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Brasil

Algumas lições do ascenso proletário dos anos 70 contra a ditadura e o papel da esquerda

02/06/2009 EI Brasil N°3

Entrevistamos “Val”, dirigente da LER-QI e protagonista da época, a respeito das elaborações que a organização está produzindo sobre um dos períodos mais importantes da história do Brasil do século XX.

EI-B: Qual o objetivo das elaborações da LER-QI sobre a história do Brasil do século XX?

V: Em nosso entender uma organização revolucionária, para merecer existir, tem que dar conta da história do país e do desenvolvimento da luta de classes, considerando que o processo histórico, como escreveu Trotsky na História da Revolução Russa, não é uma mera “cadeia de aventuras ocorridas ao azar” e que os revolucionários não podem “enrolar-se no fio de uma moral pré-concebida”. Ao contrário, deve submeter a história ás leis que governam os fatos e seu desenvolvimento. E para construir uma organização revolucionária no Brasil torna-se imprescindível conhecer, compreender e extrair as lições fundamentais dos processos revolucionários, da intervenção direta das massas proletárias nos acontecimentos. Contra o preconceito reinante na esquerda brasileira – incluindo a esquerda trotskista – de que a história começa a partir da sua própria existência, nos propomos a tarefa de aportar para que a juventude e a classe trabalhadora reconheçamos ascensos proletários e a dinâmica dos acontecimentos como condições excepcionais que se formam antes das revoluções, alterando rápida, tensa e violentamente a psicologia das classes, abrindo as portas para a tomada de poder. Por exemplo, os morenistas brasileiros – PSTU, principalmente – consideram que o trotskismo se iniciou com eles, nos anos 70, renegando toda a história, das lutas teóricas, programáticas, ideológicas e práticas entre as correntes políticas existentes desde o início do século XX. A formação do PCB, a constituição da Liga Comunista Internacionalista, corrente de intelectuais e militantes deste partido que aderem ás posições da Oposição de Esquerda Internacional fomentada por Leon Trotsky na União Soviética, as rupturas e reagrupamentos posteriores, os ascensos operários dos anos 40, 50 e, principalmente, dos 70, para eles não são mais que “aventuras” da história. Não se configuram como momentos especiais que exigem profundidade e amplitude de vistas para extrair as lições da história da revolução brasileira e os fios de continuidade das lutas principistas das correntes revolucionárias que nos precederam e que devem ser perseguidos, reivindicados e defendidos pelos marxistas revolucionários de nosso tempo.

EI-B: Por que se dedicaram a estudar em particular os anos 70?

V: Em primeiro lugar, trata-se de recuperar a façanha desses anos e o papel do sujeito social – a classe operária –, visto que produto da ofensiva neoliberal – econômica, política e ideológica – da década de 1990, as novas gerações de operários e estudantes não têm em seu imaginário a força social e política do proletariado brasileiro.

Buscamos analisar a dinâmica e os resultados do último ascenso proletário, fazer um balanço histórico desse período no qual todas as correntes políticas que ainda atuam na vida política nacional se forjaram. A história que as novas gerações conhecem está marcada pelo retrocesso da classe operária,mas também pelo prisma do PT e dos petistas – incluindo os intelectuais seguidores do petismo. Nos propomos a contribuir com novos fundamentos históricos que estabeleçam uma nova relação com esse passado e supere a história oficial petista. Seguindo os ensinamentos de Trotsky e Lenin, tratamos de extrair lições essenciais deste período, sem as quais não será possível consolidar uma organização revolucionária que prepare a vanguarda e os operários avançados para que num próximo ascenso operário não desperdicem outra oportunidade histórica de avançar para a insurreição e a tomada do poder. O marxismo revolucionário não poderia ter se desenvolvido e rearmado para os adventos da revolução russa sem que os revolucionários da época extraíssem as lições das revoluções européias de 1848-49, da Comuna de Paris de 1871 e da revolução de 1905 na Rússia.

EI-B: Nesse período que vocês estudaram quais perspectivas se apresentaram para os trabalhadores?

V: Por vivência e estudos podemos afirmar que o período que contamos de 1964 a 1980 se caracterizou pela luta da classe operária contra a ditadura militar, tendo sido, principalmente no final da década de 1970, uma oportunidade perdida pela esquerda para forjar um partido revolucionário, contribuindo para generalizar os organismos de luta política das massas e forjando um programa operário calcado na independência política diante dos partidos patronais, do regime militar e do Estado capitalista. No caminho para que a classe operária em luta avançasse nas tendências de hegemonia proletária perante as demais classes subalternas – camponeses, pobres das cidades e do campo e classes médias. A esquerda que se formou nos anos 70 foi reprovada pela história, já que não foi capaz de dirigir a luta pela derrubada da ditadura desenvolvendo a luta de classes contra o conjunto da classe dominante, suas instituições e seu Estado capitalista.Mais uma vez na história, o ascenso proletário recolocou, com suas particularidades, o confronto entre as duas estratégias fundamentais: menchevismo, ou seja, conciliação de classes, defesa do Estado burguês e de reformas no interior do capitalismo, separando mecanicamente a etapa de luta pela democracia da luta pela tomada do poder pelo proletariado. Ou bolchevismo, isto é, combate intransigente pela independência política da classe operária perante todas as vertentes burguesas – democráticas, progressistas, desenvolvimentistas –, vinculando as tarefas democráticas ã tomada do poder.Na época se tratava de que o proletariado se forjasse como caudilho dasmassas exploradas e oprimidas em luta pela derrubada da ditadura através da ação direta e insurrecional, o que abriria o caminho para uma saída revolucionária que trouxesse resolução aos problemas fundamentais – emprego, salário, reforma agrária, independência nacional e uma democracia de massas, que só pode ser conquistada pela instauração de um estado operário que exproprie os expropriadores. Desde o ano de 1978, quando explode a greve na Scania e se desenvolve o processo de greves em metalúrgicos, mas que logo atinge várias categorias e se expande a outros estados, começa uma situação pré-revolucionária, na qual estava colocada a perspectiva da derrubada revolucionária da ditadura e a abertura de uma situação de luta pelo poder.

EI-B: Quais foram os resultados e as conclusões desse processo?

V: Os resultados desse processo nos permitem comprovar que a estratégia, configurada no que chamamos “modo petista” que moldou toda a vida política do proletariado e da esquerda, se impôs ás custas de traições escandalosas da direção petista – Lula e os sindicalistas “Autênticos”.

A direção reformista conseguiu se impor perante umprofundo processo de reorganização, clandestino, da classe operária que foi se desenvolvendo nas fábricas durante a ditadura e deu origem a um extenso processo demilitância e ao começo do surgimento de uma direção combativa alternativa aos pelegos. O sindicalismo “Autêntico” liderado por Lula, com suas raízes no sindicato de São Bernardo, no ABC, se opunha ás comissões de fábrica e procurava aliança coma burocracia pelega de São Paulo. O corporativismo nas greves operárias, quando Lula impedia a unificação de todo o proletariado nacional em nome de uma “supremacia dosmetalúrgicos do ABC”, era a expressão concreta do reformismo que amarra as lutas operárias aos marcos do economicismo, da luta sindical, impedindo conscientemente que a potência proletária se transforme em luta política, luta de classes aberta contra a classe dominante e seu Estado.Os dirigentes do ABC, apoiados por um setor da burguesia e da igreja, atuavam efetivamente como freios contra-revolucionários, conscientes de que a força do ascenso proletário apontava contra a ditadura militar e tendia a ameaçar as bases do capitalismo – a propriedade privada.

