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Derrotar o novo governo e seus ajustes nas ruas, nos centros de pesquisa e empresas
17 Nov 2011 | No último dia 20 de novembro ocorriam as eleições gerais que marcavam uma nova alternativa entre um Governo do PSOE e outro do PP.

Por Santiago Lupe, Classe contra Classe (Estado Espanhol)

No último dia 20 de novembro ocorriam as eleições gerais que marcavam uma nova alternativa entre um Governo do PSOE e outro do PP. O Regime recorre ao jogo eleitoral – desta vez antecipado – para impor um novo Governo do PP menos desgastado, forte, com um poder quase abrangente sobre todas as instituições (Parlamento, Justiça, Comunidades Autônomas, principais cidades...) para fazer passar o grosso do ajuste pendente sobre os trabalhadores e setores populares. O 20N de 2011 marca o início da retomada da ofensiva para nos fazer pagar sua crise na forma de maior desemprego de massas, liquidação de direitos e conquistas, rebaixamento brutal de salários e eliminação de boa parte do que resta do Estado do bem estar social. Os últimos acontecimentos na Grécia e Itália – com os putchs dos mercados, a UE e “Merkozy” para impor tecnocratas como primeiros-ministros – demonstram que, ganhe quem ganhe domingo, a agenda de deveres do próximo Governo já está escrita de antemão. Planos que por outro lado são os mesmos que exige também a patronal e os bancos espanhóis.

A perna esquerda do Regime se quebra

José Luis Rodríguez Zapatero chegou a Moncloa em 2004 com o principal objetivo de devolver a calma, terminar com as potentes mobilizações que haviam ameaçado ao último Governo de Aznar. As manifestações estudantis contra a LOU, a Greve Geral contra o “Decretazo”, as manifestações contra a catástrofe do Prestige e, acima de tudo, as massivas mobilizações contra a guerra do Iraque, estas foram as “metas para vencer” no primeiro mandato. Tentaram – com uma “mudança tranquila”, com algumas concessões como a retirada do Iraque ou o matrimônio entre homossexuais – que não se repetissem e alcançassem, assim, devolver uma paz social para que os capitalistas pudessem seguir aproveitando a prosperidade econômica. Como a precariedade seguiu se estendendo, a habitação tornou-se um luxo e serviços públicos seguiram sendo degradados e privatizados.

Em seu segundo mandato, o PSOE aumentou sua ofensiva. No calor da crise capitalista que se iniciou em 2007, e especialmente em setembro de 2008, este partido tem sido responsável de levar adiante todas as orientações da patronal e dos bancos. Desde os resgates milionários aos bancos, até os ajustes mais duros desde a Ditadura contra os trabalhadores e setores populares. Finalmente tudo isso tornou o seu projeto de lei. Mais de 4 milhões de votantes do PSOE o abandonaram. Quase um milhão e meio se abstiveram, votou nulo ou branco. E quase outro tanto apoiou formações políticas com um discurso mais de esquerda, sobretudo a IU de Cayo Lara. Dos quase 7 milhões que votaram são muitos os que fizeram com “de cara virada”, devido ao rechaço ainda maior que lhes representam a “alternativa” de Mariano Rajoy.

O fato é que para centenas de milhares de jovens e trabalhadores o PSOE deixou de ser uma opção em que viam seus interesses representados. Isto não poderia ter sido evitado pelo discurso de “volta ã socialdemocracia” da Rubalcaba, nem sequer pela denúncia dos cortes de CiU que demagogicamente agitava o PSC de Chacón, sem nenhum crédito ã essa altura. Um dos enganos mais duráveis, que o PSOE era um partido de “esquerda”, que “defende o trabalhador”, que “aplica uma política muito diferente do PP”, que “não é o mesmo”... está em questão para muitos. E isto é um problema não somente para o PSOE, mas para o próprio regime. Desde o ABC até El País compartilham da necessidade de que o PSOE se regenere, se renove... quer dizer, se recomponha do desgaste a que se levou Zapatero (o maior desde a transição) para poder seguir cumprindo o espaço de “desvio eleitoral” no futuro. O Congresso convocado para fevereiro buscará isso, também a “aterrissagem” dos quadros do PSOE nos movimentos sociais para supostamente lutar contra as mesmas políticas que eles próprios têm aplicado. Todos os lutadores devem denunciar e combater estas manobras para desmascará-los e evitar que o PSOE volte a recompor sua falsa imagem de “esquerda”. Com um horizonte carregado de brutais ataques contra os trabalhadores e a possibilidade de que a crise social e política se recrudesça, o possibilidade de que o PSOE não consiga atuar como em 2004 pode se considerar como um grave problema para esta “democracia” dos ricos.

