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A LIT-QI se afunda no complexo cenário sírio
por : Diego Dalai , Graciela López Eguía

14 Nov 2013 | O processo revolucionário que começou na Tunísia e se estendeu pelo norte da África a Líbia e Egito chegando ao Iêmen e Síria se encontra estancado e em retrocesso, inclusive nos países que havia conseguido derrubar os ditadores, ainda que de nenhum modo se fechou pois sua profundidade se assenta sobre um estancamento econômico da região, expressão da (...)
A LIT-QI se afunda no complexo cenário sírio

O processo revolucionário que começou na Tunísia e se estendeu pelo norte da África a Líbia e Egito chegando ao Iêmen e Síria se encontra estancado e em retrocesso, inclusive nos países que havia conseguido derrubar os ditadores, ainda que de nenhum modo se fechou pois sua profundidade se assenta sobre um estancamento econômico da região, expressão da crise financeira internacional [1], que alenta o desenvolvimento do movimento de massas impulsionado por uma combinação de demandas democráticas e sociais. Disso deriva a importância dos debates que se desenvolvem entre as correntes de esquerda na hora de estabelecer uma estratégia revolucionária da classe trabalhadora. A LIT-QI publicou em sua página no dia 14/10 um extenso debate assinado por Ronald León Nuñez contra as posições sustentadas pela FT-QI, em que tentam nos colocar como supostos portadores de um “abstencionismo sectário”. Sua nota pretende centrar a polêmica no problema de se exigir armar ou não ao imperialismo para os rebeldes, para escapar da discussão de fundo que desde a FT-QI viemos colocando para a LIT-QI em torno ás desastrosas consequências de sua concepção semi-etapista de “revolução democrática”, que rompe com a teoria da revolução permanente à luz do processo revolucionário árabe, e em particular hoje, e em particular hoje da Síria.

A LIT-QI reconhece que “O Velho Trotsky alguém que sabia o suficiente de guerras e de temas militares, fundador e dirigente do Exército Vermelho, se referindo ã revolução espanhola e ã guerra dizia: Numa guerra o resultado depende uma quarta parte ou menos do militar, e umas três quartas partes ou mais, da política” [2]. Mas se refugiando detrás da reivindicação de “armas”...quer evitar precisamente a discussão da política de conjunto que os trotskistas devem impulsionar. Por isso, é falsa sua afirmação de que a “verdadeira crítica da FT que se mantém é que exigimos ‘armas para os rebeldes’. Esta é a verdadeira discussão”. Não, o que lhe discutimos ã LIT-QI é que reivindica “armas”...para sua política de “revolução democrática”, adaptando-se ao campo burguês anti-Assad e seu setor “não fundamentalista”. Ou seja: defendem uma versão semi-etapista da revolução (aproximando-se das concepções mencheviques) em lugar de impulsionar uma estratégia independente de classe, fundada na concepção trotskista da revolução permanente, defendida pela FT-QI.

“Tremendas” e “impressionantes vitorias” o fiasco da “revolução democrática”?

Comecemos lembrando o posicionamento da LIT-QI no processo da primavera árabe. Na Líbia primeiro festejaram a derrubada de Kadafi dizendo que “...saudamos efusivamente estes fatos que constituem sem lugar a dúvidas, uma tremenda vitória política e militar do povo líbio e de todo o processo revolucionário que sacode o mundo árabe...estamos diante de uma impressionante vitória de um povo que tomou as armas” [3], ignorando a importância da intervenção da OTAN que terminou dirigindo política e militarmente ao campo rebelde, posição capituladora com a qual debatemos em diferentes notas [4].

Agora, lavam as mãos desta incrível reivindicação do “triunfo” na Líbia com intervenção do imperialismo, defendendo em sua Declaração de 27/9/13 que: “a LIT (na Síria) estivemos sempre contra a intervenção imperialista porque essa intervenção tinha o objetivo de tentar controlar e derrotar a revolução desde dentro, para estabilizar sob seu controle o país e a região” [5]. Mas o certo é que em seu momento definiram que haveria uma “unidade de ação” com o que ficava embelezado no papel do imperialismo “democrático”. A LIT-QI deveria se perguntar como é possível que se sucedam, segunda ela mesma, os “tremendos”, “enormes” triunfos das massas, sob as mãos do imperialismo justamente nos países semicoloniais como a Líbia, onde a resolução das demandas democráticas e sociais das massas estão indissoluvelmente ligadas ã tarefa democrática por excelência que é a libertação do imperialismo.