Ao contrário da operação ideológica realizada pela maioria dos intelectuais da esquerda visando defender Lula e os “Autênticos” como dirigentes de um “novo sindicalismo”, o que vimos nos anos 70 foi exatamente a reprodução de um sindicalismo corporativista e de conciliação de classes, defensor da redemocratização que substituísse o regime militar por uma “democracia representativa”; na qual os trabalhadores deveriam aceitar a dominação capitalista e lutar apenas por um “lugar na sociedade”, como dizia Lula em 1979, no dia da intervenção da ditadura no sindicato. Para alcançar essa “substituição” de regime era imprescindível impedir que a luta de classes e a situação pré-revolucionária avançasse para a derrubada violenta da ditadura. Tratava-se, para o “novo sindicalismo” lulista-petista, de consolidar a transição pacífica, negociada. Em última instância, essa estratégia conciliadora objetivava impedir a hegemonia proletária, cimentando o caminho para a aceitação da armadilha burguesa militar da “redemocratização” pela via de um projeto de abertura “lenta, gradual e segura” que garantisse a continuidade do Estado e da dominação capitalista, espantando o “fantasma” da derrubada revolucionária da ditadura militar.

EI-B: Qual o papel dos principais partidos e organizações da época?

V: O estudo dos anos 70, pela riqueza do ascenso proletário, permite descobrir sem máscaras o papel dos partidos, das correntes e dos dirigentes, para o bem ou para o mal. É como dizia Trotsky, na História da Revolução Russa: “somente estudando os processos políticos sobre as próprias massas se alcança a compreensão do papel dos partidos e dos caudilhos”. Essa história dos anos 70, a história das classes oprimidas, e fundamentalmente da classe operária, foi criada nas fábricas, nos campos, nas ruas, nas cidades. Mas, infelizmente, o que se escreveu a respeito procura esconder, para mascarar o papel traidor das direções conciliadoras (Lula e Cia.), exatamente que no ascenso desse período o eixo central e ordenador de toda a luta deveria ser o Abaixo a Ditadura, posto que os trabalhadores, os camponeses e as classes médias urbanas não mais suportavam a ordem vigente, e por isso, com suas ações democráticas, greves e enfrentamentos com a polícia rompiam os limites da cena política que estabelecia o pacto pela redemocratização, renegando os antigos representantes políticos, seus partidos e instituições.

EI-B: Mas as elaborações dos intelectuais, e inclusive da esquerda, em sua maioria retratam esse “novo sindicalismo” liderado por Lula como de oposição ã estrutura sindical varguista e ã transição negociada.

V: Isso mesmo, como vínhamos dizendo, a intelectualidade petista, a esquerda e até mesmo correntes trotskistas reivindicam esse período do “novo sindicalismo” e de Lula colocando-os como dirigentes classistas e anticapitalistas. Porém, isso exige uma especial operação ideológica e histórica. É preciso esconder os fatos, a história real que expressava a potência da classe trabalhadora, as relações de Lula com setores do empresariado, da Igreja e do regime, sua aliança com os “Autênticos” do MDB, Fernando Henrique, o senador emedebista Henrique Santillo, entre tantos.Nossos estudos comprovam quão distante estava Lula e esses sindicalistas de uma oposição ã estrutura sindical vigente. Respeitavam-na tanto quanto os pelegos oficialistas, como Joaquinzão, dos metalúrgicos paulistas, que tinham como aliados os stalinistas do PCB, PCdoB e do MR-8. Pode parecer espantoso,mas em1978, esse ano histórico, Lula toma posse em seu segundo mandato como presidente do sindicato, e cumprindo a lei sindical convida para a solenidade as “autoridades” e não os trabalhadores. Esteve presente, a convite, representantes do II Exército e o senhor Cláudio Lembo, ex-governador de São Paulo em 2006, mas que na época era um senador biônico – não eleito pelo voto popular – e presidente do partido da ditadura, a Arena. Ou seja, a posse de Lula no sindicato obedecia religiosamente ás determinações da legislação sindical que perdurava desde os tempos de Getúlio Vargas, e suas relações com as “autoridades” do regime eram claras. Lula e os “sindicalistas Autênticos” se opunham como podiam ás comissões de fábrica e ás oposições sindicais que se enfrentavam com essa estrutura sindical. Ao mesmo tempo em que mantinha as greves do ABC nos marcos sindicalistas e corporativistas, negando a unificação e nacionalização das lutas operárias, independente de categoria e data base, como objetivo consciente de frear as tendências ã generalização e radicalização de uma greve geral nacional. Diversas categorias, em várias cidades e estados saiam à luta sem qualquer coordenação e centralização, com programas e planos de luta isolados. E as tendências eram claras: em 1978 cerca de um milhão de grevistas, em 1979 já chegava a três milhões; piquetes e processos de auto-organização por fábricas e empresas arrastavam as massas para a luta e inclusive ao enfrentamento com a repressão. As assembléias eram multitudinárias, e, independente da vontade dos dirigentes sindicais que procuravam transformá-las em grandes comícios, se configuravam de fato como ações operárias que disputavam e se apossavam dos territórios, rompendo a legalidade burguesa, a ordem vigente que proibia, ameaçava, mas na maioria das vezes via-se obrigada a recuar. A classe operária irrompia e trazia seus batalhões urbanos e rurais, com a potência das camadas mais exploradas do proletariado. Esse processo real se enfrentava contra as leis, a repressão e as instituições do regime militar.

Contudo, a direção (Lula e os “sindicalistas Autênticos”) tudo fazia para despolitizar o movimento de luta contra a ditadura, barrando a consigna central de Abaixo a Ditadura. Atavam as grandes greves e ações de massas à luta sindical, por reajustes nas datas base, ao invés de um programa operário e umplano de luta que respondesse aos interesses das massas. Todos os trabalhadores sofriam com os aumentos de preços e o arrocho salarial da ditadura. A classe média exigia liberdades, a volta dos exilados, a anistia e a liberação dos seus presos políticos, o combate ã carestia de vida e ã queda na renda. Mas Lula e os “Autênticos” seguiam em suas datas base negociando “pautas específicas”, categoria por categoria, respeitando a legislação e o calendário imposto pela patronal e o regime. Em 1978, por exemplo, as greves metalúrgicas de São Paulo, impulsionadas pela oposição metalúrgica a partir das fábricas, ocorriam ao mesmo tempo das do ABC, e fora da data base. Em 1979 a greve metalúrgica foi geral no ABC, e no restante do país se generalizavam lutas de caráter ofensivo, por aumento salarial, mas também contra as leis e medidas do regime militar. A solidariedade dos trabalhadores para com a greve dos metalúrgicos do ABC era uma expressão das tendências ã unificação, uma afirmação de que bastava a direção convocar uma greve geral e a formação de organismos de massas unificados para que a potência dessas lutas, em todo o país, se centralizasse e canalizasse para o enfrentamento ã ditadura militar. Um operário da época, entrevistado pelo PCdoB, declarava que “a solidariedade com nossa luta da parte dos trabalhadores de outras categorias era muito grande, a colaboração com o fundo de greve etc., mas necessitávamos de algo mais contundente... uma greve geral”. Indiscutivelmente se passava uma situação pré-revolucionária, com a classe operária de pé, desafiadora, as classes médias e as massas não mais aceitando o domínio dos “de cima”, se predispondo nitidamente a enxergar nos grevistas uma nova direção que realmente canalizasse suas necessidades democráticas, políticas e econômicas. Mas Lula e o “novo sindicalismo” atuaram como freios contra-revolucionários.

