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VI Fórum Social Mundial de Caracas 2006
26 Jan 2006 |

Declaração política da FT-QI

Uma vez mais se realiza o Fórum Social Mundial (FSM) que reúne a grande parte da esquerda internacional e os movimentos sociais e políticos. Se os primeiros eventos se realizaram baixo o impulso do movimento anti-globalização, que teve uma grande repercussão principalmente nos países centrais com grandes manifestações como a de Seattle, Praga e Gênova, o VI FSM policentrico da América (ou II FSA) em Caracas, Venezuela, se realiza sob o alento dos novos fenômenos políticos que recorrem a América Latina.

O processo de resistência das massas latino-americanas ã ofensiva neoliberal da década de 90 tem se transformado nos últimos anos em um amplo ascenso, com grandes ações de massas como os levantamentos no Equador e na Bolívia, as jornadas revolucionárias em dezembro de 2001 na Argentina, ou a grande mobilização popular que derrotou o golpe de 2002 e a paralisação patronal de sabotagem em 2002/2003 na Venezuela; derrubando a vários governos eleitos e abrindo situações pré-revolucionárias e crises revolucionárias. Esta situação tem dado lugar a mudanças nos representantes políticos das classes dominantes, levando a ascensão de governos “pós-neoliberais” em vários países da região.

O FSM vinha num processo de decadência após suas últimas edições em Porto Alegre, produto do giro direitista do governo Lula, outrora a “estrela” do “outro mundo é possível”. Entretanto, neste ano parece se revestir de novos ares ao se realizar na Venezuela sob o auspício do governo de Hugo Chávez, como também pelo impacto da eleição do novo presidente boliviano, Evo Morales. Assim, cinco anos depois do primeiro evento celebrado em Porto Alegre, Brasil, o FSM 2006 se perfila como a “construção de alternativas ás políticas neoliberais”, segundo reza sua carta de princípios.

Para seus organizadores, o FSM é uma “zona de debate, reflexão e de formulação de propostas que devem facilitar a articulação de movimentos sociais de forma descentralizada e em rede, a fim de contribuir na construção de um novo mundo”. Asseguram que no FSM de Caracas, “se debaterá acerca do poder, política e lutas pela emancipação social; estratégias imperiais e resistência dos povos; recursos e direitos para a vida: alternativas ao modelo civilizatório depredador; diversidades; identidades e cosmovisões em movimento; trabalho, exploração e reprodução da vida: comunicação, cultura e educação”.

Mas na verdade, como já bem demonstrou as edições anteriores, os organizadores do FSM - burocracias sindicais “opositoras”, partidos reformistas, ONGs, etc - ante o debilitamento das direções políticas e sindicais tradicionais por sua cumplicidade na aplicação dos planos neoliberais dos anos 80 e 90, têm como objetivo conter as lutas que começaram a ressurgir no mundo nos últimos anos, em particular as lutas dos trabalhadores, camponeses, pobres urbanos e da juventude na América Latina, para desviar estes processos, mediante reformas “possíveis”, com a busca de um “capitalismo mais humano”, recoberto desta vez do novo discurso do “socialismo do século XXI”.

1. Os primeiros eventos do FSM se realizaram sob a égide do Partido de Trabalhadores (PT) de Lula no Brasil e em contraposição ao Fórum Econômico de Davos, apoiado no amplo movimento anti-globalização internacional que irrompeu em Seattle em 1999 e que sacudiu diversas cidades dos países centrais. Os principais impulsionadores do FSM em 2001 pretendiam falar em nome deste importante movimento que boicotava as cúpulas da OMC, FMI e atacava os símbolos do poderio capitalista. Mas o objetivo primordial dos organizadores do FSM era justamente institucionalizar este movimento contendo sua ala anti-capitalista e canalizando o sentimento de repúdio ã “globalização” para a “humanização do capitalismo”.
Grupos como ATTAC, que defendiam a “democracia participativa” do PT em Porto Alegre e ao PT como exemplo não só para o Brasil senão para todo o mundo, depois do aberto giro neoliberal de Lula, não tem mais referentes. Sua tíbia retórica antinorte-americana se complementava com a sustentação da política do imperialismo francês, particularmente durante a guerra do Iraque. Refundación Comunista na Europa se prepara para governar o Estado italiano junto ao neoliberal Romano Prodi, ex presidente da reacionária Comissão Européia.