A direita se reforça e se prepara para redobrar a ofensiva

A vitória do PP é, sobretudo, fruto do debate do PSOE, pois seu número de votos apenas subiu em 650.000. Se manteve praticamente em sua margem de votos histórica, com cerca de 11 milhões de votantes. Algo igualmente preocupante porque mostra a força e o apoio social mantidas pelos herdeiros diretos do franquismo.

Além de um bom número de patrões, banqueiros e altos profissionais, são também os setores da classe média, autônomos e inclusive trabalhadores que veem no ultra-neoliberalismo econômico, a demagogia anti-imigrante, anti-sindicatos, a volta ás obscuras tradições católicas... uma “alternativa”, buscando algo diferente aos terríveis ajustes aplicados pelos social-liberais do PSOE, acreditando que o PP trará algo melhor do que ZP.

No dia seguinte de sua vitória recebeu instrução de Merkel por telefone, e os “mercados” mantiveram nota de risco alta – por cima dos 460 pontos – para deixar claro que não vão deixar que se “descanse sobre os louros”. Os editoriais da maioria dos jornais pedem que se anuncie já o programa de ajuste que durante toda a campanha se manteve oculto, que democrático! Sáez de Santamaría e Arias Cañete pedem que se acelere – incluindo passando por cima dos trâmites constitucionais – a formação de um novo Governo. Outros falam para que se forme uma unidade provisória do PP-PSOE...

Comece quando começar, o que está claro é que o PP vai se utilizar de seu “mar azul” para fazernos tragar os maiores ataques da história recente de nosso país. Seu controle do Executivo, Legislativo e Judicial – tem que renovar o Constitucional e o Conselho do Poder Judicial –, 15 das 17 comunidades autônomas – em todas governa, co-governa ou é um apoio chave, salvo em Andalúcia, que tem eleições em março, e em Cataluña, onde querem chegar a um pacto com a CiU –, os principais municípios e conselhos... lhes dá todas as ferramentas necessárias para levar adiante um Governo firme.

Apesar deste controle quase absoluto do aparato estatal, há aluns elementos que podem levar a que o Governo de Rajov enfrente uma piora na crise no regime. As eleições também significaram um fortalecimento significativo do nacionalismo basco, com a irrupção de AMIUR e a manutenção do PNV (somam 52% dos votos no País Basco e 26% em Navarra). Na Cataluña CiU se reforça em base a um discurso mais independentista, incorporando a reivindicação fiscal. As disputas entre as distintas alas da burguesia para a crise fiscal, como dividir os ajustes, como redefinir o “Estado das autonomias”... o PP quer resolver com mais centralisação. Além da “gestão” do fim do ETA se tornar complicada pela promessa de “não negociar com terroristas”, não ceder sobre assuntos penintenciários e nem ã pressão dos setores ultras. Ou seja, todo um coquetel explosivo que fará com que o PP, se medir a aritmética parlamentar, termine acirrando muito mais os choques e as crises por cima.

Frente uma maior polarização social

Na Cataluña a direita se mantêm e cresce, ainda que permanece dividida entre o PP, que subiu 100.000 votos, CiU com 235.000 mais e a ultra Plataforma pela Cataluña que repete os 60.000 alcançados nas municipais. Em Madrid e Valencia é igualmente preocupante a situação do PP e o grande crescimento da españolista UpyD, que já é a terceira força da capital, com 346.000 votos. Levando em conta que é na Cataluña e em Madrid onde mais ofensivamente estão se dando os ataques ã educação e saúde, além das maiores respostas, avançando na polarização que vamos ver nos próximos meses, com uma direita ofensiva, que golpeia e prepara uma base social reacionária para lhe apoiar, além das crescentes lutas da juventude e dos trabalhadores.

Esta polarização vai se dando quantitativa e qualitativamente, pois o espirito de vitória da direita sem dúvida animará parte do seu eleitorado mais militante para se organizar e começar a se mobilizar. Seja em defesa de seu governo, ou seja em defesa para exigir que vá até o final com sua política reacionária, especialmente em questões como o direito ao aborto, os matrimônios homossexuais, liquidar direitos sindicais, manter a política penitenciária contra os presos políticos bascos... a ala ultra do PP e todo o lobby midiático do “TDT Party” (Intereconomía, COPE, La Gaceta, La Razón, Veo Tv...) serão um sujeito animador de tudo isso.