Mais tarde no Egito saudaram também como um “grande triunfo das massas” a queda do governo de Morsi, sem dizer que começou como uma importante mobilização popular pedindo a destituição do presidente eleito, mas que finalmente foi expropriada e se impôs com a intervenção militar que terminou restaurando o poder do exército. Com uma máscara de governo civil os militares de al-Sisi (alto oficial do exército mubakharista) desataram uma selvagem repressão contra a Irmandade Muçulmana e os setores populares que a apoiam; estabeleceram o Estado de Sítio endurecendo as condições de repressão contra os setores mais combativos dos operários, como as greves em Suez, e mais recentemente até deixaram em liberdade o ditador Mubarak pondo a nú o caráter reacionário do novo governo.

A LIT-QI não distingue que uma coisa são as massas com suas organizações e seus métodos derrotando o governo de Morsi, e outra muito diferente é que o faça o exército expropriando-lhe o triunfo da mobilização com o objetivo de avançar em direção à liquidação do processo revolucionário de conjunto. Como se fosse pouco, defenderam a consigna de lutar por uma “Assembleia Constituinte livre e soberana, sem a participação de militares nem da Irmandade” e até levantaram a de “Nenhum direito democrático nem de expressão para a Irmandade e seus líderes políticos, enquanto se mobilizem pelo retorno de Morsi!” [6], quando os militares já no governo desatavam a repressão sobre a Irmandade. Uma clara adaptação ao campo burguês que é integrada pelos burgueses civis laicos, liberais, nacionalistas e a opinião pública influenciada pelos meios de comunicação que colaboram com os militares que tenta negar os direitos democráticos mínimos de expressão e mobilização a um setor que representa a uma enorme porcentagem da população do Egito, e que havia ganhado as eleições de maior e junho de 2012. O que diz a LIT-QI do “grande triunfo das massas” depois do massacre de centenas de militantes da Irmandade Muçulmana que se manifestaram pacificamente pela volta de Morsi, após a ilegalização de tal organização e mais de 50 manifestantes perderam a vida durante a repressão nos atos de 40 anos da guerra de Yom Kippur?

A LIT-QI rompeu com a concepção permanentista de Trotsky e como temos discutido em várias ocasiões, continua aferrada a uma teoria da “revolução democrática” onde não seria necessária a intervenção do proletariado como classe e sua vanguarda mais consciente organizada num partido revolucionário para a tomada do poder político, mas que é suficiente derrubar o “tirano” e conquistar os direitos políticos civis de uma democracia parlamentar (burguesa) como primeiro passo para uma futura revolução socialista (que nunca chega). Partindo de sua concepção objetivista em que o único que importa é a mobilização em si, sem importar quem a dirige e com qual programa, para a LIT-QI as transformações nos regimes ditatoriais ao longo do processo da primavera árabe são todas “vitórias” que vão se acumulando sem nenhum porém, a favor das massas. Ainda que esta visão vá contra os fatos, a LIT-QI sustenta para que não se derrube a base de sua concepção de revolução democrática. Para a LIT-QI nem sequer é decisivo o nível de irrupção das massas no “governo de seus próprios destinos”, critério fundamental de Trotsky em uma revolução: basta com que algum tipo de levantamento, crise política, ou enfrentamento armado. É por isso que para a LIT-QI o mesmo vale para a queda de Mubarak pela mobilização das massas, que se enfrentaram durante dias contra as forças repressivas com mais de mil mortos e onde a classe operária teve um papel decisivo no último momento, abrindo-se um profundo processo revolucionário que a queda de Kadafi onde o imperialismo cooptou as milícias rebeldes e definiu a situação com as bombas da OTAN.

