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Escandaloso resgate do sistema financeiro norte-americano
por : Juan Chingo

27 Sep 2008 |
Escandaloso resgate do sistema financeiro norte-americano

Após recorrentes salvamentos bancários e inumeráveis medidas monetárias e fiscais para deter a brutal crise financeira em curso, e ante a perspectiva crescente de um crack, no dia 19 de setembro o secretário do tesouro norte-americano, Hank Paulson, anunciou a “mãe de todos os salvamentos” para evitar a quebra do sistema financeiro nos EUA, fato que teria repercussões catastróficas para a economia norte-americana e mundial.

Golpe de estado financeiro

A lei enviada ao Congresso para aprovação dá ao Tesouro poderes imperiais com respeito a uma soma estratosférica - que pode seguir aumentando - de 700 bilhões de dólares, similar ao enorme custo da guerra do Iraque, e maior que o orçamento anual do Pentágono. A lei sustenta que: “As decisões do Secretário segundo a autoridade desta Ata não são sujeitas a revisão e ã aprovação da agência, e não serão fiscalizadas por nenhuma corte de justiça ou agência administrativa”. Em outras palavras, o projeto de lei põe as decisões do Tesouro para além da lei. Isso, pura e simplesmente, é um golpe de estado financeiro. A medida dá ao Tesouro a autoridade não só de comprar papéis hipotecários lixo, como outros ativos se considerar...necessário para estabilizar os mercados financeiros”. A única contabilidade seria um informe trimestral de conteúdo indefinido ao Congresso. Este projeto de lei é tão escandaloso que deixa as portas abertas, seja via incompetência ou aberta venalidade, para pagar exageradamente pelos ativos e serviços de assessores (os mesmos bancos aos quais se pretende salvar) fazendo vista grossa a todo conflito de interesses. Conhecendo o grau de corrupção da atual administração, desde suas mentiras abertas para justificar a guerra do Iraque até as enormes dádivas concedidas ás figuras emblemáticas do Partido Republicano pelos seus serviços no Congresso, e sem deixar de mencionar que Paulson é um ex-agente da Goldman Sachs, o principal banco de investimento do mundo e o mais conectado com Washington, ao qual provê funcionários habitualmente, estamos possivelmente em presença da “mãe de todas as fraudes”. Antecedentes em países semicoloniais como o FOBAPROA [1] no México, que terminou em um escândalo político de proporções podem resultar minúsculos ante a transferência sem precedentes de fundos públicos aos grandes bancos e ã oligarquia financeira norte-americana ã expensas da grande maioria das massas dos EUA.

Servilismo Democrata a Wall Street

O candidato da “mudança” Barack Obama não deixou lugar a dúvidas de que apoiava a lei. Posteriormente disse sem nenhuma ambigüidade que deveriam se postergar alguns planos de gasto em seu eventual futuro governo em função do custoso resgate financeiro. Mais ainda, numa entrevista ao canal de televisão CNBC disse que pediria a Paulson que jogasse um papel na transição, reforçando seus esforços em projetar uma imagem de continuidade e estabilidade em responder a crise financeira. Por estes dias se deixou fotografar frente a figuras do establishment financeiro como Paul Volcker, presidente do Federal Reserve de 1979 a 1987 e uma das referências das reformas neoliberais dos anos Reagan; Robert Rubin, secretário do tesouro durante as duas administrações de Clinton e Warren Buffet se converteram em seus guias frente a atual crise. O projeto de lei de Paulson é tão descarado que no marco da crescente oposição popular em salvar os banqueiros de Wall Street, alguns legisladores estão dando declarações populistas, buscando alguma cobertura política para aprovar a lei. Este é o caso de Christopher Dodd, senador por Connecticut, chefe Democrata do Comitê dos Bancos do Senado, uma figura de um servilismo abjeto aos grandes bancos, que são um dos principais contribuintes ã sua campanha. Em sua declaração de abertura ao depoimento de Paulson no Congresso este fez um resumo bastante preciso sobre o que significa a proposta do secretário do tesouro. “A proposta” disse “é sensacional e sem precedentes em seu alcance e falta de detalhe. Ela permite a ele (Paulson) intervir na economia comprando ao menos 700 bilhões em ativos tóxicos. Permitirá a ele conservar tais ativos por anos e pagar milhões de dólares a firmas escolhidas a dedo para manejar tais ativos. Não haveria nada para evitar que um só CEO verta milhões de dólares de ativos tóxicos sobre os ombros dos contribuintes - e se retirar com um bônus e um “pára-quedas dourado” [2]. E lhe permitirá atuar com completa e absoluta impunidade - sem a revisão de uma agência ou Corte da Justiça. Depois de ler esta proposta só se pode concluir que não só é nossa economia a que está em risco, como também nossa Constituição”. Entretanto, rapidamente declarou que função do esforço em restaurar a segurança financeira o comitê que ele preside tinha a obrigação de examinar a lei cuidadosamente e num tempo apropriado, uma vez que abalou o trabalho de Paulson e Bernanke, o presidente do Federal Reserve (FED por sua sigla em inglês). Mas o que deu o tom da vontade do Congresso de aprovar a lei Paulson foi Charles Schumer, o senador democrata por Nova Iorque que encabeça o Joint Economic Committee do Congresso. Insistindo que não haveria tempo de considerar as causas da maior das crises financeiras desde a Grande Depressão, ou investigar os banqueiros que levaram a tal desastre, Shumer declarou que haveria que “olhar adiante, e não para trás”. “Não é justo, não é correto, mas é o mundo em que vivemos”, disse. E agregou: “Eu quero assegurar aos mercados que não endossaremos emendas a esta lei. Nós atuaremos e atuaremos rápido”. Para que não fiquem dúvidas da responsabilidade dos legisladores e utilizando a mesma chantagem que frente aos atentados de 11 de setembro, Paulson respondia com a seguinte frase a possibilidade de que seu plano de resgate de 700 bilhões de dólares não vá adiante no Congresso: “Se não for aprovado, que Deus nos guarde”.