EI-B: Mas, então, qual foi o papel e os limites do sindicalismo “Autêntico”?

V: Ao contrário da história oficial dos intelectuais orgânicos do petismo-lulismo, esse “novo sindicalismo” dirigia as greves sob a camisa-de- força do sindicalismo-CLT das datas base, da negação da centralização da ofensiva operária pela derrubada do regime militar. Setores burgueses pensavam que melhor seria ter uma direção sindical confiável, com autoridade entre as massas para “negociar” e “conciliar” ao invés de deixar que a ofensiva operária seguisse se impondo pelas bases, em “greves selvagens” e métodos de enfrentamento coma patronal, a polícia e o regime. Até mesmo o governador de São Paulo, em 1979, nomeado pela ditadura, o empresário Paulo Egídio Martins, afirma que “foi muito criticado” pelos empresários da época por não haver atendido aos pedidos da Fiesp [1] para que liberasse tropas do estado para reprimir as greves de 1978. Na verdade, este empresário via em Lula um sindicalista que contribuiria para a “modernização” das relações entre capital e trabalho, isto é, a conciliação de classes, evitando conflitos, greves, principalmente greves selvagens como as que ocorriam nos anos 70 quando os operários paravam as fábricas, realizavam operações tartarugas ou de sabotagem da produção sem conhecimento dos dirigentes sindicais, or desconfiarem desses sindicalistas. Até mesmo no ABC as primeiras greves ocorreram por fora do sindicato, pelas bases. Antes da greve da Scania, em maio de 1978, ocorrera a greve da Mercedes Benz e da Ford, sem que Lula e a diretoria do sindicato tivessem papel dirigente. O governador Paulo Egídio acompanhava a vida sindical de Lula desde 1975, quando esteve presente na sua primeira posse como presidente do sindicato. Em artigo no jornal O Globo, de 15/05/2005, em que a jornalista Soraya Aggege trata do pedido de tropas pela Fiesp, o governador declara que é um capitalista e não acredita “que possa existir capitalismo sem sindicalismo forte”, considerando que “Lula era um líder sindical, e sem filiações ideológicas”, o que lhe deixou “muito curioso” a ponto de “acompanhá-lo” há vários anos. [2] Também declarou que se “entendia como Almir” (Pazzianoto, na época advogado do Sindicato dos Metalúrgicos e homem de confiança de Lula), e que os capitalistas precisavam de Lula no sindicalismo porque era preciso “modernizar o Brasil”, não escondendo que o ministro do Trabalho da época – o mesmo que decretou a intervenção no sindicato em1979 –, Murilo Macedo, “teria feito várias reuniões fechadas com Lula”. Como se vê, um estudo profundo e honesto dos anos 70 faz surgir a verdadeira face conciliadora e contra-revolucionária de Lula e seu “novo sindicalismo”, que foram se demonstrando confiáveis e funcionais ã perspectiva de amplos setores burgueses que viam na abertura “lenta, gradual e segura” a melhor saída para uma transição ordenada do regime. Isso deixa claro que não se pode surpreender que tenha sido Lula o candidato mais viável para a burguesia brasileira após a crise do neoliberalismo, e que hoje seja, como presidente da República, quem garanta a aplicação das reformas estruturais pendentes contra a classe trabalhadora, reforçando os laços que atam nosso país ao imperialismo.

EI-B: Neste ano se completam 40 anos das greves de Contagem (MG) e Osasco (SP), deflagradas em 1968. Qual o papel desse processo na luta contra a ditadura?

V: Essas importantíssimas greves configuraram o primeiro momento do ascenso pós-golpe militar. Com o golpe veio a intervenção nos sindicatos, a perseguição e prisão dos dirigentes e ativistas, levando a uma desestabilização das lutas operárias e a um retrocesso agudo da luta de classes. Essa inflexão deu início a um processo de resistência nas fábricas, e de reflexão sobre o papel das direções do PCB e sua política conciliadora do período João Goulart. Já em 1966 começava um movimento de resistência nas fábricas e um processo de reorganização contra o arrocho salarial, a inflação, o custo de vida, a pressão patronal para impor níveis maiores de exploração. Ainda que com métodos defensivos – sabotagens e operações tartaruga –, de maneira clandestina os ativistas que haviamvivido o período anterior organizavam embriões de comissões de fábrica e oposições sindicais para combater a intervenção nos sindicatos e expulsar os pelegos. Em Osasco (São Paulo), a partir da comissão de fábrica da Cobrasma [3], jovens trabalhadores e ativistas organizavam as lutas e a oposição metalúrgica, que em 1967 recupera o sindicato. Em São Paulo, a oposição metalúrgica ampliava sua atuação nas fábricas. Em Contagem(MinasGerais), a oposição metalúrgica e algumas correntes combativas reconquistavam o sindicato. Esse processo de reorganização a partir das fábricas e das oposições não foi massivo devido ás condições impostas pelo regime militar, mas alcançou vários setores da classe trabalhadora em diversas regiões. A carestia de vida e o arrocho salarial geravam descontentamento social. Esse processo de reorganização, recuperação de sindicatos e organização a partir das fábricas, apesar dos limites, se combinava com a situação objetiva de um primeiro desgaste do regime militar, produto do arrocho salarial, do custo de vida e da insatisfação dos anseios das classes médias. Nesse momento as perdas salariais chegavam a quase 40%, no bojo de um período recessivo e de alta inflação. O movimento estudantil irrompia em massivas manifestações por liberdades, contra as medidas e reformas, colocando na ordem do dia a consigna Abaixo a Ditadura. Em nível internacional vivia-se o processo de greves operárias e lutas estudantis. A radicalização do movimento estudantil se combinava com o ressurgir das lutas operárias. Cerca de 20 mil operários paravam as fábricas em Contagem, surpreendendo a todos e obrigando o governo a conceder um abono salarial de 10% extensivo a todos os trabalhadores, na tentativa do regime militar de conter a retomada das greves que se expandiam entre os bancários e outras categorias, como os metalúrgicos de Osasco. O ministro do Trabalho da época, Jarbas Passarinho, declarava que nessas lutas “não se tratava de salários. É a ordem que está em jogo”.

EI-B: Qual foi a resposta da burguesia e do bloco dominante?