A verdadeira dinâmica do levantamento popular na Síria

As manifestações das massas sírias de 2011 foram parte do levantamento revolucionário da primavera árabe. O levantamento na Síria começou após o governo ter prendido a 15 estudantes por pintar grafites contra Assad, o que desatou a mobilização que teve seus inícios com uma forte composição de juventude organizada através das redes sociais. As forças de segurança assassinaram quatro manifestantes e a partir deste momento, os protestos que se iniciaram com exigências de reformas democráticas ao governo, foram aumentando, chamando agora sim ã queda do conjunto do regime. Mas o regime conseguiu resistir, se manteve em pé e contra-atacou com uma feroz repressão foçando o enfrentamento armado, a guerra civil. O levantamento não conseguiu dar um salto qualitativo, e a classe operária não participou ou o fez de forma totalmente diluída, enquanto que as duas greves gerais chamadas não tiveram continuidade, nem conseguiram imprimir um caráter proletário ao movimento de conjunto. A situação foi retrocedendo e tomou a forma de uma guerra civil na que os elementos de irrupção espontânea das massas se foram diluindo, enquanto no campo rebelde passaram a primar distintas facções burguesas, imprimindo traços de divisões étnicas e confessionais ao heterogêneo e fracionado movimento. A sangria causada pela repressão, a ruína da economia, com inumeráveis centros de trabalho destruídos ou inutilizados, o êxodo de quase dois milhões de refugiados, a destruição dos serviços públicos essenciais após dois anos de guerra civil tiveram efeitos depressivos sobre o movimento de massas, unido ao nefasto papel das direções burguesas e islamistas. O peso sunita na rebelião, agitando o fantasma da “islamização” da Síria, que sob o regime ditatorial do Baath é um Estado laico, empurra ao apoio a Al Assad ã minoria alawita, assim como os cristãos e setores kurdos. Ao mesmo tempo, a ditadura tem o apoio do Ira e seus aliados, como o Hezbollah. Neste marco, refletindo a importância geopolítico da Síria na região, o imperialismo e distintas potências enfrentadas ao regime de Al Assad, temem que se estenda a influência iraniana e apoiam a diversas facções rebeldes, buscando fazer valer seus próprios interesses. A Turquia, uma potência aliada aos EUA, interessada em evitar que a crise síria detone um processo incontrolável entre os curdos em sua fronteira, sustenta ao ELS, permitindo usar seu território como santuário e apoiando-o com armas e ajuda de todo tipo. Os Estados Unidos e a Europa preferem uma unificação da resistência que ponha limites ás frações islamistas salafistas, ainda que incluindo os muçulmanos moderados (Irmandade Muçulmana). Por isso, não é casual que Al Assad tenha festejado a derrubada de Morsi pelos militares no Egito.

A violência da crise síria faz com que o imperialismo e Israel temam que um colapso do regime e suas Forças Armadas leve ã desintegração do país, com imprevisíveis resultados desestabilizadores para o Líbano e toda a região. Isso levou ao imperialismo a não se arriscar a uma intervenção direta, mas buscar outras variantes que possam evitar cenários de colapso como o do Iraque ou o da Líbia, de desintegração do regime tendo em conta ademais, a firme oposição da Rússia e da China (que apoiam Al Assad) a uma agressão militar aberta.

O acordo entre os Estados Unidos e a Rússia busca preparar o terreno para abrir negociações, “convencendo” Al Assad de permitir o ingresso de enviados da ONU e destruir seu arsenal químico. Ainda que isso seja difícil, no imediato modificou o cenário da guerra civil, permitindo ao regime recuperar terreno e obter um importante respiro. A própria LIT reconhece que a situação de guerra civil está “num impasse que pode se prolongar” [7]. Mesmo assim, insiste em que há uma grande revolução desenvolvendo-se na qual as massas são as grandes protagonistas da guerra civil. Força a esquerda, exagerando enormemente a verdadeira situação e relações de força, para justificar sua posição e em nome desta análise nos recomenda que sigamos ao marxismo que “sempre nos ensinou que nunca se pode confundir, como faz a FT o caráter objetivo dos processos com sua direção. Da mesma forma que não confundir a justeza de uma greve operária com sua direção burocrática, não devemos confundir a justa causa pela qual luta o povo sírio com suas direções traidoras” [8]. Mas os que confundem são eles falsificando o verdadeiro processo sírio.