Um setor importante destes impulsionadores do FSM, enquanto criticam fortemente a política imperialista dos Estados Unidos, guardam um vergonhoso silêncio sobre a política imperialista dos países europeus. Tudo isto quando sabemos que junto aos Estados Unidos, que consideram a América Latina como seu quintal, os países imperialistas europeus tem um enorme papel no saque do continente latino-americano. Várias empresas européias têm ficado com os suculentos negócios das privatizações, principalmente no Cone Sul, onde a Repsol, France Telecom, Telefônica, Total, Telecom Itália, Gaz de France, etc., são sinônimos de espoliação e miséria na América do Sul. A chamada “fortaleza Europa” se sustenta com a exploração dos países do chamado Terceiro Mundo (em competição com os EUA e Japão). Enquanto isso, estes imperialistas “democráticos” fecham brutalmente suas fronteiras aos que tentam fugir da fome que eles mesmos provocam, como por exemplo o governo “progressista” de Zapatero, que desatou uma verdadeira matança de imigrantes em Ceuta e Melila, enclaves coloniais espanhóis na África.

“Outro mundo é possível” era a consigna que fazia eco nos primeiros Fóruns, e em nosso continente milhões de trabalhadores, camponeses pobres e setores populares punham todas suas esperanças na “nova estrela” do PT, que com sua “democracia participativa” experimentada em Porto Alegre se dispunha a tomar as rédeas da mais importante nação sul-americana com discursos de mudanças e reformas.
Mas contrariando a grande expectativa de amplos setores de massas, o governo do PT se transformou em aplicador direto das políticas neoliberais no Brasil. Lula, o presidente “operário” se transformou em uma “criança mimada” do imperialismo e demonstrou ser um político verdadeiramente capaz de assumir diretamente a gestão do Estado capitalista. Hoje, marcado por uma forte corrupção e escândalos políticos, começa a ser repudiado por importantes setores dos trabalhadores, mostrando claramente o caráter utópico e reacionário da política de humanizar o capital e as falsas promessas dos “reformistas sem reformas”.

Se durante os primeiros Fóruns nos diziam que só era possível colocar limites na rapina das grandes multinacionais mas jamais expropriá-las, e nos apresentavam como grandes conquistas os “orçamentos participativos” dos governos do PT em Porto Alegre, ao chegar ao governo não foram capazes sequer de realizar ínfimas reformas que diziam defender. Inclusive nos dias prévios ã realização do IV FSM, Lula chegou a afirmar que “seria necessário uma unificação com o Fórum de Davos”, nada menos que o Fórum Econômico Mundial que reúne representantes dos governos imperialistas e da burguesia internacional.

Governos como os de Kirchner na Argentina, e Tabaré Vázquez no Uruguai, “progressistas” que seguiram o derrotero de Lula, se apresentam como alternativas aos governos “neoliberais”. Mas não são mais que continuadores das políticas pró-FMI, pagando pontualmente a dívida externa e cedendo ás exigências dos organismos de crédito, com a consequência de miséria e desemprego para a grande maioria da população e o enriquecimento das grandes corporações, ficando em evidência a bancarrota desta política reformista. Assim, o governo de Kirchner, a exemplo de Lula, deu um grande presente de natal em 2005 ao FMI cancelando sua dívida de mais de 9 bilhões de dólares, enquanto aos trabalhadores e ai povo não lhes outorgou sequer um simples aumento salarial. Para os credores imperialistas tudo, para o povo nada.

Os representantes do suposto “progressismo” uma vez no governo, cumprem seus compromissos com o grande capital e seus pactos com o imperialismo, mantendo a continuidade no essencial dos planos neoliberais. Temos visto também todos eles se subordinarem ao imperialismo, participando na ocupação militar do Haiti sob as ordens de Washington e da ONU, a que cinicamente apresentam como uma missão “humanitária”. Contra as coberturas “democráticas” das intervenções militares, os marxistas revolucionários nos pronunciamos e lutamos pela expulsão e a derrota das tropas imperialistas em todo o mundo, seja sob mandato dos Estados Unidos, dos países imperialistas europeus, da OTAN, ou da ONU. Defendemos e apoiamos a luta do povo iraquiano e afegão para libertar-se das ocupações das tropas norte-americanas, francesas, alemãs, ou japonesas, como também a saída imediata de todas as tropas do Haiti onde há um altíssimo componente militar brasileiro, argentino e uruguaio.