V: A burguesia e os militares temiam que as greves e as lutas estudantis se combinassem num processo que centralizasse a luta pela derrubada da ditadura militar. Conscientes desse perigo a burguesia e os militares não vacilaram, partindo para um processo de dura repressão contra os líderes sindicais, os ativistas e militantes operários e estudantis, para impedir que o processo de 1968 evoluísse a uma situação pré-revolucionária que ameaçasse a ordem capitalista. Essa firme repressão, com o AI-5 [4], perseguições, prisões e assassinatos derrotou esse primeiro ascenso contra a ditadura. Estavam dadas as condições para a ofensiva burguesa, que no plano econômico levou ao “milagre brasileiro”, com crescimento econômico em taxas médias acima de 10% ás custas do rebaixamento salarial e da superexploração, aumento da desigualdade social, concentração da renda e endividamento do país. No plano político esse período ficou conhecido como os “anos de chumbo”, de perseguição ao movimento operário, repressão dura ás organizações guerrilheiras, criação de um sistema de mapeamento da militância operária nas fábricas, prisões, torturas, desaparecimentos e mortes dos lutadores operários e sociais. Uma das questões obscuras da história recente, do período pós-64, é o papel dos capitalistas na perseguição, prisão e morte de ativistas e militantes operários. Muito se fala que a ditadura brasileira foi “light”, comparando-a com a do Chile, do Uruguai ou da Argentina. Mas isso não passa de uma operação ideológica para esconder que os empresários brasileiros, ditos modernos e democráticos, foram os “professores” da patronal Argentina na “escola” de repressão aos operários e ativistas nas fábricas. Enquanto os órgãos de repressão da ditadura prendiam e assassinavam militantes da esquerda como Marighela (1969), e muitos pseudodemocratas se dizem contra esse “horror”, nas fábricas um esquema de terror militar estava sendo preparado entre os capitalistas e os órgãos de repressão dos milicos. Era a prova cabal de que não havia uma “contradição” entre o regime militar e a exploração capitalista, e a falsa ideologia propagadora da fantasia de que o “milagre econômico brasileiro” foi progressivo, bastando “estar contra a linha dura” do regime militar. Em última instância não havia uma separação entre “linhas dura” e “democratas” – com suas lágrimas de crocodilo.

EI-B: Quais os setores empresariais que apoiavam a transição?

V: Havia capitalistas interessados em manter o regime, com os meios necessários, para garantir a acumulação capitalista e o enfrentamento ã queda da taxa de lucro. A classe operária brasileira (como 1968mostrou), ao lado da luta estudantil radicalizada [5] alertou os capitalistas de conjunto sobre a ameaça ã ordem. Tratava-se, então, de dar cabo desse proletariado, impedindo que se reorganizasse. Em 1969, no dia 11 de novembro, uma semana após a morte deMarighela [6], grandes empresários da Volkswagen, GeneralMotors, Chrysler, Firestone, Philips, entre outros, enviavam seus representantes para se reunirem com o chefe do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no ABC paulista, comandado pelo major Vicente de Albuquerque, do IV Regimento de Infantaria do Exército. Esses representantes eram os chefes de segurança dessas indústrias e o objetivo dessa reunião era organizar o Grupo de Trabalho (depois chamado Centro Comunitário) que serviria de cobertura ã colaboração entre as empresas privadas do ABC, o Dops e o Exército para mapear os operários que se rebelavam contra a exploração e os ativistas e militantes nas fábricas, entregando-os nas mãos da repressão. Além de repassar recursos, carros, equipamentos aos órgãos de repressão, como se conhece sobre o financiamento empresarial ã Operação Bandeirantes (Oban), esses monopólios colocavam diretamente seus esquemas de segurança industrial sob as ordens dos militares e da polícia política para impedir a reorganização operária nas fábricas. Haviam aprendido com o processo anterior de resistência pós-golpe militar que deu nas oposições sindicais, comissões de fábrica e greves de 1968. Estudar esse período histórico é fundamental também, como se vê, para desmistificar os “empresários modernos e democratas” que se escondem sob o falso manto de que nada tiveram a ver com as prisões, torturas, mortes e desaparecimentos do regime militar. Muitos desses empresários estão aí, junto com Lula, o PT, o PCdoB, mantendo seu domínio e sua “ordem”. Vergonhosamente podemos identificar no governo Lula, muitos “sindicalistas autênticos”, militantes e dirigentes do PT, do PCdoB e do MR-8 que tiveram gente sua morta por esse esquema capitalista convivendo lado a lado com seus carrascos, administrando os negócios desses mesmos capitalistas que antes não vacilaram em organizar a perseguição, a repressão e a morte dos que lutavam contra a ditadura militar. Isso está escrito em livro, e não deve ser novidade para os dirigentes desses partidos. [7] Porém, há um silêncio cúmplice que protege o petismo lulismo que hoje mostra a que ponto pode chegar a estratégia de conciliação de classes, aliando-se no governo e nos órgãos do Estado com os “homens da ditadura”, empresários, militares, agentes da repressão, monopólios imperialistas nacionais e estrangeiros e um longo etcetera. Essa é a base para sustentar e defender as estratégias de conciliação de classes de organizações como o PCB, que buscavam setores “democráticos” no MDB e até mesmo na Arena para aliar-se na perspectiva da “redemocratização”, numa saída negociada com esses setores para terminar o regime militar e instituir uma ordem de domínio democrática. Assim, a esquerda de conjunto terminou se adaptando ã política da maioria dos setores burgueses – que passaram a defender a abertura e a transição pactuada –, ficando como ala esquerda do projeto burguês de redemocratização. Por exemplo, em nome de uma pretensa vitória contra a “linha dura”, costurou-se um pacto que envolveu setores dos militares, a patronal, a Igreja, os políticos do MDB emesmo parcelas da esquerda [8], permitindo que a luta pela anistia ampla, geral e irrestrita, a liberdade de todos os presos políticos, a volta dos exilados e a punição dos torturadores, militares, policiais, governantes e empresários responsáveis pela repressão fosse trocada por uma anistia “negociada” que garantiu a impunidade ao regime militar. A lei da anistia ficou conhecida como a “anistia recíproca”, pois anistiou também os responsáveis pelas torturas, mortes e desaparecimentos, dando impunidade a todos os governantes, empresários, policiais, agentes e oficiais envolvidos nesses crimes. Isso significou, ao nosso ver, o coroamento da conciliação de classes, e ao invés de comemorar e considerar uma “vitória” deve-se repudiar essa lei (que no próximo ano completa 20 anos), que preservou todos os órgãos de segurança, informação e repressão do período ditatorial e que continuam agindo livremente contra a esquerda e os lutadores sociais.

EI-B: Como foi se estruturando o ascenso proletário que culminou com as greves metalúrgicas de 1978-80, e posteriormente com a fundação do PT?

V: A derrota do processo de 1968 e a ferocidade da repressão não foram suficientes para garantir a sustentação e estabilização de longo prazo do regime militar. A crise econômica internacional do início dos anos 70, a do petróleo, a crise política e militar do imperialismo norte-americano engalfinhado na perspectiva de derrota na guerra do Vietnã, emlinhas gerais, minaram as condições econômicas e políticas que sustentavam o “milagre econômico”. Em 1973 a taxa de inflação era de 15,5%, saltando para 34,5% em 1974.Os poucos e parcos avanços nos índices de qualidade de vida da população despencavam. O arrocho salarial e a queda nas taxas de crescimento deterioramo nível de vida das massas e das classes médias. O descontentamento com essa situação alimenta o desgaste do regime militar. Nas eleições de 1974 a oposição burguesa (MDB) dá uma lavada na Arena, expressando elementos da crise burguesa e do regime militar. Abrem-se brechas tanto “por cima” – crises políticas no regime, parlamento etc. – como “por baixo”, com o surgimento de lutas nas fábricas emovimentos amplos contra a carestia de vida. A burguesia e os militares procuram alternativas que preservem a ordem social capitalista. Avança o projeto do presidente Geisel, conhecido como “distensão” e que propugnava a “abertura lenta, gradual e segura”, um desvio para canalizar o descontentamento social. Com esse projeto buscava-se conciliar os diversos interesses, grupos e classes sociais em nome da “redemocratização” nascida de um pacto, uma transição negociada, pacífica. Esta definição é fundamental, já que foi uma grande tática burguesa imperialista [9], que o conjunto da esquerda não soube enfrentar, se adaptando a esta transição pactuada. Esta “abertura” do regime – que concedia maiores espaços democráticos sob seu controle –, junto ao vazio político do sistema de partidos deixou toda a esquerda, desde os ultra-esquerdistas, os trotskistas e até os setores mais democratistas, prisioneiros da auto-reforma do regime, e sem ter uma política independente na luta de classes, avançando em sua adaptação ao processo de “redemocratização” que antes assinalamos.

