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Entre a mobilização popular e a armadilha do “diálogo”: abaixo Mubarak e o regime da ditadura!
por : Eduardo Molina

24 Feb 2011 | O início das negociações com algumas mesquinhas ofertas de “abertura” da parte do governo e Mubarak e Suleiman não acabou com os protestos.

O início das negociações com algumas mesquinhas ofertas de “abertura” da parte do governo e Mubarak e Suleiman não acabou com os protestos.

Na terça-feira, 8/2, centenas de milhares de manifestantes se concentraram no Cairo e em outras cidades, desde Alexandria a Asuán gritando “Fora Mubarak!”, enquanto os trabalhadores de várias empresas e fábricas, entre eles os do estratégico canal de Suez, entravam em greve e em alguns lugares aconteceram confrontos com a polícia, deixando ao menos 5 mortos. É a terceira semana de mobilizações que, sacode as estruturas do Egito, que abriu um processo revolucionário de grande alcance. Com o impulso desta primeira fase, em que pese o custo de ao menos 300 mortos, 1500 feridos e milhares de presos ou vítimas pela repressão sangrenta, as massas romperam o estado de emergência e colocaram contra as cordas o governo do velho ditador. Mas depois da grande concentração no dia 4/2, chamada de “dia da despedida”, Mubarak não renunciou, produzindo um momento de impasse que a camarilha governante tenta utilizar a seu favor com o respaldo do imperialismo, o alto comando militar e a alta burguesia egípcia.

O governo Mubarak-Suleiman e a armadilha do diálogo

Formou-se de fato um novo governo. O velho ditador mantém a presidência, mas sem concentrar pessoalmente a soma absoluta do poder, renunciando a reeleição e aos seus sonhos “dinásticos”. O recém-nomeado vice-presidente Suleiman, que dirigiu o serviço secreto, tem laços estreitos com o imperialismo e parece contar com o apoio dos principais chefes militares, é quem assume o papel ativo, rodeado de um novo gabinete, para propor um “diálogo” com a oposição, tentando assim ganhar tempo, esperar o desgaste da mobilização e se recompor, o que permitiria impor uma solução claramente continuista.

Desde domingo, 4/2, Suleiman começou a montar um cenário de negociações com a oposição. Como parte destas manobras, na segunda-feira um novo gabinete começou a funcionar e tentou sinalizar o começo do “retorno ã normalidade”, com a reabertura parcial do sistema bancário depois de 9 dias fechado e outras medidas similares.

Mas o “diálogo” mostrou a mesquinhez das concessões, tardias e insuficientes a esta altura do processo como parte de uma tentativa para enganar as massas e que a oposição, apesar de sua vontade conciliadora, não pôde aceitar.

Suleiman pretende que “se fixe um claro calendário para levar a cabo uma pacífica e organizada transição de poder” e que o ditador “assinou um decreto que irá formar uma comissão cujo objetivo será reformar ã Constituição”, mas não renunciou, não suprimiu a Lei de Emergência, em vigor desde 1981, nem dissolveu o Parlamento oficialista que foi composto a partir das eleições passadas fraudulentas.

A oposição deu margem de manobra ao governo

Ainda que tenha rechaçado até agora os termos de Suleiman, a oposição outorgou “credibilidade”, participando do diálogo, no momento de extrema debilidade de Mubarak, semeando ilusões desmobilizadoras entre as massas. El Baradei, que ganhou popularidade nos setores médios e de quem o imperialismo reconheceu os bons serviços prestados, busca uma “democratização” moderada.

A Irmandade Mulçumana é a corrente política opositora mais importante e com ampla base social. No entanto, é uma corrente islà¢mica “moderada” que inclui setores burgueses e seus líderes se mostram cada vez mais conciliadores com o imperialismo, afirmando que “nenhuma mudança no Egito deve ser radical no que diz respeito ao vínculo que atualmente o país construiu com seus sócios (...). Eles temem que uma mudança no governo não respeite a paz com Israel. Tudo isso é um erro. Claro que se respeitará a paz com Israel e se seguirá apostando nas relações com os parceiros internacionais do Egito” (Página/12, 8/2).

É que os partidos opositores queriam negociar uma “transição” aceitável com o menor “caos” possível nas ruas e temem que a queda do ditador sob o embate com as massas torne o processo revolucionário incontrolável.

Por outro lado, existem outros agrupamentos, como o “6 de abril”, que reúne sindicatos, movimentos sociais e grupos diversos sob a bandeira de “Fora Mubarak” e vem cumprindo um papel importante nos protestos. Levantam posições mais ã esquerda, mas não parecem ter uma política alternativa concreta para que o desenvolvimento da mobilização possa dar um salto, derrubar Mubarak e o regime.

Rumo a jornadas decisivas?

Ainda assim parece difícil que a equação Mubarak-Suleiman-Alto Comando do Exército, em que pese o respaldo imperialista e da grande burguesia, possa descomprimir a situação com suas manobras ou conseguir comprometer o apoio da oposição com um plano basicamente continuista, cujas medidas são muito miseráveis e tardias para acalmar as massas em ebulição.