Um tempestuoso “tsunami” financeiro

Enquanto esperam a aprovação parlamentar do plano de salvamento de Paulson, a intervenção da FED para proteger o sistema bancário não parou um só minuto. No mesmo final de semana em velocidade recorde esta aprovou a transformação da Goldman Sachs e Morgan Stanley, os dois únicos bancos de investimento que ainda restavam e poderiam colapsar, em holding bancários, o que lhes permite integrar as medidas de sustentação do FED enquanto a janelas de liquidez, ademais de dispor de uma base de depositantes para melhorar sua base de capital.

Entretanto, o estado frágil dos bancos norte-americanos assinala o fato de que apesar de esta nova mostra de socorro das autoridades estes correm em busca da ajuda japonesa. Assim Morgan Stanley anunciou que vendeu entre 10% e 20% de seu patrimônio acionário a Mitsubishi UFJ Financial Group em 9 bilhões de dólares. Nomura, o maior banco de investimento do Japão comprou as operações de Lehman Brothers na Ásia. E Goldman Sachs, por sua vez, chegou a um acordo com o fundo Berkshire Hathaway de Warren Buffet para a compra de 5 bilhões de dólares em ações preferenciais e um compromisso de igual quantidade em ações comuns.

Tampouco param a aparição de novos “cadáveres” financeiros, sendo as próximas vítimas da deflação da dívida dos hedge funds, ou fundos de cobertura como o famoso LTCM que foi salvo do default russo em 1998 e os fundos de capital de risco ou private equity firms por sua denominação em inglês, responsáveis por uma alta porcentagem das fusões empresariais que se realizaram nos últimos anos. E isso sem nomear que o mercado de Credit Default Swaps [3] ainda está para ser questionado. Isso se mostrou com a estatização da Fannie Mae e Freddy Mac que forçou 13 grupos de Wall Street a negociar 1,4 bilhões de derivativos relacionados. Neste segmento, as conseqüências da bancarrota do Lehman poderiam ser mais sérias.

E muito menos que o “tsunami financeiro” poderia se estender a outros segmentos do sistema financeiro, como já é o caso dos fundos de dinheiro, um investimento de pouco risco no qual centenas de milhares de investidores têm suas poupanças, que ainda que não tenham garantia como as poupanças eram consideradas até agora tão seguras quanto aquelas. E novas surpresas poderiam ocorrer com centenas de milhares de dólares de perdas que se avizinham na dívida corporativa, quiçá tanto como o que já se perdeu nas securities [4] avaliadas em hipotecas. Sem nomear a pior de todas, a exposição contável dos “derivados financeiros” por um quatrilhão de dólares escondidos nas clandestinas “contas invisíveis” dos paraísos fiscais que representam o “nível 3” (dívidas incobráveis e impagáveis) dos bancos britânicos insolventes.

