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Do nacionalismo ao pró-imperialismo
por : Miguel Raider

17 Feb 2011 | Como é possível que as mesmas massas que se propõe derrubar Hosni Mubarak depositem ilusões no Exército egípcio, o principal pilar sobre o qual se sustenta esse regime autocrático?

Do nacionalismo ao pró-imperialismo

Como é possível que as mesmas massas que se propõe derrubar Hosni Mubarak depositem ilusões no Exército egípcio, o principal pilar sobre o qual se sustenta esse regime autocrático? Por seu papel na história não pode deixar de se apreciar a relevância dessa instituição reacionária que hoje aparece como um árbitro entre as massas e Mubarak. Desde princípios do sécula XVI o Egito foi incorporado ao Império Otomano, ainda que em 1525 adquiriu o status de estado autônomo. O sultanato monopolizava a propriedade da terra associado ã elite local, que desempenhava funções hierárquica no governo e na administração civil. Nas primeiras décadas do século XIX, o governador Mohamed Alí propiciou uma série de reformas para incentivar o desenvolvimento capitalista. Introduziu-se o cultivo de algodão, um dos principais ramos da atividade econômica até a atualidade, com a finalidade de exportar a matéria prima para a punjante indústria têxtil da Inglaterra. Desse modo, a elite local de latifundiários se transformou em burguesia agrária como sócia menor do capital estrangeiro desde sua própria gênese, uma relação consumada mediantes o tratado de livre comércio como a Grã Bretanha de 1838.

Frente ao declínio do Império Otomano, França e Inglaterra dividiram suas zonas de influência no Oriente Médio com o tratado de Sykes-Picot de 1915. Os laços entre a elite local e o imperialismo britânico se consolidaram no regime monárquico de Ismail Pasha. Egito passou a ser uma colônia saturade de mercadorias britânicas, com uma burguesia nativa extremamente débil frente ã classe trabalhadora que começava a se desenvolver nos principais centros urbanos.

O debilitamento da Inglaterra e da França depois da saída da Segunda Guerra Mundial deu ponto pé aos processo de descolonização na África e Ásia com a emergência de movimentos nacionalistas de massas. No Egito, a debilidade da burguesia nativa foi suprida pelo Exército, de onde sairam os principais dirigentes, completados pelo Movimento de Oficiais Livres liderado pelo general Gamal Abdel Nasser, que depuseram a monarquia do rei Faruk em 1952 e impuseram um regime bonapartista, ou seja, assentado sobre as Forças Armadas. Desde então, o Exército se converteu em um viveiro de quadros que proporcionou os sucessivos presidentes, governadores, administradores das empresas públicas, as figuras mais proeminentes do regime, assim como os quadros da Mukhabarat, a temível polícia secreta, similar ã Savak do extinto Sha Reza Pahlevi. Seu peso se expressa no controle das velhas empresas nacionalizadas que representam entre 30 e 40% da atividade econômica. Assim o Exército se converteu na via régia para a mobilização social dos filhos das classes médias baixas e o campesinato que ascenderam ã vida política nacional.

Enfrentando com os debilitamentos imperialistas inglês e francês, Nasser se apoiava sobre a mobilização controlada das massas operárias e camponesas e a crescente influência do imperialismo norteamericano (ainda que mais tarde tenha girado em direção ã burocracia da URSS).

Depois da estatização de importantes setores da economia, a nacionalização do Canal de Suez despertou grande simpatia, sobretudo ante a reação do Estado de Israel, quem operou como porta-voz dos proprietários do canal, França e Inglaterra, mobilizando tropas ás ruas de El Cairo.

A constituição da República Árabe Unida entre Egito e Síria foi a expressão pan-árabe do nacionalismo desses dias que regateava a distribuição da renda nacional com o imperialismo.

Camp David, um salto qualitativo

A partir da Guerra dos Seis Dias, a derrota militar mais humilhante proporcionada aos países árabes pelo Estado sionista, o Exército nacionalista egípcio começou a tomar outro rumo. Ainda que frente ã Guerra de Yom Kipur em 1973, o Exército egípcio recuperou o orgulho nacional, terminou se subordinando junto ã Síria aos ditados dos EUA e da burocracia da URSS, que salvaram o Estado judáico da ofensiva militar surpresa. Mas em 1978 se produziu um salto qualitativo, quando o general Anwar o Sadat e o primeiro ministro Menajem Begin celebraram o acordo de Camp David, o primeiro acordo de paz estabelecido entre um país árabe e o Estado de Israel, que mereceu a expulsão do Egito da Liga Árabe, e que compensou a perda do pró-imperialista regime do Sha, frente ã revolução iraniana de 1979.

Desde a capitulação de Camp David, o Estado de Israel obteve uma relativa estabilidade: o controle da fronteira sul da Faixa de Gaza passou a domínios do Exército egípcio, que cercou o passo de Rafah, fechando o cerco sobre o povo palestino, tal como fez a fins de 2008 quando os sionistas descarregaram o massacre da operação Plomo Fundido.

Como resposta a Camp David, Sadat foi assassinado em 1981 por um grupo de oficiais influídos pelas idéias islà¢micas da Jamaa Islamiya, que mais tarde foram executados. A ascensão do então general de brigada Mubarak, “herói” de guerra em 1973, começou com uma corrida para manter a unidade do Exército, enquanto se aprofundava o curso pró-imperialista empreendido por Sadat. Agitando o fantasma dos movimentos islà¢micos, estabeleceu a lei de emergência que concedeu poderes extraordinários ao Exército e a Mukhabarat para realizar prisões arbitrárias, enquanto introduzia as reformas neoliberais e as privatizações do Consenso de Washington.

Financiado com U$1,5 bilhões anuais das arcas norteamericanas, o Exército acordou com o ex-presidente Bush um tratado mediante o qual todo suspeito de “terrorismo” podia ser transferido para o Egito para ser interrogado pelas unidades especializadas em técnicas de tortura. O caso mais famoso foi o de Ibn ao Shayks al Libi, que confessou sua suposta atividade na Al Qaeda e sua conexão com o regime de Saddan Hussein, testimunho do qual se valeu Bush para lançar a invasão do Iraque em 2003. Ainda em seu período nacionalista, o Exército, dado seu caráter burguês, foi incapaz de fazer efetiva a independência nacional e a reforma agrária, duas tarefas democráticas impressindíveis para remover desde os alicerces do atraso estrutural desse país. Reconvertido ás necessidades do capital estrangeiro, o Exército atacou o movimento de massas, restringindo as liberdades democráticas mais elementares, retirando os direitos de organização sindical e política.

Da classe trabalhadora auto-organizada depende uma saída superadora para fazer efetivas as justas aspirações democráticas, pelo pão e pelo trabalho.

 

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