Hoje na Síria não avança uma grande revolução (no sentido marxista), como por exemplo sim foi, apesar da direção reacionária dos aiatolás, a revolução iraniana de 1979, na que a classe trabalhadora com a greve geral teve um papel decisivo na derrota do Xá e construiu shoras (conselhos) operários, que surgiram inclusive em setores das fragmentadas forças armadas. Estes organismos não guardam nenhuma semelhança com os Comitês Locais que há em certas zonas da Síria, e que a LIT-QI esgrime como uma expressão da “revolução síria”, mas que estão subordinados ás direções dos aparatos rebeldes. Na Síria, sob a forma de guerra civil não se está desenvolvendo um grande auge revolucionário de massas, que bate e decompõe as Forças Armadas, tomando em suas próprias mãos o enfrentamento armado no sentido de poder operário e popular; mas que o inicial levante popular retrocedeu. O que prima amplamente no cenário é uma guerra civil de “aparatos” onde de um lado está o ditador Assad que conserva o essencial do poder estatal e da maior parte do exército, e de outro uma série de milícias irregulares, financiadas e organizadas pelos principais países da região (Turquia, Arábia Saudita, Qatar) que até chegaram a se enfrentar entre si [9] e se atomizaram ao movimento de massas disciplinando-o em suas diversas frações [10], segundo divisões locais, étnicas e confessionais, relegando (salvo a consigna de derrubar Assad) as profundas reivindicações das massas e impedindo uma ação unificada contra a repressão do regime.

Não há uma participação central da classe trabalhadora com suas organizações e seus métodos de luta (incluindo verdadeiras milícias operárias e populares); nem um movimento de massas atuando como sujeitos centrais, como poderia ser uma guerra de libertação nacional. Não negamos que há setores de massas na resistência ao ditador e fazem parte também da guerra civil, mas não se pode desconhecer que carecem de poder político e militar independente e se encontram subordinados aos aparatos armados.

Espanha e Síria, diferenças fundamentais que a LIT-QI desdenha

Baseando-se em sua errônea caracterização de grande revolução em marcha [11],a LIT pretende equiparar a atual situação síria ã da revolução e guerra civil na Espanha (1936-1939) [12].Este seria o fundamento para sustentar sua política de se localizar no campo progressista e desde aí, fazer eixo na demanda de “armas e apoio material para a resistência” dirigida ao imperialismo. Por isso, afirma que “Trotsky foi o primeiro em condenar energicamente a negativa dos governos da Inglaterra e França (de enviar armas) durante a guerra civil espanhola, como uma atitude que só fortalecia ao fascismo e além disso, sempre colocou que os revolucionários deveriam utilizar as contradições do imperialismo e poderiam aceitar armas para continuar sua luta” [13].

Estamos de acordo com o conteúdo geral. Nós nunca nos opusemos por princípio a exigir e receber alimentos ou ajuda de qualquer tipo, inclusive armas, a favor das massas operárias e populares, no marco de desenvolver um processo revolucionário aproveitando as contradições burguesas-imperialistas. O que rechaçamos é que a questão militar se constitua como um fim em si mesmo, como faz a LIT-QI, ocultando o conteúdo oportunista de sua política sob esta pretensão. Por isso do que se trata é de definir “armas para qual política?”, pois a questão militar para os marxistas está subordinada ã política, expressão de uma estratégia de classe. Para começar é preciso demonstra a fantástica identidade que a LIT-QI estabelece entre a Síria e a Espanha de 1936/39. A LIT-QI se nega a reconhecer a importância das grandes diferenças entre ambas as situações e tratando de prevenir-se colocam que: “Nos dirão: A Espanha é diferente da Síria! Pois existiam fortes organizações da classe trabalhadora. Isso é verdade. Existem muitas diferenças entre a revolução espanhola e a atual revolução síria. Mas existem duas coincidências fundamentais: as duas revoluções se expressam em guerras civis e nenhuma foi dirigida por um partido revolucionário, nem a classe trabalhadora atuou como um “sujeito político independente” [14]. Não, a diferença decisiva é que na Espanha se desenvolvia uma grande revolução operária e camponesa. O ascenso operário e popular contra o golpe fascista abriu um grande auge revolucionário e uma situação de amplo duplo poder no território republicano. É certo que na guerra civil subsequente se enfrentavam dois campos burgueses definidos: o fascismo e a república [15], mas nesta última se encontravam os operários alçados em armas que tomavam as fábricas sob seu controle, como em Barcelona, enquanto os camponeses expropriavam aos latifundiários em regiões inteiras e coletivizavam a terra (Aragon). O faziam como sujeitos centrais, social e politicamente diferenciados como classe, através de suas organizações de classe, principalmente os sindicatos e as milícias, enquanto que os republicanos burgueses consistiam apenas de uma “sombra” da burguesia sustentada pelos partidos reformistas (PSOE e PCE) e os dirigentes anarquistas.