Como vemos, toda a hipertrofia financeira gerada durante estas décadas está se decompondo a ritmos cada vez mais acelerados. Por isso o problema não é de fácil solução. É que o estoque acumulado da dívida norte-americana cresceu de meros 163% do PNB em 1980 a 346% em 2007. Um dos principais responsáveis desta escalada foram os lares, cuja dívida cresceu de 50% em 1980 a 71%, em 2000 e 100% em 2007. Com a especulação os lucros foram extraordinários, mas ã custa de um endividamento colossal que foi se convertendo mais e mais em combustível ou força motora do crescimento. Isso não significa que a financeirização tenha sido um fator autônomo, mas que era a contrapartida do aumento da taxa de exploração e da ausência de oportunidades de investimento suficientemente rentáveis. Neste contexto, de ausência de suficientes ocasiões de investimentos rentáveis para o capitalismo, a pressão das finanças se exerceu brutalmente, levando o crescimento a níveis para além do que era sustentável. O choque com a realidade é tão duro e por isso ameaça erodir o hipertrofiado sistema financeiro gerado durante todos estes anos.

Plano Paulson: Funcionará desta vez?

O plano de salvamento de Paulson é a primeira resposta sistemática ou global da fenomenal crise financeira que vem se desenvolvendo em Wall Street. No imediato evita a perspectiva de um crack iminente que sobrevoou os mercados nas últimas semanas. Mas apesar de no dia 19 de setembro ter ocorrido uma alta histórica das bolsas (uma medida não só oriunda da renovada confiança dos investidores no governo norte-americano, mas fundamentalmente originada pelo desgaste após semanas em que os investidores se aproximavam do precipício sem freio) na segunda-feira seguinte os sintomas de pânico voltaram aos mercados. A chave do plano Paulson é a compra de ativos tóxicos dos bancos esperando desta maneira mitigar a espiral descendente do preço dos ativos. Em outras palavras, nacionalizando uma parte da dívida dos bancos buscam pôr um piso ao valor dos ativos. Mas como vínhamos dizendo desde que a crise começou, a mesma não é uma crise de liquidez, mas de solvência, isto é, há empréstimos que são incobráveis e entidades que não podem pagar suas dívidas. A queda dos ativos é expressão de um problema maior, que é a forte descapitalização do sistema financeiro norte-americano, o que gera a seca creditícia ou credit crunch e o plano não faz nada para resolver este problema.

Menos ainda busca reduzir a dívida dos lares com uma renegociação que evite a continuidade das execuções de moradias, mais ainda quando os cálculos mais sérios seguem predizendo que o preço das mesmas pode cair ainda cerca de 25%, fazendo com que novas pessoas se vejam obrigadas a deixar suas casas ante a impossibilidade de pagar seu crédito hipotecário. Por isso ainda que as bolsas tenham reagido com otimismo imediatamente após o anúncio do plano, cada vez mais economistas duvidam da sua viabilidade. Até o principal editorialista do Financial Times, Martin Wolf, que até agora tinha uma fé cega na intervenção do Estado como recurso último capaz de prevenir uma desintegração do sistema financeiro, admite que “O Plano de Paulson não é uma verdadeira solução ã crise”, sobretudo por que “...um esquema que dê conta da crise deve ser capaz de remediar a ameaça o cerne da descapitalização do sistema financeiro.. .” (Financial Times, 23/9). Por sua vez, a cada vez maior suspeita de que o plano só pode ter alguma viabilidade mínima se Paulson pagar os ativos fortemente desvalorizados, abre espaço para uma crescente oposição a seus poderes arbitrários. Este ponto tem sido utilizado por Obama para exigir quatro condições para melhorar o plano de resgate, entre elas um comitê bipartidário para controlar o processo, além de alguns limites na compensação daqueles que se beneficiam com o dinheiro dos contribuintes. Entretanto, não colocou que votaria contra o plano se estas condições não se concretizam. No primeiro ponto, tanto Obama quanto McCain, o candidato republicano, coincidem amplamente expressando este último a necessidade de estabelecer uma junta bipartidária para supervisionar o proposto plano de resgate. Por sua vez, o magnata George Soros também expressou num artigo no Financial Times que não se deveria dar um cheque em branco a Paulson, apoiando os quatro pontos de Obama, além de sustentar a necessidade de recapitalizar os esvaziados balanços dos bancos. Esta crescente oposição de setores políticos e da cúpula econômica com relação ao plano está dificultando sua aprovação, que se fracassar poderá abrir um novo pico da crise.