EI-B: Qual foi a política do regime perante esta nova situação?

V: A “distensão” não era outra coisa que uma armadilha para impedir que a perda de hegemonia do bloco dominante deixasse aberta a porta para uma situação revolucionária capaz de ameaçar os pilares da dominação capitalista – a propriedade privada. Esse período assentou as condições econômicas e políticas para a retomada e recomposição operária que foram estruturando o ascenso proletário de 1978 a 1980, com o protagonismo das greves metalúrgicas no ABC, e também em São Paulo e outros estados e categorias. Em 1977 o movimento democrático pela anistia e liberdades democráticas toma impulso, com o movimento estudantil recuperando sua força. As pequenas organizações de esquerda encontram terreno fértil para reaparecer. O regime estava contestado e em crise terminal. A independência política dos trabalhadores perante todas as frações burguesas e os projetos de “distensão” teria que ordenar toda a estratégia das correntes de esquerda para a classe operária, a juventude e os setores que aguardavamuma alternativa progressiva ao regime. De cara, as direções reformistas, incluindo aí o “novo sindicalismo”, jogaram fora a consigna de Abaixo a Ditadura e colocaram como eixo de sua política a luta pela “redemocratização”. Ou seja, como sempre, essas direções buscavam impor a estratégia de conciliação de classes.Dirigiamas greves e lutas,mas justamente para canalizá-las como instrumento de pressão ás frações burguesas numa negociação dos “limites” (o “possível”) da redemocratização. Lula, em entrevista ã Folha de S. Paulo, no dia 24 de março de 1979, perguntado por um repórter se a intervenção no sindicato que ocorria naquele dia traria prejuízos, respondeu que “prejuízo maior quem traz é a falta do estado de direito. A falta de democracia.” Diante dessa política, uma das táticas esporádicas de grande importância nesse momento, para combater a armadilha da transição negociada - que usava métodos democráticos deformados (colégio eleitoral, eleições antidemocráticas etc.) para barrar a vontade popular - e responder aos anseios democráticos das massas contra o regime, teria que ser a Assembléia Constituinte Revolucionária, ou seja, imposta pela força da ação dos trabalhadores e das massas sobre as ruínas da ditadura, com o objetivo de deliberar democraticamente todas as questões fundamentais do país, incluindo a propriedade privada. Os trotskistas, assumindo esta tarefa, ligada ã construção de organismos de duplo poder, poderiam ter se desenvolvido sem a necessidade de recorrer aos “atalhos” centristas. Lula se preparava para liderar a democratização do regime no momento em que 80 mil metalúrgicos decidiam manter a greve no ABC, mesmo diante da repressão e da intervenção no sindicato. A estratégia de Lula e do “novo sindicalismo” era a mesma do PCB, PCdoB e MR-8, que dentro do MDB representavam a ala de conciliação com setores do regime militar, a burguesia e a intelectualidade, como Fernando Henrique Cardoso. Uma política independente, no momento em que mais de três milhões de trabalhadores paravam as fábricas e empresas em todo o país, e olhavam para o ABC esperando uma “ordem” de combate, exigia colocar na ordem do dia a greve geral nacional contra a ditadura militar, a organização da autodefesa das organizações sindicais, de seus dirigentes e das greves contra a repressão e os provocadores instigados pelo regime que praticavam atentados, e um programa de reivindicações democráticas e econômicas para o conjunto dos trabalhadores e das massas, superando o velho sindicalismo corporativo de datas base e campanhas salariais.

EI-B: Como se insere nestas novas condições políticas o surgimento do PT?

V: O ascenso proletário de 1978 a 1980 foi tão significativo porque demonstrou as tendências da classe operária conquistar hegemonia política e social e tambémos elementos de independência política dos trabalhadores, que chegou a impor a fundação de um partido de massas com caráter de classe. O profundo processo que estava se operando na classe operária impediu que se impusesse a estratégia de Lula e dos “autênticos” de costurar um movimento partidário “plural”, sem definição de classe, onde coubessem setores “democráticos” e uma esquerda ampla. Um tipo de partido amplo, oportunista, para a conciliação de classes. Prova disso é que em maio de 1979 os “sindicalistas autênticos” ainda buscavam aparar as arestas com um grupo capitaneado por Fernando Henrique Cardoso, Almino Afonso, MR-8 (dirigido por Zé Aníbal, ex-secretário no governo FHC e atual líder do PSDB na Câmara Federal), o senador emedebista Henrique Santillo, entre outros, em torno da proposta de fundar o Partido Popular Democrático e Socialista (PPDS). Paulo Skromov, sindicalista e ex-trotskista, fundador do PT e membro de sua primeira direção, declara em entrevista ã Fundação Perseu Abramo que “durante três dias discutimos a realidade nacional e o processo de reorganização partidária” [10]. Os operários metalúrgicos que deflagravam as greves e as manifestações, que impulsionavamos piquetes e se enfrentavamcoma polícia, conseguiram impor sua marca, fruto da hegemonia social que conquistaram. A força do ascenso era tal que resultou no PT, contra o projeto original de Lula, Igreja e Cia. Não podendo chegar ao seu plano completo, Lula e os “autênticos”, a Igreja, os intelectuais e os parlamentares, tomaram as rédeas do PT desde o início para impedir que se radicalizasse no programa, nos métodos e na estratégia de independência política dos trabalhadores.

EI-B: Quais setores da esquerda participaram deste processo, e quais foram suas políticas fundamentais?

V: Antes de falar da esquerda quero lembrar que em janeiro de 1979 foi apresentada e aprovada a tese elaborada pelos metalúrgicos de Santo André, ao Congresso dos Trabalhadores Metalúrgicos do Estado de São Paulo, que se realizou em Lins. Este Congresso com milhares de delegados, representava um milhão de trabalhadores metalúrgicos e deixava claro que o partido que queriam construir baseava sua legitimidade em que tanto o programa como seu funcionamento deveriam estar sob domínio dos próprios trabalhadores e sem interferência dos patrões. Tinha na época um enorme espaço para construir um partido, já que oMDB começou a ser visto como parte do bipartidarismo imposto pela ditadura militar, e, por outro lado, o Partido Comunista Brasileiro tinha se separado das bases operárias, por sua política de se opor ás greves que desestabilizavam a transição gradual pacífica que tinha pactuado com a burguesia “democrática”. Por sua vez, a maioria das correntes políticas da época participou da fundação do PT.

EI-B: Pode nos contar sobre as correntes de esquerda?