A guerra civil espanhola foi consequência da imensa e mais importante e heroica revolução operária do período do entre-guerras que se iniciou em 1931 e se estendeu durante quase uma década, onde a classe trabalhadora sim atuou como um “sujeito político independente” ainda que sob direções reformistas. É por isso que Trotsky conclui que, como mostraram as heroicas ações do proletariado espanhol basta recordar as jornadas de maio de 1937 em Barcelona!.. a classe trabalhadora não deu, frente a suas direções reformistas, “o menor sinal de tal submissão. O caminho da luta seguido pelos operários cortava em todo o momento sob um determinado ângulo o das direções e, nos momentos mais críticos, este ângulo era de 180 °. A direção então, direta ou indiretamente ajudava a submeter os operários pela força das armas. [16].

Pelo contrário, a guerra civil síria é consequência do aborto e desvio das mobilizações de massas produzidas no começo de 2011. Na Espanha o proletariado pôs em pé em 1934 a Comuna de Astúrias (um governo de duplo poder regional). Já em 1936, enfrentou e derrotou em grande parte do território ao golpe franquista e em seguida organizou suas próprias milícias, tomou as fábricas e impôs o controle operário na Catalunha, enquanto no campo se expropriava os latifundiários ao calor da guerra civil contra o fascismo. Não há nada comparável na Síria.

Ainda assim, a LIT incorre numa insustentável analogia entre as direções rebeldes sírias de caráter burguês e pequeno-burguês e sem peso de organizações operárias, como é o caso do ELS, a Frente Popular espanhola, na qual figuravam correntes reformistas com peso de massas e que se apoiava nas grandes centrais sindicais. Por isso, não compreende o sentido da citação de Trotsky que temos usado na nota anterior: “...Defenderemos a ideia de que os sindicatos devem coletar dinheiro, não para o governo, mas para os sindicatos espanhóis, para as organizações operárias” [17]. Ronald Leon usa a seguinte frase: "Se nos objetam que sindicatos espanhois estão ligados ao governo, e, portanto, enviar dinheiro seria inadmissível, responderemos citando um exemplo: durante a greve dos mineiros na Grã-Bretanha em 1926, enviamos dinheiro para os sindicatos dos mineiros, cujos líderes estavam intimamente ligados ao governo britânico ... ", nem percebem que Trotsky está falando de organizações proletárias com direções reformistas, e não um aparato alheio a classe trabalhadora como é o ELS , cuja direção é exercida pelo general Idris, ex-oficial do Exército Al Assad, e é composto de numerosos oficiais e ex-soldados que desertaram, financiado e protegido pelo apoio turco e imperialista.O ELS surge em julho de 2011, quando um grupo de oficiais militares sírios anunciou sua renúncia, denominando-se "Exército Sírio Livre" e prometendo uma guerra de guerrilha contra a Al Asad. Atualmente, o ESL é a principal referência das milícias e consiste de vários grupos rebeldes, incluindo setores muçulmanos sunitas que lutam contra os alauítas (seita minoritária, perto do Islà xiita de Al Assad) e alguns próximos aos salafistas. Ainda que o "Jabhat Al-Nusra" (Frente Victory, ligado ã Al-Qaeda) é organizado de forma independente, também há as milícias locais, que são compostas em grande parte de oficiais e desertores e civis em geral, incluindo os comerciantes e até mesmo membros do partido Baath de Al Assad.

Como eles mesmos admitem: "Nós todos sabemos que a grande maioria das milícias rebeldes são liderados por lideranças burguesas, como o Conselho Nacional Sírio (CNS), ou a cúpula dos ELS, que também são profundamente pró-imperialista. Também é inegável que a classe trabalhadora como um sujeito social, não só não é o líder da revolução, mas atua na resistência ã ditadura em forma diluída " [18].. No entanto, não dá qualquer importância a isso na formulação da sua política. A LIT-QI nem sequer tentar definir quais são especificamente os setores que devem ser apoiadas por ser progressiva e independente, qual o programa tem ou o que são suas organizações.

Há que lembrar que o ELS é representado na Coalizão Nacional para as Forças da Revolução e a Oposição Síria (CNFROS), ã qual também aderiu o Conselho Nacional Sírio (CNS), tentando unificar a oposição com um programa de colaboração com o imperialismo, e pedindo a intervenção deste (por exemplo, pedindo a Obama para instalar mísseis Patriot na fronteira turca "para proteger os civis"). Nas CNFROS, reconhecido pela Liga Árabe, e vários países imperialistas (como a França) têm peso da Irmandade Muçulmana, e uma variedade de figuras da oposição burguesa. A CNFROS recentemente nomeou como "primeiro-ministro do governo interino", o muçulmano moderado Ahmad Yarba. Enquanto isso, os setores fundamentalistas, como a Frente Al Nusra e outros que querem um Estado islà¢mico baseado na sharia, são mantidos separados [19].