O governo começou a endurecer seus gestos, Mubarak ameaçou com a “intervenção militar” e poderia tentar novas ações repressivas. Mas passar das ameaças aos fatos significa recorrer aos militares para reprimir e arriscar-se em um enfrentamento aberto com as massas pelo controle das ruas, praças e pontes. Até agora, o Exército, pilar chave do regime, cujo papel será essencial para qualquer plano de transição, posicionou tropas e tanques nas ruas, mas sem reprimir. Com isso busca preservar-se para cumprir o papel de grande árbitro nacional e com a garantia da ordem burguesa, bem como evitar os riscos de uma divisão ao enfrentar-se com os trabalhadores e o povo. A política de Mubarak-Suleiman leva a um teste de forças com o movimento de massas, que colocará ã prova todos os atores, mas a correlação de forças não lhe é favorável, e é possível que nestas circunstâncias nem o conjunto de todos os militares, nem o imperialismo – cuja política principal é a das reformas para uma “transição ordenada” – estejam dispostos a acompanhá-los até o final no que poderia converter-se em um “contra-golpe” de conseqüências imprevisíveis. Robert Gates, chefe do Pentágono, acaba de elogiar o papel do exército egípcio nos protestos como “exemplar” em sua “contenção” e ratificou o pedido de uma “transição democrática” em consonância com a insistência de Obama.

É possível que se estejam gestando jornadas decisivas para o desenvolvimento do processo revolucionário no Egito, o que coloca na ordem do dia a encruzilhada entre a necessidade de dar um salto nos métodos, objetivos e organização da luta, para forçar a queda de Mubarak e neutralizar ou dividir o Exército e o perigo de que a camarilha governante, a burguesia e o imperialismo consigam recompor a frente burguesa e avançar em uma “transição” ordenada, seja nas variantes mais continuistas e repressivas, seja em um plano de “contra-revolução democrática” com maior dose de concessão e engano, cujo objetivo não será se não estrangular o processo revolucionário.

A resposta operária e popular

As imensas concentrações e marchas do dia 8/2 deixaram claro o rechaço popular ã permanência de Mubarak e mostraram novas medidas de radicalização não só na marcha até o Parlamento e nas consignas como o julgamento de Mubarak (já não só que deixe o poder), mas também no salto na intervenção operária, alentada pela manobra demagógica do governo de oferecer 15% de aumento salarial aos empregados públicos, o que detonou uma imensa onda de lutas, com paralisações, concentrações e marchas, que exigem equiparação, melhora nas condições de trabalho e contra a precarização, o que foi completamente canalizado pela central oficialista ETUC. Este é um fato de enorme importância. Segundo El País (9/2), “a revolta se ampliou com uma dimensão operária graças ás greves e protestos realizados em várias das maiores empresas privadas do Egito”. A Al Jazeera e outros meios informaram dezenas de paralisações em diversos setores: petroleiros, hospitalares, transporte de passageiros, construção civil, eletricistas, têxteis, ferroviários, químicos ... Mas acima de tudo, a greve de milhares de trabalhadores do Canal do Suez (uma das principais fontes de ingressos do Egito e por onde passam diariamente 2 milhões de barris de petróleo) por melhores salários e condições de trabalho teve um grande impacto.

Da mesma forma a influência dos sindicatos independentes, como o dos trabalhadores dos impostos, está se fortalecendo.

Isso permite extrair três conclusões: 1) as forças das massas estão intactas e dispostas a fazer um esforço superior para derrubar o ditador; 2) a crescente irrupção operária coloca com força o movimento por uma greve geral de massas para dar um salto no processo; e 3) a convergência dos setores avançados dos trabalhadores e da juventude está fortalecendo uma ampla vanguarda e radicalizando suas consignas, em que pese a “moderação” dos partidos opositores.

Fora Mubarak-Suleiman! Não ã armadilha da “transição-democrática”!

O primeiro ponto de um programa para a mobilização que estão reafirmando os setores avançados que é que Mubarak deixe o poder imediatamente. E para isso é preciso rechaçar o “diálogo” com que o ditador e seu sócio mascaram seus planos continuistas, assim como a armadilha de negociações para uma “transição” que só buscaria evitar a queda revolucionária do ditador e amenizaria o máximo possível a situação para salvaguardar os interesses da burguesia egípcia e o imperialismo.

O caminho para que o processo revolucionário avance é colocar em marcha uma verdadeira greve geral política de massas que paralise todo o país. A espontaneidade, energia e entusiasmo das massas necessitam condensar-se mediante a mais ampla auto-organização – comitês em locais de trabalho, bairros populares e lugares de estudo – e sua centralização por cidades e a nível nacional para dar o golpe decisivo ao regime mediante a greve geral, fazer pesar a vontade das massas independente dos partidos burgueses e começar a edificar um contra-poder operário e popular frente ao poder em crise da classe dominante.

Contra toda confiança no papel das Forças Armadas, enfrentar os planos de Mubarak-Suleiman e suas ameaças de repressão é necessária a generalização da auto-defesa das massas até constituir uma rede de milícias operárias e populares, tarefa inseparável do trabalho sobre a base do Exército para isolar a oficialidade moldada pela ditadura e pelo imperialismo e ganhar as tropas, para que se organize e se ligue ã mobilização popular.

Nenhuma variante de “transição” burguesa resolverá as aspirações democráticas profundas do povo egípcio e muito menos as demandas de trabalho, salário, contra a carestia de vida ou ingerência imperialista, que são os motores do levante.

As profundas aspirações democráticas do povo egípcio poderiam expressar-se conquistando sobre as ruínas do regime e suas reacionárias instituições, uma Assembléia Constituinte revolucionária, onde os representantes livremente eleitos das massas possam debater e decidir sobre os grandes problemas do país. Impor um governo provisório das organizações em luta construídas pelos trabalhadores e pelo povo pobre será a garantia que de sua convocatória. A luta nesta perspectiva ajudaria as massas a tirar a conclusão de que deve tomar o poder em suas próprias mãos, pois para conquistar o pão, o trabalho e a liberdade é preciso levar ao final o processo revolucionário.

Uma política assim alentaria o reagrupamento revolucionário da vanguarda no calor da luta, começando a forjar os estados maiores que podem conduzir a combates decisivos para o triunfo da revolução egípcia.

 

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