Os acontecimentos dos últimos anos - como por exemplo a guerra do Iraque - têm deixado em evidência a grande falácia de que “outro mundo é possível” sem derrotar ao imperialismo, sem expropriar aos capitalistas, sem destruir a maquinaria do estado burguês e iniciar a construção socialista, isto é, sem uma revolução operária. Por isso, sempre temos discutido abertamente que o FSM era contrário a toda política de independência dos trabalhadores e a todo internacionalismo conseqüente.

2. Ante o desgaste inicial das expectativas no governo de Lula, o VI FSM de Caracas tem encontrado uma nova “estrela” no governo “bolivariano” de Hugo Chávez, que já em 2005 em Porto Alegre foi visto por importantes setores como uma alternativa, porque aparece confrontando Bush, apelando ao povo, fazendo algumas concessões e falando do “socialismo do século XXI”. Do mesmo modo, o FSM aproveitará a influência que exerce o recente presidente eleito na Bolívia, Evo Morales.

Os que firmamos esta declaração na Venezuela têm estado na primeira fila da luta para derrotar o golpe de abril e a paralisação patronal de sabotagem organizados pelo Departamento de Estado, Embaixada dos EUA e seus serventes lacaios nacionais. Agora, Hugo Chávez nos fala de socialismo, da necessidade de enterrar o capitalismo, na idéia de reforma agrária, que efetivamente são as únicas possibilidades de enterrar a fome, a miséria, o trabalho precário, as condições de exploração e submissão da classe trabalhadora ao imperialismo. Mas há que dizer claramente, contrariamente ao que se pensa, que para além de algumas concessões parciais que o governo de Chávez tem feito, como no terreno da educação, saúde, no plano alimentício via Misiones,ou com a nova Lei de Terras, que tenta uma limitada distribuição de terras; suas medidas concretas não passam de arranhar a superfície dos males históricos do capitalismo semicolonial venezuelano.

Assim, apesar destas concessões parciais ás massas, o temos visto no último período abrir canais de negociação com o setor empresarial que mantém intacto seu poder econômico no país. Chávez mantém a propriedade privada dos meios de produção consagrada na própria Constituição bolivariana, respeita os acordos com o capital estrangeiro e o pagamento da dívida externa, e chama ás transnacionais a associar-se ao desenvolvimento venezuelano, como o faz com as grandes companhias petroleiras associando-se em empresas mistas. Seguindo o exemplo do “progressista” Kirchner já anunciou que está disposto a pagar 25% do total da dívida externa em um só desembolso. Dificilmente o FMI receberá melhores notícias neste 2006.

Assim temos visto como durante estes sete anos de “revolução bolivariana”, a política de Chávez não tem levado ã expropriação dos principais grupos capitalistas, como os multimilionários Cisneros e Mendoza, e os grandes meios de comunicação que organizaram o golpe de abril de 2002, nem a ruptura com as transnacionais. Enquanto se subvencionam os planos de assistência social, educação, saúde com a renda petroleira, os capitalistas seguem acumulando lucros, enquanto o desemprego e os níveis de exploração se mantêm.

Na Venezuela, as massas estão por fora de toda decisão política de fundo, apesar de toda a fraseologia que se repete cotidianamente, as gestões municipais com “participação popular e controle social” e o discurso “participativo e protagonista”. Isto é o que está na base do crescente repúdio ã burocracia do MVR, Podemos e aliados, que começa a se expressar em camadas importantes dos trabalhadores e setores populares.
A retórica antinorte-americana do presidente venezuelano é na realidade limitadamente anti-Bush, pois como insistiu na Cúpula de Mar del Plata queria um retorno das políticas “amistosas” dos Estados Unidos, manifestando que: “Temos convivido com os Estados Unidos. Há que dar início a uma nova etapa de convivência verdadeira entre os governos da América Latina e o governo - este e os que estejam por vir - dos Estados Unidos” .

