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O que se negocia em Havana?
por : Eduardo Molina

15 Jul 2010 | No marco da longa greve de fome mantida por Guillermo Fariñas, cujo estado de saúde era crítico, foi anunciado o importante acordo para a libertação de um grupo de presos políticos e o exílio destes na Espanha, enquanto outros 47, parte também dos detidos em 2003, seriam libertados nos próximos meses. Esteban Morales: “A contra-revolução ganha (...)

Moratinos, o Ministro de Relações Exteriores da Espanha se reuniu na Ilha com o chanceler Rodrigues e Raul Castro, além do Arcebispo de Havana. No marco da longa greve de fome mantida por Guillermo Fariñas, cujo estado de saúde era crítico, foi anunciado o importante acordo para a libertação de um grupo de presos políticos e o exílio destes na Espanha, enquanto outros 47, parte também dos detidos em 2003, seriam libertados nos próximos meses.

O objetivo das discussões vai muito além do destino dos presos. “Estou convencido de que as jornadas de visita em Cuba serão positivas, serão bem-sucedidas, tanto para Cuba como para a Espanha, e que logicamente nossos sócios europeus considerarão que foi uma boa visita” e aceitarão normalizar as relações com Cuba, declarou Moratinos (Clarin, 7/07). O que se discute é flexibilizar ou suspender a chamada “posição comum” da União Européia que está a endurecer sua política para Cuba na última década, em troca de concessões substanciais do governo local.

O responsável pela política norte-americana para a América Latina, Arturo Valenzuela, avalizou estas gestões declarando que: “Obviamente nos preocupa muito o fato de que ainda existam em Cuba presos de consciência e por isso qualquer esforço por parte da Igreja ou de outras pessoas, como hoje do ministro espanhol de Exteriores, para conseguir a libertação dos presos encarcerados por suas crenças é um passo adiante (...) Nós, com certeza, estamos preparados para abrir negociações sobre o tema.” (Página 12, 7/07).

Isto reflete um certo giro “para o diálogo” para com o governo Cubano por parte dos EUA e do imperialismo de conjunto. Aproveitam as oportunidades que lhes dá o regime repressivo e de “partido único” imposto pela burocracia para combinar a persistência do bloqueio ianque com uma demagógica e cínica “defesa dos direitos humanos”, como palanque para pressionar por uma maior “abertura política” e acelerar a restauração capitalista.

O Curso da Burocracia

O governo castrista vem encaminhando um processo de “reformas de mercado” e concessões ao capital estrangeiro que aponta ã restauração. Ainda que até agora o ritmo de implementação foi lento, está acelerando a decomposição das bases materiais do Estado Operário deformado que surgiu da revolução de 1959.

A crise internacional afeta fortemente Cuba, com a caída dos preços de níquel, a redução do turismo, etc. O governo responde ã crise aplicando maior pressão sobre os trabalhadores para impor “produtividade” e retirar suas conquistas (como o seguro desemprego ou os restaurantes operários), todo que está gerando um surdo descontentamento popular em uma situação onde a escassez cotidiana contrasta com a prosperidade da burocracia e as capas médias ligadas ao mercado, o turismo e os negócios com o exterior.

A burocracia está fragmentada internamente sobre as formas e ritmos para avançar neste caminho, e suas divisões podem emergir mais abertamente – assim como o descontentamento social – se os Castros deixam a cena, especialmente a emblemática figura de Fidel, pelo que a equipe governante parece apressar-se a buscar nas discussões com o imperialismo algum tipo de pacto: negociar maiores concessões políticas e econômicas em troca de segurança para seus interesses de longo prazo, retendo a maior porção possível de poder político e econômico e garantias ante um eventual revanchismo da burguesia gusana no exílio. Os acordos alcançados com Moratinos podem estar pré-anunciando uma nova etapa nas relações com o imperialismo e são um alerta: os tempos da encruzilhada cubana se encurtam.

Um programa de revolução política para salvar a revolução

O regime da burocracia castrista asfixia a vida política das massas, mas os trabalhadores e camponeses cubanos são os únicos interessados a fundo em salvar as conquistas da revolução e impedir a regressão ao capitalismo e a semi-colonização de Cuba.

