales na Bolívia), Iglesias se mostrou fascinado pelo “estilo” de alguns líderes dos governos pós-neoliberais latinoamericanos, como Cháves e Correa. Sobre o último, disse gostar “desse estilo que não se deixa intimidar pelos ricos”.

Contudo, Iglesias teve que reconhecer que para enfrentar a crise não há outra maneira que não se adaptando ás regras do sistema capitalista. “Não se pode sair da crise empobrecendo as pessoas”, disse como se se tratasse de uma máxima tão evidente que não pudesse ser contestada.

“A chave é que as pessoas comprem coisas e, se os salários são miseráveis, as pessoas não podem consumir”, disse. “É terrível, mas ainda que defendamos que o capitalismo pode ser a destruição do mundo, amanhã é preciso dar o que comer ás pessoas e nós somos muito pequenos para enfrentar o capitalismo sozinhos”, afirmou, para terminar citando seu “exemplo de estilo” preferido: “Como disse Correa, ‘existem sociedades com mercado e sociedades de mercado’. Temos que apostar nas primeiras.”

A ideia de que a superação do capitalismo está “Além de nosso horizonte” e a única alternativa realista é aplicar uma política econômica neokeynesiana e ampliar os marcos da democracia liberal, não é algo particularmente novo no discurso de Iglesias. Ele afirmou explicitamente na entrevista que “Não temos nenhuma intenção de expropriar, mas sim que as empresas assumam responsabilidade social.”

O que salta aos olhos nessas declarações é a ideia de que “nós sozinhos” nós não podemos superar o capitalismo. Um “nós sozinhos” que dá a entender que as mudanças só se pensam “a partir de cima” (a partir do governo ou do líder) e que mostra um profundo ceticismo sobre o potencial transformador da classe trabalhadora e da maioria da sociedade explorada pelo capitalismo. Uma concepção na qual, no fim das contas, não existem sujeitos sociais da transformação, apenas “base eleitoral”.

Assim como em outra entrevista Iglesias expressava uma visão idílica do pequeno e médio empresariado como representante do futuro do país, sua visão subestima o papel social fundamental da classe trabalhadora em qualquer processo de transformação e enfrentamento com os poderes reais do capitalismo. Ao passo que superestima o papel do líder e as manobras "por cima" que promete realizar se chega ao governo.

Um conceito que está na base do apelo apolítico, "nem de esquerda nem de direita", que Iglesias faz ã cidadania em geral para que apoie seu programa político moderado, seu modelo de partido centralizado em sua própria figura midiática e, eventualmente, sua candidatura a presidente do governo.

Ilusões e realidades

As ilusões de amplos segmentos da população no Podemos são enormes. Mas a formação liderada por Iglesias ainda não passou pela prova do poder. Por isso vale a pena fazer o exercício de analisar outras experiências de formações da esquerda reformista na Europa.

O caso da esquerda reformista grega Syriza, que lidera as intenções de votos nas pesquisas para as eleições gerais é instrutivo.

No último dia 1 de setembro Réna Dourou, líder do Syriza em Atenas, assumiu como presidenta da região de ática após vencer as eleições em maio. Sua vitória foi muito festejada por amplos setores que viram na derrota dos conservadores a oportunidade de começar a mudar sua situação de dificuldade. No entanto, pouco depois de assumir, Dorou já mostrou sua moderação e cautela para administrar o governo regional, decepcionando as grandes expectativas de muitos dos trabalhadores e setores populares que a elegeram.

A dias de assumir, a dirigente do Syriza, em um tema tão sensível como o desemprego (recordemos que na região de ática mais de 30% da força de trabalho está desempregada), declarou: "Eu nunca prometi que ia resolver o desemprego. Eu disse que ia tentar destinar fundos da União Europeia para projetos que não agravem o desemprego. (...) Eu sei que esse discurso pouco romântico desestabilizou uma parte da minha formação, mas trabalhei treze anos no setor privado e sou realista."

E para tornar clara sua posição, concluiu: "Vou trabalhar respeitando meus valores de esquerda, mas ã frente da região, um tem que ser pragmático."

No mesmo sentido vai outra frase que também pronunciou na entrevista: "Na política nunca deve comprometer-se a algo que não se possa cumprir imediatamente; temos que ser prudentes."

Um discurso de "pragmatismo" e "prudência" que soa muito parecido aos apelos ã "eficácia" e o "senso comum" que são tão característicos do cientista político espanhol, Iglesias.

Se se apresenta em grandes coligações nas próximas eleições municipais no Estado espanhol, o Podemos poderia ganhar os governos de algumas cidades do país. Ainda que a ambição de Iglesias seja ganhar o governo nas gerais de 2015.

Então será maior a pressão para ser "moderado" e "prudente" nos marcos do capitalismo.

O debate não é se Pablo Iglesias e um possível governo de Podemos "pode ou não pode" por si só resolver os problemas da população trabalhadora. A questão é que para reverter os enormes ataques que está padecendo a maioria da população não há outra alternativa que não seja enfrentar os capitalistas e seus políticos contratados (a "casta"), organizando a única força social capaz de fazê-lo, a maioria dos trabalhadores e o povo pobre, em uma luta que questionará as bases deste sistema capitalista.

Como dizia há pouco Nicolás del Caño, deputado nacional do PTS-FIT na Argentina, "Não há luta contra a casta política sem um programa anticapitalista, porque a casta política é a representação política da burguesia. Goste ou não goste de falar de esquerda e direita, de burgueses e trabalhadores."

Para enfrentar a crise que vivemos, temos que estar verdadeiramente dispostos a "tomar o céu por assalto".

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