Mas para além do plano ser aprovado, nos interessa ressaltar que desde um ponto de vista capitalista não há saída ã crise sem uma massiva intervenção estatal, isto é sem socialização das perdas. Isso em si não surpreende a nós, marxistas. O que nos chama a atenção de fato é que estas medidas sejam tomadas quando o Down ainda não caiu significativamente, e a economia cresceu 3,3% no semestre anterior. Que isso quer dizer? Normalmente, medidas desesperadas deste tipo são tomadas apenas após o crack e no meio de uma forte desaceleração, não em um esforço para evitar o desendividamento. Não só estas medidas não funcionam, como que só podem exacerbar o inevitável deslocamento econômico e financeiro. É que apesar do caráter gigantesco da intervenção estatal este é insuficiente para fazer com que semelhante bolha creditícia não exploda e evitar a descapitalização do sistema financeiro. Segundo informa a agência Bloomberg o expert japonês Ken Ohmae, antigo diretor da consultoria Mackinsey em Tóquio disse que "o Plano Paulson é uma piada", já que a magnitude da crise dos EUA é tão grande que se necessita ao menos 50 bilhões de dólares e colocando um hipotético (e totalmente utópico pelas crescentes tensões e rivalidade econômica internacional), como demonstrou a resposta de Merkel e Sarkozy a aplicar o mesmo plano da Europa, como pedia o secretário do tesouro norte-americano de um fundo internacional com contribuições das reservas de divisas da China, Japão, Taiwan, países do Golfo, UE e Rússia.

É que como demonstrou o Japão nos anos 80 frente `a deflação da dívida foram necessárias uma, duas, várias injeções de apoio estatal sem conseguir no fundo reviver a economia que esteve praticamente estancada toda a década. O Plano Paulson poderia ser o primeiro destas massivas injeções sem que se consiga evitar a perspectiva de uma japonização. Ou pior ainda, a exemplo de De La Rua e sua política para "evitar o fim dos pagamentos" da dívida externa que só poderia postergar a inevitável queda (no caso da Argentina tal medida só serviu para permitir a fuga de capitais dos que todavia ainda neste momento não o haviam feito. Nos EUA só poderia significar o resgate dos bancos mais próximos ao poder.) O elemento desencadeador poderia ser uma corrida contra o dólar.

Salvar os bancos em curto prazo ã custa de derrubar o dólar

O grave do plano de Paulson e de todos os demais resgates que seguramente o seguirão é que ao multiplicar o endividamento dos EUA se coloca em risco a situação do dólar. Os déficits gêmeos acumulados pelos EUA sob a administração Bush que seguirão crescendo exponencialmente durante a próxima administração põem em risco a posição do dólar como moeda de reserva mundial. Contra a visão tranqüilizadora de alguns analistas que colocam que semelhante crescimento da dívida é absorvível pelos EUA já que estes teriam após o atual resgate um nível de dívida com respeito a seu PIB nos níveis da França ou Alemanha, estando longe ainda do Japão, há que assinalar uma pequena mas decisiva diferença com este último país que também sofreu um duro período de deflação da dívida depois do estouro da bolha imobiliária e bursátil de 1989: EUA depende do financiamento externo já que sua taxa de poupança é negativa, enquanto que o Japão nos 90 era - e é - o principal credor mundial.

Em algum momento o chamado “plano de resgate silencioso” como o chama o economista Brad Sester faz com que os bancos centrais e investidores destes países poderiam começar a exigir uma maior compensação por depositar seus ativos em bônus do tesouro norte-americano. O massivo resgate estatal de Paulson (e os que seguramente lhe seguirão) ao deteriorar a situação fiscal dos EUA implica que em algum momento terá que subir as taxas de juros para evitar uma corrida contra o dólar. A estabilidade dos EUA será posta a prova. Um aumento das taxas de juros (um cenário inevitável se continuam os resgates financeiros com fundos do estado) pode agravar a recessão que já é totalmente inevitável.

É que diferentemente do crash de 1987 que permitiu uma purga do capital especulativo excedente e após um relançamento da economia norte-americana e mundial, a atual crise financeira está se contagiando por diversos mecanismos ã economia real. A restrição ao crédito afeta o consumo dos lares, que irá se contrair mais na medida em que avance a recessão e as demissões, assim como os planos de investimento das empresas. Economistas como Fernando Fernandez, atual reitor da universidade Antonio Nebrija e ex-economista chefe do FMI, colocam que “as conseqüências desta crise ainda não começaram. Rapidamente teremos que nos acostumar a viver com crescimentos de crédito de 3% quando na atualidade estamos em taxas de 8%”. (El Economista, 24/9).