V: As principais correntes políticas que ainda atuam no país nasceram ou se consolidaram em meados da década de 1970. Até hoje dentro do PT está a Democracia Socialista (DS), corrente que se reivindicava trotskista, ligada ao Secretariado Unificado e ã LCR francesa, de Ernest Mandel. Essa organização está cada vez mais integrada ao estado burguês e ao social-liberalismo, atuando abertamente como liquidadora do trotskismo. Teve e tem ministros no governo Lula, e altos cargos nos órgãos estatais. Por seu lado, os herdeiros de Pierre Lambert, da França, continuam no PT como a corrente O Trabalho, cada vez mais liquidada, visto que seus principais dirigentes passaram de mala e cuia para o campo dos “autênticos” e da burguesia. Gente como Palocci, Gushiken, Clara Ant, Glauco Arbix são filhos dessa corrente, e levaram até as últimas conseqüências a linha liquidacionista dos lambertistas e terminaram se dissolvendo no PT, liderados pelo ex-dirigente da seção lambertista francesa, Luis Favre (atual marido da ministra Marta Suplicy). Mantendo-se nesse partido até hoje, mesmo tendo se tornado neoliberal, e num governo capitalista com Lula ã cabeça, a conclusão de quais eram suas políticas fundamentais está mais que óbvia. A despeito de diferenças entre elas, foram as correntes que mais se entregaram ao petismo lulismo, ã conciliação de classes e ã defesa do capitalismo. Outras correntes romperam ou foram expulsas do PT, desde a década de 1980. O Partido da Causa Operária (PCO) foi expulso em 1989, depois de 10 anos no interior do PT, tendo nascido de rachas do lambertismo. No início esteve contra entrar no PT, caracterizava Lula como pelego, mas depois, quando entraram, por volta de 1980, seguiram o curso centrista de adaptação ao lulismo recheado com críticas parciais e defesa do socialismo, em geral. O PSTU nasceu em1994, depois da expulsão, em 1992, da Convergência Socialista (CS), depois de manter uma estranha (para os princípios trotskistas) tática de entrismo no PT, permanecendo longos 13 anos. Essa corrente foi organizada por Nahuel Moreno a partir da Liga Operária (LO), em 1974, que se constituiu com militantes ligados ao movimento nacionalista de Brizola, que depois foram convencidos do equívoco da estratégia guerrilheira, foquista e passaram a defender posições “democratistas”.

EI-B: O PSTU hoje é reconhecido como o partido da extrema esquerda, e trotskista. Qual reflexão pode fazer sobre sua história?

V: Até hoje uma parcela importante de seus dirigentes pretendem assumir, pela capitulação e liquidacionismo das correntes trotskistas que ainda vegetam no PT, e pela política estéril da Causa Operária, o espaço de principal corrente portadora do trotskismo principista no Brasil. Para o PSTU, assim como a CS, vários princípios podem virar “táticas”. A independência política dos trabalhadores diante de todas as frações burguesas, sejam elas autoritárias, democráticas, neoliberais ou antineoliberais, que é um princípio inegociável para os marxistas revolucionários, virou um “ponto” a mais no programa e na prática política dessa corrente. Em 1974, ainda como Liga Operária, se prendiam ás determinações do regime militar, apresentando em seu jornal Independência Operária a política capituladora de “Votemos contra a ditadura!”. Ou seja, ao invés de denunciar as eleições fraudulentas e manipuladas do regime militar, da qual participavam apenas os partidos burgueses consentidos (Arena e MDB) sem qualquer espaço de independência política da classe trabalhadora, e exigir das direções sindicais e da esquerda a ruptura com esse regime, chamando, por exemplo, o boicote ativo ás eleições para se aproveitar do descontentamento das massas e das classes médias, a Liga Operária propunha “votar contra a ditadura”. Olha que nem estamos cobrando uma política revolucionária, apenas uma tática política preparatória para romper uma amarra fundamental que tinha a classe trabalhadora e as massas, isto é, a confiança na oposição burguesa do MDB, na conciliação de classes e nas instituições do regime (partidos burgueses, eleições etc.). Essa teria sido uma tática principista, ou seja, assentada no princípio inegociável da independência política das massas diante do regime de domínio para que começasse a confiar apenas em suas próprias forças e métodos. Ao não apresentar uma tática para a independência política dos trabalhadores, o resultado prático da política da Liga Operária de “vote contra a ditadura” não podia ser outro a não ser “vote no MDB”. Foi justamente o que ocorreu em 1974. O MDB fez a “festa” nas urnas. Para o Senado, de um total de 24,5 milhões de votos, obteve cerca de 14,5milhões, ou seja, 59%, conquistando 16 das 22 cadeiras em disputa; e a Arena (partido visto pelas massas como “da ditadura”), apenas seis. Mesmo assim, como as eleições eram parte do “jogo” do regime, osmecanismos de controle da ditadura seguiram incólumes, pois a Arena continuou majoritária no Senado, já que apenas uma parte das cadeiras estava em disputa. Essa adaptação ao regime e ao plano burguês de redemocratização não era, como se pretende sempre justificar, produto da inexperiência e juventude dos dirigentes da Liga. Por certo que era uma organização inexperiente. Mas não se pode esconder que desde o início a Liga teve um acompanhamento direto e sistemático de Nahuel Moreno, que nesse momento combatia corretamente a linha política de Mandel – que concedia vigor estratégico ás correntes guerrilheiras –, porém já começava a formular sua atualização revisionista sobre as revoluções democráticas contra a concepção trotskista da Teoria da Revolução Permanente. Os morenistas do PSTU deveriam explicar porque nunca fizeram balanços sérios de sua prática política, nem corrigiram seus erros à luz dos acontecimentos e dos resultados, medindo com a teoria revolucionária. Se tivessem esse método teriam feito o balanço de 1974, quando transformaram princípios em táticas e com isso se adaptaram ã política burguesa expressa no MDB. Confrontando o resultado dessa política de 1974 com os ensinamentos de Trotsky e Lenin, principalmente, a CS teria compreendido que a raiz dos erros oportunistas da Liga Operária se encontrava na base teórica de Nahuel Moreno e em sua revisão da Teoria da Revolução Permanente deTrotsky, com a inovação de uma “teoria da revolução democrática”. Essa concepção de “revolução como troca de regime político” – foi a base teórica dos desvios políticos de transformar princípios em táticas. Seguindo sua adaptação ã ala burguesa “opositora”, e por continuar reivindicando o “acerto” da política oportunista de 1974, em 1978 a CS acabou aliada ã Frente Nacional pela Redemocratização, novamente junto com o MDB (PCB, PCdoB e Cia.). Pior, nesse ano também ficaram com setores dissidentes do partido da ditadura (Arena) em torno da candidatura oposicionista do general Euler Bentes Monteiro e do senador gaúcho Paulo Brossard para a presidência e vice-presidência da República, contra a candidatura de João Figueiredo. Muitos trabalhadores e jovens podem até se espantar com isso, mas é a pura verdade: a corrente morenista brasileira, além de apoiar o burguês MDB, chegou a defender um general durante o regime militar, num oportunismo sem limites daqueles que buscam sempre ser “oposição de esquerda” aos governos de plantão esquecendo que para os revolucionários essa “tática opositora” tem que estar submetida ã estratégia e aos princípios da luta revolucionária pela tomada do poder, pela independência política das massas perante toda e qualquer variante burguesa (“democrática”, “progressista”) e seus planos políticos.

EI-B: Que conseqüências teve essa revisão teórica morenista da que você fala, nos acontecimentos posteriores?