Forçando os fatos, a LIT coloca uma enorme ênfase na comparação entre a Síria e Espanha, mas não implementa as estratégicas recomendações Trotsky: a política e, claro, as armas, devem servir para fortalecer as posições de classe, para garantir "a vitória de uma classe sobre a outra" [20]. A LIT-CI acredita que a tarefa atual é a de derrotar o ditador não importa com que a política e métodos, pelo que deve ser localizado sem mais no campo rebelde, e só precisa de armas, não importa quem as empunha, sem perguntar-se se massas e o proletariado podem usá-los para seu proveito. Na realidade, a relação que Trotsky colocava se inverteu para a LIT, os problemas de estratégia e política independente são secundários e em nada compartilham sua perspectiva de classe, as armas é que são essenciais já que a tarefa é "ser os melhores soldados" contra Al Assad.

A LIT convenientemente esquece outra diferença fundamental entre a Espanha e a Síria: a Espanha foi e é um país imperialista, opressor de nacionalidades em tempo de guerra civil, com colónias em África. Em vez disso, a Síria é uma semicolonia, um país oprimido pelo imperialismo. Portanto, consideramos que para caracterizar rebeldes o critério de sua atitude para com o imperialismo é essencial. Os dirigentes da LIT poderiam recordar, por exemplo, que Nahuel Moreno colocou este problema tão crucial para definir a posição ante as diferentes forças na revolução angolana e na guerra civil, quando os guerrilheiros da FNLA- UNITA, que tinham sido parte da luta contra o colonialismo português vieram a colaborar com a agressão imperialista e sul-africana contra o triunfante MPLA [21]. Em contraste, na Síria, na Líbia, a LIT só os mede com a marca democrática se sua oposição ã ditadura, sem atribuir importância qualitativa de sua relação com o imperialismo "democrático". Por isso chamam a "incentivar a mobilização mais ampla para exigir de nossos países e governos de todo o mundo, inclusive nos países imperialistas a expedição imediata de armas pesadas, medicamentos e todo material de apoio para as milícias rebeldes do ESL e comitês Coordenação Local, sem condições de qualquer tipo" [22].

Por isso, insistimos, o debate central não é se deve-se ou não pedir armas do imperialismo como quer acreditar a LIT, mas para que política e qual o programa. No desenvolvimento da Guerra Civil Espanhola, contra o fascismo, Trotsky discute o programa para o triunfo do campo republicano como parte da estratégia da classe operária no caminho para alcançar a ditadura do proletariado "...a única maneira de garantir a vitória na Espanha é dizer aos camponeses: "A Terra espanhola é sua "; dizer aos trabalhadores: " as fábricas espanholas são suas. Esta é a única maneira de garantir a vitória ... " (Os revolucionários na guerra civil). E continua, "o que nos interessa não é a vitória militar em si, mas a vitória da revolução, ou seja, a vitória de uma classe sobre a outra . " O revolucionário russo afirmou categoricamente que " as condições de vitória ", estavam asseguradas no marco da revolução social, programa ao qual estava subordinado e do qual dependiam as questões militares e do armamento. Seria bom que os companheiros da LIT lessem os textos de Trotsky como " Espanha, última advertência " entre outros, onde é claramente estabelecida relação entre o armamento e o programa político. Lembremos de alguns trechos:

"[...] Os combatentes revolucionários do exército devem estar plenamente cientes de que estão lutando por sua emancipação completa, e não pela restauração da velha forma (democrática) de funcionamento [...] A vitória é determinada pelas classes e camadas envolvidos na luta [...] o exército revolucionário deve não apenas proclamar, mas realizar imediatamente, nas províncias conquistadas, as medidas mais urgentes da revolução social [...] devem ser expulsos do exército revolucionário impiedosamente os inimigos da revolução socialista ou seja, os exploradores e seus agentes, mesmo se eles estão cobertos com a máscara do "democrata", "republicano" "socialista” ou "anarquista" [...] A estratégia de guerra civil deve combinar as regras da arte militar com as tarefas da revolução social [...] Em outras palavras, a política revolucionária domina a estratégia".

