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Ferguson: "não é um momento, é um movimento"
por : Juan Andrés Gallardo

26 Nov 2014 | A decisão de não apresentar acusações contra o policial Darren Wilson, que assassinou o jovem afroamericano Michael Brown em agosto passado, incendiou a ira dos manifestantes em Ferguson mas também se estendeu como uma onda de repúdio por todo o país.
Ferguson:

A decisão de não apresentar acusações contra o policial Darren Wilson, que assassinou o jovem afroamericano Michael Brown em agosto passado, incendiou a ira dos manifestantes em Ferguson mas também se estendeu como uma onda de repúdio por todo o país.

O caso Brown é emblemático porque já se converteu em um ícone que supera amplamente o que se poderia ter contabilizado como um assassinato a mais de um jovem negro por parte de um policial branco. Ferguson atuou como catalisador: a brutalidade do assassinato de um jovem desarmado, o acobertamento inicial por parte da polícia, a repressão brutal das primeiras manifestações, a militarização sem precedentes da cidade, e o racismo aberto de um Ku Klux Klan que se manifesta livremente pelas ruas. Estes são alguns dos elementos que converteram este caso no emblema de uma nova etapa, ou de um novo movimento, da luta contra o racismo.

São os próprios manifestantes de Ferguson os que expressam que não se trata de “um momento, mas de um movimento”, ou seja, que não é só a luta pontual por justiça para Michael Brown, mas que é o disparador de um questionamento profundo de um racismo social. Mais ainda, é o questionamento ã ideia de uma sociedade pós-racial quando da entrada de Obama na Casa Branca.

Como dizíamos, a construção política dessa “ilusão” pós-racial foi “reforçada com a eleição do primeiro presidente negro, que confunde a ampliação de direitos e um discurso politicamente correto com a eliminação do racismo”. Ferguson não só pega no eixo dessa ilusão, mas abre a possibilidade e “coloca o interrogante de se a juventude negra será o novo emergente da ‘geração dos movimentos’”.

Ainda que seja uma pergunta de resposta ainda incerta, o que já se pode afirmar é que desde agosto se vem expressando um descontentamento entre setores da juventude negra, que já não responde ã autoridade de alguns dos “emblemas” da luta pelos direitos civis, como o Reverendo Al Sharpton, que vinham atuando politicamente como figuras de desvio para uma passividade nos marcos do bipartidarismo. Ou seja, evitar rebeliões ao estilo da de Los Angeles em 1992, ao mesmo tempo em que atuam como nexo entre a comunidade negra e o partido Democrata.

A desconfiança em Al Sharpton, que alguns manifestantes expulsaram dos protestos em Ferguson, é mostra deste “choque geracional” e expressa a erosão da legitimidade de líderes históricos do movimento, como também uma contratendência ã carga simbólica e ideológica que produziu sobre a “concepção pós-racial” a chegada de um afroamericano ã Casa Branca.

É por estes motivos que Obama se apressou a fazer declarações, a alguns minutos de conhecida a sentença do grão jurado de St. Louis. Seu discurso esteve destinado a fortalecer a ideia de que a comunidade negra tem de lutar de forma pacífica por seus direitos, repudiar os revoltosos e subordinar-se aos ditames da justiça.

Tratando de fazer malabarismos, Obama afirmou que “nas últimas décadas fizemos grandes progressos nas relações raciais, fui testemunho disso em minha própria pele, mas segue havendo problemas” e chamando os manifestantes a realizar protestos pacíficos, e condenando os distúrbios de “uma minoria”, afirmou que “há maneiras de canalizar suas preocupações construtivamente”.

Não obstante o relato de Obama se mostrou absolutamente efêmero. Enquanto ainda dava seu discurso, a polícia de Ferguson já estava disparando gás lacrimogêneo sobre os manifestantes.

Como contraposição a este discurso de Obama, um setor dos manifestantes de Ferguson dava a conhecer uma carta aberta frente ã decisão do grão jurado, onde expressam o seguinte:

“Durante 108 dias, nos aconselharam que deixássemos que o ‘sistema funcionasse’, esperar e ver qual seria o resultado. Já estão prontos os resultados. E ainda não temos justiça. Esta luta pela dignidade de nossa gente, pela importância de nossas vidas, pela proteção de nossos filhos e filhas, não começou com o assassinato de Mike Brown e não terminará com este anúncio. O ‘sistema’ no qual nos disseram que nos apoiássemos nos manteve ás margens da sociedade. Este sistema nos alojou nas piores casas, educou nossos filhos e filhas nas piores escolas, encarcerou nossos homens a níveis inimagináveis e envergonhou nossas mulheres por receber o apoio que necessitam para serem mães. Este sistema no qual nos aconselharam acreditar nos decepcionou consistente, inequívoca e descaradamente, nos expulsou uma e outra vez.

Este mesmo sistema no qual vocês nos dizem para confiarmos, o mesmo sistema destinado a servir e proteger a cidadania, uma vez mais assassinou dois de nossos irmãos desarmados [Akai Gurley, no Brooklyn, e uma criança de 12 anos, Tamir Rice, em Cleveland] (...) Seguiremos lutando porque sem luta não há progresso. Seguiremos ‘interferindo na vida’, porque se não ‘interferirmos’, temeremos por nossas vidas (...) E até que este sistema seja desmantelado, até que o status quo que nos considera de menor valor que outros já não seja aceitável ou rentável, seguiremos lutando. Lutaremos. Protestaremos (...) Marchamos com um propósito. O trabalho continua. Isto não é um momento, mas um movimento. O movimento vive”.

Esta carta aberta, ainda que reflita conclusões de um setor que vem fazendo uma experiência de mais de três meses em Ferguson, é em linhas gerais expressão de um descontentamento generalizado que já superou amplamente os limites da cidade e se começou a expandir ao largo do país.

 

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