V: Essa capitulação ao regime democrático burguês, fundamentada na teoria da “revolução democrática” de Moreno, que via vitórias em todo e qualquer desvio democrático burguês (na realidade, abortos de processos revolucionários), explica o fervor, anos depois, com que a CS sairia na loucura pelas Eleições Diretas, seguindo a reboque da redemocratização orquestrada pelos militares e a burguesia, em acordo com o imperialismo, e lado a lado com os conciliadores e reformistas. No terreno organizativo, de partido, que Trotsky considerava “o problema dos problemas”, quando lançaram a tática de “movimento” Convergência Socialista, o princípio da independência política da classe operária e das organizações de esquerda também foi deixado de lado. Valério Arcary, em entrevista ã Fundação Perseu Abramo, confessa que somente no segundo semestre de 1978 “a Liga Operária compreende a necessidade de romper com o bipartidarismo. Compreende que começava a haver espaço para a construção de um partido de classe na legalidade. A Convergência se lança como um movimento que pretende unir todos os socialistas, dispersos em muitos agrupamentos clandestinos, que tivessem posicionamento pela construção de um partido socialista dos trabalhadores. Nesse momento começamos a ter uma unidade maior com os sindicalistas do ABC.” [11] Em meio ã ditadura, e depois das grandes greves de 1978, a CS propunha construir um partido amplo, socialista em geral, nos marcos da legalidade do regime militar, ou seja, aceitando as regras da transição e com a ilusão de que os militares e a burguesia permitiriam. Na verdade, pretendiam fundar um partido “socialista” amplo, que não era outra coisa que um partido ã esquerda do regime democrático-burguês, sem delimitação de classes. Descontando-se as realidades distintas, não seria de estranhar a semelhança com a proposta da direção do PSTU em 2004, quando propôs a toda a esquerda do PT fundar um “novo partido” que unisse “todos os socialistas” que romperiam com este partido. Esse “PS” da CS foi superado pelos fatos, e o impulso da classe operária levou ao PT, que a direção lulista foi controlando para impor a conciliação de classes e a sua conversão em interlocutores da redemocratização.

EI-B: E depois, qual foi a política da Convergência dentro do PT?

V: Dentro do PT, a CS seguiu sem dar uma batalha principista pela independência política das massas, e a reboque da redemocratização que viria se consolidar com as Diretas Já. A burocracia lulista foi se fortalecendo na classe operária e nas massas, contando também com a impotência das correntes que se diziam trotskistas, incluindo a CS, que passaram anos “construindo o PT” e “lutando” para colocar “Lula lá”. Esse seguidismo ás direções reformistas do PT foi a marca das correntes que se dizem trotskistas, e os morenistas da CS não ficaram devendo, e até hoje reivindicam sua política oportunista. É o que se pode concluir das palavras de Bernardo Cerdeira, da direção nacional do PSTU, em junho de 2006, comemorando os 10 anos de fundação do PSTU: “Esses 30 anos foram o cenário da maior mudança já ocorrida na classe operária brasileira. Da repressão brutal sofrida na mais longa ditadura militar do Brasil, os trabalhadores se lançaram à luta nas grandes greves de 1978, 79 e 80; construíram o maior partido dos trabalhadores da nossa história, o PT; construíram a maior central operária do país, a CUT; participaram da luta por Eleições Diretas que derrubou a ditadura e quase vinte anos depois levaram o PT ao governo.” Para a direção PSTU a política aplicada nos anos 70 continua sendo correta, e por isso segue com o PSOL a mesma linha que tinha em relação ao PT. Para esses dirigentes, assim como para a antiga CS (os mesmos), as táticas de participar das eleições e de atuar nos processos de luta (que devem se inserir no marco de uma estratégia de preparar a tomada do poder), se transformaram em estratégia, e o único problema seria “não se coligar com partidos burgueses”. Em seu “balanço” sobre o PT, Cerdeira, em nome da direção do PSTU afirma que “A direção do PT, formada pela Articulação e seus aliados, [...] foi defendendo cada vez mais todo tipo de alianças eleitorais compartidos burgueses, culminando no governo Lula com uma grande frente com empresários e partidos de direita para dirigir o país. Hoje essas estratégias estão provadas: a política da Articulação levou o governo Lula a se constituir emagente submisso do imperialismo e no maior inimigo dos trabalhadores. O PSTU, ao contrário, é claramente um partido que se coloca como oposição de esquerda ao governo Lula.” [12] Ou seja, para esse partido, o balanço do PT se resume ã “estratégia” de “coligações eleitorais” com partidos burgueses. Toda a conciliação de classes que levou Lula e o “novo sindicalismo” a trair as greves em 1979 e, especialmente, em1980, nada significou. Apesar de não se falar sobre essa traição, um dos dirigentes sindicais da época no ABC (José Carlos Brito) relata no livro Maurício Tragtenberg – Uma vida para as Ciências Humanas, a passagem da traição da greve de maio de 1980. Essa derrota abriu uma nova etapa, primando a partir de então o desvio eleitoral e as negociações em torno da transição democrática, combinando com uma recessão econômica que permitiu ã burguesia demitir milhares de trabalhadores e ativistas com a conseqüente imposição dos planos de reestruturação produtiva, contando para isso com a conciliação dos sindicalistas, via delegados sindicais ou até mesmo comissões de fábrica negociadas com a patronal, como foi na Ford e em outras empresas. O proletariado do ABC deixou, depois da derrota de 1980, de ocupar a cena política nacional, e se abriu uma etapa indefinida, mas onde ainda havia condições para preparar a contra ofensiva, mas para isso se tornara fundamental ajustar as contas com a direção dos “Autênticos”, em particular com Lula. Contudo, paramanter seu seguidismo ã direção de Lula, correntes como a CS escondiam essa traição. Em seu jornal de julho de 1980 escrevia que a impossibilidade da evolução para lutas políticas e democráticas se devia ao “atraso sindical e político dos trabalhadores que não têm forte tradição de luta e organização independente”. Pasmem! Não era a direção traidora dos “novos” sindicalistas que conciliava com a patronal e setores do regime os que impediam a independência política das massas e atuavam como freios contra-revolucionários. A culpa era dos próprios trabalhadores! Para isso a direção do PSTU tem que passar por cima dos fatos da época e da combatividade exemplar do proletariado, nas fábricas, nas oposições, nos sindicatos, nas cidades e no campo.

EI-B: Quais as principais lições que extraíram desta importante experiência da classe operária brasileira?

V: Em primeiro lugar, não temos que esquecer que a experiência da classe trabalhadora brasileira dos anos 70 e os diversos fenômenos que deu origem, marcam ainda o tom de toda a vida política nacional. Lula e os dirigentes “autênticos” que o acompanhavam conseguiram estruturar e hegemonizar um forte movimento político “petista” que, ainda que com sua enorme amplitude e heterogeneidade de organizações, dirigentes e referências que o integram, constituem o que podemos considerar um amplo movimento político-sindical, com diversas alas. Hoje que Lula e o PT governam o Brasil aplicando o modelo neoliberal se produziu a ruptura desse grande movimento. O grande movimento petista herdado dos anos 70 se rompeu, mas as correntes que o integravam, ainda que estejam na oposição, seguem sustentando sua estratégia e seus métodos. No movimento operário, a aceitação da estrutura sindical varguista, que através das datas base e dos sindicatos burocratizados são um obstáculo ã “espontaneidade” operária, é o que dá identidade a este amplo movimento. Todos se adaptam a este regime que implica lutas isoladas e de pressão, eleitoralismo e negação do princípio marxista elementar da luta de classes. Em sua adaptação petista a esses mecanismos a esquerda, inclusive a trotskista, adotou o mecanismo de “data base” e “calendários de luta” para sua militância política, o que chamamos “o modo petista de militar”. Por isso é necessário e vital forjar uma nova tradição, começando por retomar e valorizar o conceito marxista de luta de classes e a necessidade de que a classe operária se transforme em sujeito de seu próprio destino. Porém, também queremos contribuir com estas teses para a necessária delimitação ideológica e estratégica que é inseparável da atualização teórico-política e programática do marxismo revolucionário contra todas as expressões do revisionismo em nosso movimento, o que também é inseparável do nosso internacionalismo.