“Armas e apoio material para a resistência”...a serviço da “revolução democrática”

A LIT omite o detalhe de que o imperialismo e várias potências regionais já estão prestando apoio financeiro, formação, provisões, armas e até mesmo voluntários para diferentes frações da resistência. Não só os sauditas e Qatar para diversas milícias fundamentalistas, mas em especial Turquia ao ELS, - enquanto que Obama já decidiu fornecer ajuda "não-letal" para a oposição síria. Em março, os Chefes de Estado e de Governo da Liga Árabe, reunidos em Doha, tinha reafirmado a sua posição de "fornecer os meios de autodefesa, incluindo a militar, para apoiar o povo sírio e do Exército Livre da Síria (ESL)" .

Por sua parte, a União Europeia decidiu acabar com o embargo de armas ã oposição síria em 27 de maio. Tampouco são escassas as medidas de pressão econômica tomadas pelo imperialismo. Por agora, o imperialismo não fornece armas pesadas, como parte de seu cálculo para manipular guerra civil dentro de certos limites, para desgastar Al Assad e buscar uma solução negociada, mas impedindo de atingir um colapso do Exército e da desintegração do Estado sírio (o medo de um cenário iraquiano). Mais uma vez, nada a ver com o embargo de armas imposto pelas potências "democráticas" na Espanha que só afetou a República, pois se tratava de afogar as massas em armas para impedir o triunfo da revolução.

Acumulando citações sobre política militar e sua implementação na guerra civil espanhola, a LIT-QI tenta encontrar um ponto de apoio na tradição do trotskismo, mas sem alterar o conteúdo do oportunismo político de sua oposição. Em sua extensa nota de 14/10 colocam que: "Como em qualquer guerra, e, especialmente, nestas condições, o problema das aramas torna-se vital, para ganhar ou perder a guerra, ou o que é o mesmo para a vitória ou derrota da revolução síria ". Mas o programa que defendem para a guerra civil é puramente democrática, alinhada com sua visão semi-etapista de que a primeira tarefa corresponde a derrubar a ditadura para conseguir uma "revolução política" no regime.

Em sua declaração do dia 27/09 resumem como segue: autodeterminação para os curdos, "o princípio da soberania nacional, sem entregar seus recursos para as multinacionais imperialistas para continuar o saque da Síria", "um lugar em pé de igualdade com os homens para as mulheres”, e que seja "uma Assembleia Constituinte, livre e soberana para decidir o futuro da Síria?" [23] Desta forma, separam consignas democráticas destinadas a derrubar a ditadura, das tarefas sociais, sem as quais não se pode falar do triunfo revolucionário. Tanto é assim, que nem se preocupam com que programa econômico, social, político a oposição armada deve aplicar nas "zonas libertadas". O programa não precisa ser defendido nem sequer nas zonas que estão fora do controle da ditadura!

O programa e a estratégia dos trotskistas

Esse corte do programa estritamente democrático, separando mecanicamente as tarefas da revolução social (e, assim, fazendo uma concessão séria à lógica reformista de "ganhar a guerra em primeiro lugar, e em seguida, fazer as mudanças econômicas e sociais"), rompe com os ensinamentos fundamentais da Trotsky.

Nós sempre fomos, desde o início do processo, e estamos a favor da queda de ditadores e governos odiados pelas massas (ver www.ft-ci.org todas as nossas declarações), embora a LIT-QI para se localizar queira nos emparentar com o chavismo e seus amigos ditadores stalinistas. Nossas diferenças não estão lá, mas no que não vamos nos cansamos de apontar para LIT: lutar e apoiar a luta contra os ditadores, mas com uma política independente da classe trabalhadora. Novamente, a LIT-QI reduz e limita a luta para conseguir o colapso desses regimes sob qualquer direção e por trás de uma consigna de mobilização de "Abaixo o ditador", desvinculada de um programa de transição para aprofundar a dinâmica da revolução social.

Na Síria, um programa de ação para a derrubada revolucionária da ditadura de Al Assad deve combinar as demandas imediatas das massas, para atender a ruína econômica urgente e catástrofe social, com as medidas transitórias, como a expropriação sob controle trabalhadores das fábricas, bancos e grandes corporações, a reversão das privatizações feitas pelo regime, a distribuição de terras entre os camponeses pobres, e a ruptura com o imperialismo. As tarefas da guerra devem ser articuladas na mesma lógica de transição para desenvolver o levantamento das massas, em contraste com a lógica do aparato de militarização burguesa das facções do ESL e vários setores islà¢micos. Especificamente aspectos militares do programa deve ser estreitamente ligados ã grande tarefa estratégica de por em pé organismos de auto-organização das massas em luta, na perspectiva do poder dos trabalhadores e do povo.