Neste sentido, na mesma Cúpula na Argentina, Chávez chegou ao extremo de reivindicar a “Aliança para o Progresso” de John F. Kennedy, como uma melhor forma de cooperação e de trato. Mas sabemos que esta “Aliança” não era mais do que uma proposta imperialista que naqueles dias equivalia a atual ALCA, e uma política, que como disse o Che Guevara, era “um veículo destinado a separar o povo de Cuba dos outros povos da América Latina, esterilizar o exemplo da Revolução cubana e, a domesticar os outros povos de acordo com as indicações do imperialismo”. E este discurso anti-ianque de Chávez e de seus seguidores na América Latina e na Europa, está acompanhado de um silêncio com relação aos imperialistas europeus. Recusa-se a invasão do Iraque e a política belicosa norte-americana, mas pouco se diz da invasão por parte dos exércitos dos países europeus ao Afeganistão, Costa do Marfim, Kosovo etc. O presidente venezuelano chegou ao extremo de fazer pública sua solidariedade com o reacionário governo francês de Chirac e Villepin durante a revolta das periferias de Paris em novembro passado. O que na verdade procura Chávez são maiores margens de independência, mas não uma ruptura com o imperialismo.

Chávez pretende fazer crer que grandes objetivos como a integração latino-americana, uma reforma agrária radical ou, ainda mais, a “construção do socialismo do século XXI” são possíveis de serem alcançados por meio de um processo de reformas graduais, sem necessidade de revoluções sociais que terminem com a exploração do capital imperialista e das burguesias nativas. A tarefa histórica da unidade latino-americana é inseparável da tarefa de romper com o imperialismo, e esta tarefa está inteiramente nas mãos dos trabalhadores em aliança com os camponeses pobres e os oprimidos. O único programa que pode garantir este objetivo é o que se sintetiza na conquista revolucionária de repúblicas operárias e camponesas que confluam numa Confederação de Repúblicas Socialistas da América Latina e do Caribe. A Bolívia vem sendo cenário de importantes levantes de massas como os de outubro de 2003 e junho de 2005, com insurreições como na cidade de El Alto, que levaram ã queda de dois presidentes e abriram profundas crises políticas. Nas recentes eleições presidenciais as forças políticas abertamente empresariais sofreram uma contundente derrota. Mesmo que estas eleições tenham sido uma política para desviar o processo revolucionário boliviano, as mesmas se deram num marco de grande politização, giro a esquerda e sentimentos nacionalistas e democráticos entre as massas.

O movimento de massas tem grandes expectativas no novo governo de Evo Morales. Ainda que seu rumo irá se definindo nos próximos meses, já há que se dizer claramente que o flamejante presidente eleito não pretende aprofundar o caminho aberto pela mobilização de massas bolivianas senão conduzir um processo de mornas reformas no país andino, tal como o manifestou em sua recente viagem internacional e frente a governos imperialistas europeus. Em suas viagens pela França, Espanha e pelo Brasil, deu garantia ás grandes companhias petroleiras e do gás que seus interesses não serão tocados. Assim, o que vemos é uma política que se reduz a renegociar os contratos petroleiros e fortalecer YPFB, quando a nacionalização do gás foi uma das grandes demandas durante os levantas, contrariando, inclusive antes de assumir, esta grande aspiração do povo boliviano.

Sobre o problema da partilha da terra, o plano de Evo Morales se limita apenas a “reparar” sem liquidar o latifúndio, quando só nas chamadas terras baixas do país, 7.000 latifundiários acumulam 40 milhões de hectares, enquanto dezenas de milhares de famílias camponesas não têm terras. Também não se propõe a organizar um plano estatal para a agricultura camponesa em ruínas porque em ambos os casos chocaria diretamente com os interesses fundamentais e a propriedade da burguesia.

Evo diz que “com nosso governo se acabará o ódio, o desprezo. Se acabará com o Estado neoliberal e o Estado colonial”, mas pretende fazer isto sem afetar a grande propriedade dos empresários, latifundiários e multinacionais, e sim por meio de reformas políticas. Seu projeto é de colaboração de classes em torno de um programa reformista, ao que espera somar empresários, latifundiários e até capitais estrangeiros nos marcos do “capitalismo andino”. Isto o diz abertamente, e não se cansou de repeti-lo em sua recente viagem internacional.

Em suma, a política de Evo é continuar desde o poder do Estado com a tarefa de contenção da luta das massas, papel que veio cumprindo nos últimos anos, como demonstrou em outubro de 2003 e em junho de 2005, e não satisfazer as demandas pelas quais trabalhadores e camponeses lutaram e morreram nesses combates. Por isso, ainda que se apresente o triunfo de Evo como o “acesso ao poder de um indígena pela primeira vez em na história da Bolívia e América Latina”, a verdade é que um governo do MAS não será um governo dos trabalhadores, nem representará os interesses dos camponeses pobres e dos povos originários.