É imprescindível que os marxistas revolucionários ganhem influência na vanguarda operária e juvenil para consolidar uma nova tradição que se delimite do reformismo, mas também das posições revisionistas do trotskismo e das correntes centristas que não combatem de maneira principista o petismo que ainda não foi superado. Nesse sentido, a importância destas teses está em nos prepararmos para um futuro ascenso operário, ajustando as contas com o último ensaio da classe operária e a atuação prática das diversas correntes que atuaram neste período e ainda influenciam a vanguarda.

EI-B: Quer adendar algum comentário?

V: Para nós, que nos esforçamos para ser parte da vanguarda mais avançada num futuro ascenso proletário, os estudos apenas começaram e devem motorizar as elaborações para recriar uma teoria revolucionária que sustente uma prática revolucionária, ajustando as contas com todas as vertentes teóricas conciliadoras. A direção do PSTU, precisamente por não ter ainda realizado a elaboração de um balanço do último ascenso proletário e da sua própria história nesse processo, tem aprofundado seus desvios e rupturas com os princípios marxistas. Hoje, no interior da Conlutas, dirigida por este partido, se dá uma discussão concreta sobre como os classistas e revolucionários devem tratar a instituição policial. Ao não extrair as lições dos anos 70 numa perspectiva revolucionária, a direção do PSTU continua aprofundando o que fazia nas décadas passadas quando se adaptava como ala esquerda ás instituições do regime democrático burguês. A direção do PSTU segue com essa política oportunista, que serve para semear confusão entre os trabalhadores e os jovens sobre o papel reacionário dos órgãos de repressão do Estado, deseducando-os dos ensinamentos dos marxistas revolucionários que diziam corretamente que um policial é um burguês fardado, nunca um trabalhador, pois a existência determina a consciência e a ação, e não os “questionamentos”. Nesses anos todos o que mais temos visto é o fortalecimento do regime e da polícia, cada vez mais violenta contra os pobres, negros e lutadores sociais. Em abril passado, no Encontro de Mulheres do qual participamos, a direção do PSTU usou todas as suas forças para votar contra nossas posições que exigiam não aceitar a participação de policiais ou “entidades” policiais na Conlutas nem apoiar seus motins. Contudo, estamos convencidos da necessidade de manter a intransigência ideológica e a necessária flexibilidade tática para confluir e nos fundir com a vanguarda operária e popular num próximo processo de ascenso proletário. Para isso nos preparamos.

[1] Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

[2] Prova de que Lula mereceria a confiança de empresários e burgueses, e não era um “classista”, “independente” ou “anticapitalista” como dizem os intelectuais orgânicos do PT (com a complacência da esquerda), podemos ter com uma informação pouco difundida. De acordo com o Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro publicado pelo CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, Lula, durante o início da década de 1970, viajou aos Estados Unidos, para realizar curso de qualificação sindical no Instituto Interamericano de Sindicalismo Livre, central sindical patronal norte-americana, completamente atrelada ao estado imperialista. Há pouco tempo o ex-assessor de Lula, o sociólogo Francisco Wellfort, ex-ministro de FHC, escreveu artigo dizendo que em 1980 esteve com Lula em viagem pelo mundo e, nos EUA, tiveram “rusgas” com os dirigentes da AFL-CIO que cobravam acertos de contas dos recursos enviados a ele

[3] Grande indústria de material ferroviário.

[4] OAto Institucional n° 5, foi o quinto decreto emitido pelo regime militar, em 13 de dezembro de 1968, pelo presidente generalArtur da Costa e Silva. Instrumento de exceção, dando poderes absolutos ao governo que decretou o fechamento do Congresso, a proibição de reuniões e manifestações públicas de caráter político, instauração da censura prévia, suspensão do habeas corpus para os chamados “crimes políticos” etc.

[5] Apesar da estratégia guerrilheira da grande maioria das direções do movimento estudantil, que é oposta ã mobilização das massas contra a ditadura militar, consideramos que era uma luta radicalizada porque levantava a tarefa de lutar contra a ditadura numa perspectiva não pacifista, militando de maneira clandestina, enfrentando torturas, se enfrentando com a polícia etc

[6] Dirigente do PCB que rompeu em 1966 e organizou o grupo guerrilheiro Ação Libertadora Nacional (ALN). Assassinado numa emboscada policial dirigida pelo todo-poderoso delegado Sergio Paranhos Fleury, no dia 4 de novembro de 1969.

[7] Antonio Luigi Negro, historiador. Linhas de Montagem, Editora Boitempo, 2004.

[8] O Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA) foi fundado em1978, centralizando a luta pela anistia que vinha desde o final da década de 1960. Um grupo de advogados de presos políticos se associava em um manifesto por anistia ampla, geral e irrestrita com a Ordem dos Advogados do Brasil, deputados do MDB, Igreja Católica e várias personalidades. Também estava o general Peri Beviláqua que fora um membro do comando militar golpe de 1964. O PCB, que fazia parte dos “autênticos“ do MDB, foi um dos principais atores deste pacto com os militares. Deputado ã época, Roberto Freire (ex-presidente do PCB, hoje do PPS), foi um dos que articulou o pacto com os militares e votou, junto com outros deputados da “oposição”, a favor da Lei da Anistia pactuada, aprovada por 206 votos a favor e 201 contra. O pacto foi tão vergonhoso que no dia da votação havia outra emenda, de um deputado da Arena (governo), que anistiaria todos os perseguidos, mas esta foi derrotada para que fosse aprovada a do governo, restringindo o alcance da anistia e deixando de fora os militantes da esquerda que tivessem cometido “crime de sangue”. Os preços políticos eram contra a lei proposta pela ditadura. Mas a conciliação não poderia parar. Isso mostra como o PCB (stalinista) foi criminoso em sua conciliação com os militares e a burguesia. Declara que “votou a favor da proposta do Governo e acredita que, naquele momento, tomou a posição mais correta”, justificando que “nós (da esquerda) não podíamos ser contrários a nenhum tipo de anistia, ainda que ela não fosse a que desejávamos: ampla, geral e irrestrita” [Diário de Pernambuco, 27/08/2007].

[9] No final da década de 1970, ocorre o giro da política internacional deWashington sobre os direitos humanos, e a transição ganha impulso com a visita do presidente dos EUA Jimmy Carter ao Brasil.

[10] Memória. Paulo Skromov. Fundação Perseu Abramo. 30/08/2005.

[11] 11www2.fpa.org.br/portal/modules/news/article.php?stor yid=634.

[12] www.pstu.org.br/partido_materia.asp?id=2026&ida=0.

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