Consignas democráticas radicais como pode ser a de impor uma Assembleia Constituinte revolucionária em a base da derrota de Al Assad e a demolição do regime e suas instituições, têm de ligar-se a resposta de quem poderia garantir uma Assembleia assim. Para nós, só um governo operário e camponês e das organizações de massas construídas na luta. Colocar hoje aos trabalhadores essa perspectiva também é essencial para combater a tentativa da cúpula dos ELS de apresentar-se como representante natural e legítimo das massas sírias, ou então os islamitas duros, ou ainda os CNFORS.

Finalmente, as tarefas na Síria não podem ser separados das tarefas internacionais contra o imperialismo e o seu agente israelense, pela unidade das massas árabes contra os governos que desejam sufocar o processo aberto pela "Primavera Árabe", e uma Federação Repúblicas Socialistas do Oriente Médio. É baseado em um programa, especificados de acordo com os termos precisos da situação, que a vanguarda da Síria poderia avançar para a construção de uma direção revolucionária.
Conclusões

As verdadeiras conclusões são opostas ás extraídas oir Ronald Leon:

1 - "Trotsky estava pela vitória militar dos republicanos contra o fascismo", mas não por usar a necessidade de vencer o Franco para contrabandear política semietapista da revolução democrática, com um programa mínimo democrático, mas sim com um programa de ação revolucionária, que incluía partir de demandas democráticas contra o fascismo, as tarefas democráticas estruturais no chamado aos camponeses para tomar a terra, com as demandas sociais, como a expropriação de fábricas sob controle dos trabalhadores, mas também por uma organização independente, os soviets na versão espanhola, as juntas para incentivar o desenvolvimento da dualidade de poder, que, em seguida, formam a base do futuro Estado dos trabalhadores, na perspectiva do poder dos trabalhadores e dos camponeses, sem o qual não se poderia ganhar a guerra.

2 - Trotsky estava a favor do envio de armas e ajuda aos sindicatos espanhóis, porque eram organizações da classe, mesmo as de liderança reformista. Trotsky subordina o problema das armas, outros assuntos da tática ã política de classe, revolucionária. A LIT-QI que em nada considera o caráter de classe do ELS, utiliza a consiga de armas para embelezar e "esquerdizar" sua política de revolução democrática na Síria.

3 - A LIT-QI quer casar a FT, em primeiro lugar, com Castro e Chávez, pelo suposto apoio a Assad, e depois com a ultra-esquerda porque teríamos uma política de abstenção. Na realidade, o contraste entre a nossa política e a deles mostra que tudo o que envolve a intervenção de uma estratégia de classe independente é, para a LIT-QI, um pecado.

Por último, não queremos deixar de responder ao ataque nos fazem tratando-nos de caluniadores, covardes e traidores. Dizem: “A discussão com a FT sobre este assunto começa necessariamente por responder uma calúnia” [24] a qual seria que criticamos que sua “política para Síria apaga qualquer delimitação de classe, ao se limitar a adaptar-se acriticamente ao setor opositor hegemonizado pela burguesia”. Temos caracterizado politicamente a linha da LIT-QI na Líbia, Egito e agora Síria, baseando-nos em citações textuais e argumentando nossa caracterização de que segue uma adaptação oportunista e sem delimitação de classe. A LIT-QI em sua polêmica não respondeu essa caracterização senão que a tem aprofundado por seus próprios méritos. O que sim, é uma absurdidade é tentar colocar para nós o mote que “Trotsky atribuía apenas aos covardes e traidores”, tentativa que recorda os métodos stalinistas para afogar a crítica trotskista, desqualificar a FT e cortar a discussão junto aos seus militantes.

Nós seguiremos insistindo: não há outra forma de satisfazer as demandas profundas das massas e resolver íntegra e efetivamente as tarefas democráticas e de libertação nacional sem a tomada do poder pela classe trabalhadora, com a aliança camponesa e popular. Pelo contrário, a política da LIT-QI na Síria e no processo da primavera árabe a localiza como seguidista da oposição burguesa, e no intrincado cenário sírio, se enrola cada dia mais.

 

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