Por isso nem apoio ao castrismo que está levando ao desastre, nem ceder ã demagogia imperialista da democracia. Corresponde levantar um programa de revolução política a partir de colocar a defesa das conquistas de 1959 mediante a luta contra o bloqueio e as ameaças imperialistas, contra os privilégios da burocracia e os novos ricos, exigindo a revisão de todo o plano econômico baixo controle dos operários e camponeses, contra a política repressiva e pelas mais amplas liberdades democráticas para as massas, incluindo o direito a criar novos sindicatos independentes do PCC e a expulsar a burocracia das organizações de massas existentes, assim como para todas as tendências políticas que defendam as conquistas da revolução. Aos agentes do imperialismo não se combate afogando a vida política das massas. Basta de repressão arbitrária do regime! Comissões operárias e populares independentes que examinem qualquer causa judicial ou encarceramento por razões políticas. Pela criação de organizações independentes das massas e sua mobilização revolucionária em defesa das conquistas e direitos populares para lutar pela regeneração do Estado operário mediante a derrubada da burocracia e a instauração do poder dos conselhos operários e camponeses.

Esteban Morales: “A contra-revolução ganha posições em certos níveis do Estado e do Governo”

O Dr. Esteban Morales é um conotado pesquisador do Centro de Estudos Hemisféricos e sobre Estados Unidos de Havana, militante do Partido Comunista e relacionado com altos círculos. Foi sancionado depois de publicar sua nota “Corrupção: A verdadeira contra-revolução?” na página web da União de Escritores e Artistas de Cuba (UNEAC). Nesta, Morales afirma que: “Quando observamos detidamente a situação interna posições em certos níveis do Estado e do Governo (...) Sem dúvida, é evidente, de que há gente em posição de governo e estatal, que estão se alavancando financeiramente, para quando a Revolução cair, e outros, que podem ter quase tudo preparado para produzir o traspasso dos bens estatais a mãos privadas, como ocorreu na antiga URSS.”

Ainda que seu artigo não questiona o conjunto da política de “reformas de mercado” e concessões ao capital estrangeiro que a direção castrista vem aplicando desde 1992; aponta a um dos mecanismos fundamentais que motorizam as tendências restauracionistas: a corrupção da burocracia, que hoje está se preparando para reciclar-se como parte de uma futura burguesia.

Sem estar submetida a controle algum pelos trabalhadores, esta casta aproveita seus privilégios, seu monopólio do poder político, sua localização nas empresas, os joint ventures e associações com o capital estrangeiro e o comércio internacional, para enriquecer-se parasitando os recursos do Estado, enquanto o povo padece de escassez, carestia e da ruína das conquistas econômicas e sociais alcançadas com a Revolução.

Como assinala Morales “Se trata de uma corrupção das que quase todos participam, gerada pela corrupção de funcionários estatais. Porque, que sabemos, em Cuba há um só importador: o Estado. Quer dizer, de maneira evidente, existe um fluxo ilegal de produtos entre o comércio maiorista estatal e o comércio na rua. Toda uma economia submersa que o Estado não consegue controlar e que será impossível de ordenar enquanto existam os grandes desequilíbrios entre oferta e demanda que caracterizam ainda hoje a nossa economia. Se trata então, esta última, de uma forma de contra-revolução que sim conta com líderes ocultos, oferece alternativas ás do Estado e conta com uma massa que a pratica.”

Em suma, “a verdadeira força contra-revolucioná ria em Cuba (...) não está abaixo, senão acima, nos próprios níveis do governo e do aparato estatal. Formada pelos corruptos, já não de baixo escalào, que se descobrem, em altíssimos cargos e com fortes conexões pessoais, internas e externas, geradas por dezenas de anos ocupando as mesmas posições de poder”.

Morales separa aos elementos corruptos do resto da casta dirigente recorrendo ã autoridade de Fidel, pese a que o “núcleo duro” restauracionista é a cúpula das FAR que gozam de um alto grau de autonomia e concentram um enorme poder econômico e político em torno ao Grupo de Administração Empresarial (GAESA), cujos principais figuras são parte do entorno direto de Raul e que manejam “os 89% das exportações, os 59% dos lucros procedentes do turismo e os 66% das vendas em divisas” (La Vanguardia, 26-2-2008).

A rápida sanção que sofreu Morales mostra que o aparato trata de afogar os debates ao interior do regime mostrando enorme temor ás críticas “pela esquerda” – ainda que sejam parciais – que poderiam encontrar eco favorável nas massas.

 

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