Por isso, para os que lutamos pela independência política dos trabalhadores, afirmamos categoricamente que no país andino é necessário fortalecer uma política operária independente frente ao governo do MAS e do Evo Morales, pois consideramos que só no marco estratégico da revolução operária e socialista é possível combater conseqüentemente pelo programa agrário, democrático e antiimperialista, e só o poder dos operários e camponeses pode resolvê-las efetivamente. Por isso é importante e necessário desde já preparar um efetivo trabalho de organização e preparação da luta pelas demandas impostergáveis dos trabalhadores, como também frente a qualquer tentativa da reação e do imperialismo. Em síntese, dizemos claramente que o dilema novamente proposto neste princípio de século continua sendo a reforma ou a revolução.

As direções políticas “progressistas” e os organizadores do FSM são partidários de um reformismo “morno” limitado ã miséria do “possível”, isto é, “humanizar o capitalismo” sem mexer na propriedade privada, e no máximo pechinchar por melhores condições com o imperialismo. Contra esta estratégia que historicamente demonstrou ser desastrosa para as massas operárias, camponesas e populares, afirmamos categoricamente a necessidade de lutar por uma revolução social para terminar verdadeiramente com os enormes padecimentos e carências das massas, provocados pela sede por lucros dos monopólios capitalistas e seus representantes políticos. Contra as mentiras dos políticos patronais “progressistas” e seus aliados, as burocracias sindicais operárias e camponesas, lutamos para que os trabalhadores confiem unicamente em suas próprias forças, e que, tomando as demandas do conjunto dos oprimidos pelo capital, encabecem a luta contra o imperialismo e as classes dominantes nativas, no caminho da construção da sociedade socialista.

3. No entanto, a maioria das principais correntes que se autodenominam “revolucionárias”, no lugar de brigarem pela independência política da classe operária, se adaptam a espaços reformistas de esquerda, e muitas vezes, abandonam a estratégia de construir partidos solidamente enraizados na classe trabalhadora para procurar atalhos através de diferentes “movimentos sociais”. Em alguns casos chegam a repetir a política do ministerialismo, tão combatido pelos revolucionários do começo do século passado, como o faz o "Secretariado Unificado da IV Internacional (SU)", da qual pertencem a LCR na França e a Democracia Socialista (DS) do Brasil, que mantém em suas fileiras a Miguel Rosetto, ministro de Agricultura do governo Lula. Desde o SU ao The Militant (CIM) diversas correntes “marxistas” se adaptam completamente ao discurso do governo Chávez. Na mesma dinâmica está o Socialist Worker Party (SWP) da Inglaterra, que impulsiona a aliança eleitoral Respect, uma aliança de colaboração de classes com setores da comunidade muçulmana e figuras políticas como o ex- deputado laborista George Galloway, que se pronunciou abertamente contrário ao direito ao aborto. Como vemos, todos tendem a confluir em partidos comuns ou frentes eleitorais sem delimitação de classe com objetivos essencialmente eleitoralistas, para aproveitar os espaços que podem se abrir ã esquerda dos reformistas no governo.

A adaptação é tal que a grande maioria das correntes internacionais que se reivindicam trotskistas, como CRCI da qual participa o Partido Operário da Argentina e o PCO do Brasil, ou o Progetto Comunista da Itália chamou a votar recentemente pelo projeto de conciliação de classes do MAS na Bolívia, somando-se ã posição similar ã de grupos de esquerda como o MST (UIT) argentino que apóia o MAS por expressar uma “frente social revolucionária”.
Contrariamente a estas posições políticas, cremos que no atual cenário, as tarefas dos revolucionários se concretizam na briga por construir fortes correntes com inserção nas grandes concentrações operárias, que intervenham na luta de classes levantando programas para a ação que, partindo das demandas imediatas de cada luta, tendam a questionar o governo, o regime e o Estado capitalista; que impulsionem as expressões avançadas da vanguarda operária e popular na luta anti-patronal, anti-burocrática e anti-governista; que combatam política e ideologicamente os projetos de conciliação de classes do “reformismo democrático” bem como do chavismo, defendendo sempre a necessidade de uma política operária independente; que partam de uma sólida concepção internacionalista e anti-imperialista.