Com este respaldo eleitoral e social Rajov se prepara para passar ã ofensiva o quanto antes. Enquanto na esquerda, a debaclê “socialista” tem se expressado no crescimento que tem tido outras formações que falam desde a “esquerda do PSOE”. Isso é expressão de uma inicial polarização pela esquerda para centenas de milhares de trabalhadores e jovens que buscam opções que consideram mais radicais. O aumento do voto nulo e branco no Senado – que tem passado de 1.100.000 a 2.176.000 – é também parte desta tendência, muitos tem optado por esse voto de protesto contra o regime nesta instituição reacionária e carente de conteúdo.

Esse é o caso de IU e EQUO – os antigos “ecossocialista” de IU – que somados alcançaram um milhão de votos a mais que 2008. Ainda que estejam longe dos quase três milhões que chegou a obter a IU de Julio Anguita, trata-se de um crescimento muito notável. Não tiveram a mesma sorte os nacionalistas de esquerda gallegos (BNG) e catalàes (ERC) que seguem descontando adeptos. Tanto uns como outros tem sido nos últimos anos sócios menores do PSOE. Tanto como suporte parlamentar de Zapatero na primeira legislatura, tanto co-governando com este partido numerosas cidades, Galicia, Baleares ou Cataluña. Todos eles contam com um sinistro histórico como gestores “de esquerda” das políticas da patronal e bancários. A mesma IU, junto a seus sócios catalàes da Iniciativa pela Cataluña, foi a responsável dos Mossos d’Escuadra durante o Tripartite, contando entre seus “méritos” a brutal repressão ao movimento estudantil anti-Bolonha em 2008. Devemos contar que esses partidos possam esquerdizar seus discursos tanto quanto queiram, com a única intenção de repetir o gesto que já realizaram nos anos 70, quando desviaram todas as lutas operárias e populares contra a ditadura ã armadilha da transição, a madrinha do atual regime.

O avanço de AMAIUR é ainda mais importante, chegando a ser a segunda força no País Basco (284.000) e a primeira em deputados (6), porém longe de constituir uma força que vá apostar na derrubada do regime de 78 – o mesmo que nega o direito de autodeterminação ao povo basco – este projeto é parte do giro até posições de integração ao regime que a esquerda abertamente vem protagonizando. Além disso sua estratégia de unidade com a burguesia basca – materializada nos chamados ao PNV para apresentar-se juntos, ou na presença de EA – até que não possa significar nenhuma alternativa para os trabalhadores.

Desde o Classe contra Classe estamos longe de considerar o fortalecimento eleitoral destes partidos como uma boa notícia, como veem os outros grupos da extrema esquerda, como o En Lucha ou Izquierda Anticapitalista [1]. A reedição ou recomposição destas formações reformistas e gestoras do capitalismo dificulta para que os trabalhadores e a juventude possam descartar estas estratégias que nos levaram de mal a pior ao longo da história. Frente a todos estes projetos que apostam pela reforma, a conciliação de classes e a integração ao Regime, acreditamos que podemos avançar em construir uma alternativa revolucionária dos trabalhadores para terminar com o Regime de ‘78 e o regime capitalista. Os mesmos grupos da extrema esquerda que se alegram destes bons resultados – e inclusive chamam para votar neles, mesmo onde não estão representados – conformaram para o 20N uma candidatura cujo programa estava longe de combater o capitalismo, a propriedade privada dos meios de produção e propor uma via revolucionária para liquidar o Regime herdado por Franco [2]. O rebaixamento deste programa faz coro com o balanço e as expectativas que dele se desprende, de poder unificar tudo o que está a esquerda do PSOE. O dirigente da Izquierda Anticapitalista, Miguel Romero, ao avaliar os resultados da candidatura “Anticapitalista” disse: “Os resultados me parecem maus. Não importa que fossem mais ou menos previsíveis. Mostra a Anticapitalista muito por baixo do que significam e o que fazem no dia a dia. Não nos situa num bom lugar para o trabalho imediato em alguns temas políticos centrais como, por exemplo, a convergência da esquerda do PSOE”. [3]