Por sua vez, a diminuição do patrimônio financeiro e imobiliário dos lares os levará a consumir menos, ademais dos efeitos sobre o consumo e o investimento, e da incerteza geral. Por outro lado, a crise imobiliária em si mesma - que foi o principal setor de crescimento ao longo dos anos de boom - e com seus efeitos multiplicadores em outros setores da economia é uma grande trava ao crescimento até que o mercado imobiliário não recupere a normalidade. Por último, as exportações melhoraram como conseqüência da queda do dólar - ainda que há que assinalar que a melhor esteve centrada no setor agro - alimentar aproveitando- se da alta do preço destes que no setor manufatureiro propriamente dito de conjunto - poderiam se desacelerar fortemente ã medida em que a crise norte-americana se expande em nível internacional.

Todos estes elementos antecipam uma recessão forte e longa como mínimo, sem esquecer as restrições com o gasto, como o aumento de impostos que implicarão os custosos e diversos resgates estatais em curso. Neste cenário recessivo e de continuidade da crise financeira, cenários crescentemente catastróficos soam cada vez menos longínquos. Como diz o economista Barry Eichengreen: “Há alguns meses atrás no almoço com um respeitado observador do FED eu lhe perguntei: ‘quais são as probabilidades de que o desemprego dos EUA possa alcançar uns 10% antes de que a crise termine?” “Zero”, me respondeu, numa admirável mostra de confiança... Eu tomei isso como um reflexo da opinião dentro do banco central dos EUA. Nós poderíamos estar no meio da mais séria crise de crédito desde a Grande Depressão, mas nada se parece ã Depressão propriamente dita, quando o desemprego foi a 25%. Comparações com 1930 eram exageradas. Os eventos da última semana sacudiram tal complacência. ..Esperamos mais turbulência. O Plano de Paulson, seja qual for sua forma final, não levará esta agitação a um final rapidamente. As conseqüências estão claramente se expandindo de Wall Street a Main Street. A recente performance das ações das firmas não financeiras indica que os investimentos são conscientes deste fato. Portanto comparações com a Grande depressão, que tivessem um interesse acadêmico, mas nenhuma relevância prática, cobram nova importância...Eu suspeito que agora será menos provável que seja visto como um lunático quando pergunte se o desemprego pode alcançar 10%” (“And Now the Great Depression”, 23/9).

De conjunto, ao calor desta crise financeira os EUA já fortemente debilitado por seus fracassos militares no Iraque e Afeganistão e a perda de hegemonia e legitimidade em nível internacional, dá um novo salto em sua debilidade. Sua possibilidade de viver para além de seus meios, o que incluía um enorme sobre gasto militar, está acabando. Seus desequilíbrios internos e externos estão explodindo levando o seu modelo de crescimento das últimas décadas ao fim. Não só não voltará a jogar o papel de consumidor em última instancia em nível mundial com todas as conseqüências nefastas para a economia mundial carente de fortes setores de demanda doméstica dinâmicos que possam jogar um papel de substitutos ao sobre consumo dos EUA, senão que no plano interno os norte-americanos terão que se acostumar a não poder viver tanto do cartão de crédito num momento no qual têm muitas probabilidades de perder seu postos de trabalho e com os preços de muitos produtos, como a gasolina, nas alturas.

“Isto quer dizer que terão que se acostumar a algo que há muito tempo não fazem: viver só de sua renda. Se acabou a era do crédito fácil” explica Peter Morici, economista da Universidade de Maryland” (El Economista, idem). Mas em general, os EUA terão que se ajustar ao menor gasto dos lares dos trabalhadores, a grandes mudanças nos hábitos de consumo das classes médias acomodadas (por exemplo menos coisas suntuosas e serviços domésticos), menos importações e mais exportações e menor consumo de energia. E sobretudo a economia deverá ajustar se a uma dependência menor do endividamento, o que significa que deverá encontrar um modelo de crescimento mais produtivo e menos impulsionado pelo endividamento dos lares, isto é reencontrar ramos de produção onde demonstre sua maior competitividade numa economia mundial hiper-competitiva. A transição tanto social como politicamente pode ser fortemente traumática. A estabilidade da principal potência capitalista do mundo será posta a prova nos próximos anos.

 

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