4. Os trabalhadores na América latina começam a estar em importantes brigas e a dar passos na perspectiva do desenvolvimento de novos organismos para a luta, que podem sentar as bases para a construção de potentes organizações revolucionárias. Na Brasil, aonde amplas fileiras de trabalhadores vêm se opondo ao curso neoliberal do governo Lula, com greves importantes tanto no setor industrial como nos servidores públicos, vimos como diferentes sindicatos que vêm encabeçando estas brigas e se opõem ã direção burocrática da CUT, puseram em pé coordenadoras sindicais de luta como a Conlutas.

Na Argentina, depois dos processos de ocupação de fábricas durante a crise de 2001, os trabalhadores vêm dando importantes lutas salariais, destacando-se setores antiburocráticos e combativos com forte presença de delegados de esquerda, que tem estado ã frente de algumas das greves mais importantes. Na Venezuela vimos o ressurgir de importantes lutas de trabalhadores, e depois da bancarrota da CTV por sua participação ativa no golpe oligárquico, dentro da UNT, desenvolve-se uma importante oposição ã direção oficial liderada por setores burocráticos.

Na Bolívia, nos últimos levantamentos vimos uma atividade crescente dos trabalhadores de setores chave do aparelho produtivo, e se iniciou um processo de construção de novos sindicatos entre os trabalhadores de El Alto, a cidade epicentro dos levantamentos populares.
Os processos políticos e o incipiente despertar dessa nova classe trabalhadora estão gerando maiores possibilidades para a construção de correntes revolucionárias, unidas a estes processos fundamentais dos setores avançados do movimento operário.

Por isso, é necessário lutar pela fusão entre os setores avançados dos trabalhadores e as idéias do marxismo revolucionário, no caminho de construir partidos de trabalhadores revolucionários dotados de um programa marxista que lutem pela auto-organização política do proletariado com a mais plena independência em relação ã ordem burguesa, e pela hegemonia operária no seio das classes exploradas estabelecendo uma aliança com os camponeses pobres e os restantes setores oprimidos, desenvolvendo e generalizando os organismos democráticos de luta que crêem nas próprias massas mobilizadas e direção ao poder operário e das massas.

Reafirmamos a necessidade da construção de partidos revolucionários, para a organização permanente dos setores politicamente mais avançados do movimento operário e a intelectualidade marxista revolucionária, contra aqueles que diluem as fronteiras entre o reformismo e a revolução, apostando que “o movimento é tudo” ou os que se recusam de maneira “autonomista” a necessidade da organização política idealizando a espontaneidade pura. Precisamente porque a classe trabalhadora não é absolutamente homogênea, senão que mostra uma ampla diversidade social e política, e porque nos acontecimentos revolucionários decisivos precisará de uma vontade política concentrada é imprescindível ã construção de um partido centralizado que possa ajudar ã classe a unir suas fileiras, a tomar em suas próprias mãos o conjunto dos problemas da sociedade e a se preparar como classe dirigente, para acaudilhar a rebelião das massas oprimidas e exploradas do campo e da cidade para seu próprio poder.

Acompanhar e participar ativamente as lutas operárias e dos explorados nos países nos quais militamos por uma estratégia que proponha a necessidade da auto-organização independente e democrática dos trabalhadores passa também pelo internacionalismo revolucionário, lutando pela construção do Estado maior dos explorados e oprimidos do mundo, o Partido Mundial da Revolução Socialista. Esta é a perspectiva que defende a FT-QI e o debate que pretendemos abrir com todas aquelas correntes e militantes que querem lutar pelo verdadeiro socialismo do século XXI, o que dará a luz ã revolução operária e socialista mundial.

A Fração Trotskista pela Quarta Internacional (FT-QI), integrada por:
Partido de Trabalhadores pelo Socialismo (PTS), Argentina -Liga Estratégia Revolucionária - Quarta Internacional (LER-QI), Brasil - Classe Contra Classe (CCC), Chile - Liga de Trabalhadores pelo Socialismo -Contracorrente (LTS-CC), México - Liga Obreira Revolucionária pela Quarta Internacional (LOR-CI), Bolívia -, Juventude de Esquerda Revolucionária (JIR), Venezuela-, e FT Europa.

 

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