O futuro do Governo Rajoy e seus planos se decidirá na rua

Estas contradições por cima se acirram mais conforme a pressão por baixo aumenta. Para poder passar o grosso do ajuste que se quer impor a burguesia terá que liquidar e derrotar as fortes lutas dos trabalhadores e do povo, e isso não será uma tarefa fácil. A paz social que Zapatero implementou foi mortalmente ferida no dia 15 de maio. A explosão de milhares de jovens indignados tem animado muitos outros setores sociais a se organizarem e agirem. Estamos vendo nos bairros, com o movimento contra os despejos, ou mais recentemente na universidade e institutos, com uma recuperação do movimento estudantil com assembleias, ocupações, greves, manifestações... No movimento operário os trabalhadores da educação e da saúde já estão saindo ás ruas. Os professores das escolas de Madri, Castilla la Mancha, Navarra e Galicia, a saúde català e canária, o PDI e PAS da UAB e outras universidades catalanas... No entanto, este mal-estar não tem chegado ao conjunto da classe trabalhadora e da juventude, porém sua extensão é muito provável frente aos ataques que Rajoy promete lançar, eliminando inclusive a burocracia sindical, que pode se ver forçada a chamar a mobilização. Cospedal já se lamentava de que o PP ia ter que enfrentar mobilizações contra suas receitas, e seguramente não lhe faltava razão.

É necessário começar a se organizar em todos os centros de estudos e trabalho. Devemos exigir ás direções sindicais, tanto dos majoritários como da esquerda sindical, que comecem a chamar assembléias nas empresas e polígonos para discutir como vamos nos preparar, que plano de luta colocaremos de pé antes que seja demasiado tarde. Nas universidades devemos estender e massificar o processo que se abriu e que teve como ato mais importante a jornada de greve de 17N. O movimento 15M deve buscar confluir com os trabalhadores e os estudantes para enfrentar Rajoy e as Comunidades Autônomas.

Queremos derrotar os planos de ajuste, o Governo do PP e o mesmo Regime de ‘78. Devemos nos preparar para combates históricos, eles estão fazendo isso. O aumento da repressão que estamos vendo em forma de detenções, processos e multas, é só um aperitivo. Como exemplo, o economista burguês Bernard Connolly, do The New York Times, reconhece que “a atual política européia acabará provocando mal-estar social E não devemos esquecer que nesses países (Grécia, Irlanda, Portugal e Espanha) passaram guerras civis, ditaduras fascistas e revoluções. Esse é o futuro se esta loucura maligna da união monetária prosseguir”.

Assim que tomarmos cada combate adiante, devemos os assumir como uma escola de guerra, onde a juventude e os trabalhadores devem colocar de pé organismos de auto-organização, construindo alianças entre os distintos setores de trabalhadores, com estudantes, com outros setores populares... deve-se colocar de pé um contundente movimento, dirigido e controlado desde a base, até derrotar os ajustes e impor uma saída operária ã crise. Um programa que reparta as horas de trabalho sem redução salarial, nacionalize sem indenização e colocar sob controle operário os bancos, as principais empresas do país e todas aquelas que fecharem ou demitirem, garantir educação e saúde gratuita, pública, de qualidade, sob controle e a serviço dos trabalhadores e do povo, que resolva todas as demandas democráticas estruturais pendentes como o direito de autodeterminação e o fim da Monarquia...

Para que isso possa ser levado até o fim, ao calor deste processo de luta devemos construir um partido de trabalhadores revolucionário, com uma estratégia baseada nas melhores experiências de luta revolucionária de nossa classe, como a revolução espanhola ou as lutas dos anos ‘70. Um partido que combata os desvios que seguramente tentará nos colar a burguesia, que esquive a Frente Popular ou outra Transição, como defendem alguns setores do Regime. Em definitivo, um partido que lute por uma verdadeira alternativa revolucionária, que a defenda entre os lutadores que venham a surgir nos centros de trabalho e estudo, que lute abertamente por terminar com o Governo dos capitalistas e seus lacaios, e que lute para impor um Governo dos trabalhadores e do povo.


[1] Ver “Tras el triunfo del PP en las elecciones, la lucha sigue en la calle” em www.enlucha.org/site/?q=node/16636 e “Tras el 20-N: Desobedecer la mayoría absoluta del PP” em http://anticapitalistas.org/Tras-el-20-N-Desobedecer-la,26138

[2] Ver “Un debate sobre el programa de la candidatura “Anticapitalistas” em www.clasecontraclase.org/spip.php?article752

[3] Ver “Invasión interna” em http://anticapitalistas.org/Invasion-interna

17-11-2011

 

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