Cenas de alegria puderam ser observadas pelas ruas de Assunção depois de conhecidos os primeiros resultados que davam a vitória na disputa presidencial ao ex-bispo Fernando Lugo. Os festejos têm sua fonte no fato de que depois de 61 anos o Partido Colorado perde uma eleição. No decorrer de seis décadas o coloradismo hegemonizou o Estado e o governo sob distintas formas. Assim, desde 1954 até 1989 com a feroz ditadura do general Stroessner e desde então, o Partido Colorado, governa através de fraude eleitoral e seus representantes no poder não têm feito mais que entregar o país ao imperialismo e jogar na miséria os setores populares.
A derrota dos colorados despertou as expectativas de muitos companheiros, tanto no Paraguai como na Argentina, que vêem em um futuro governo do ex-bispo a via de uma mudança política no país. Ainda que alguns jornalistas apresentem o triunfo de Lugo como o de um progressista, o certo é que seu governo não será um governo dos trabalhadores, nem representará os interesses dos campesinos pobres e dos povos originários.
Fernando Lugo e sua Aliança Patriótica para a Mudança (APM) vêm tratar de recauchutar e, no que for possível, limpar a administração estatal e do regime dos elementos que nos últimos anos fizeram do Estado paraguaio um instrumento nada eficaz para os negócios da burguesia em seu conjunto.
O Estado paraguaio sob a tutela dos colorados já não pode representar os interesses dos agro-exportadores latifundiários, da burocracia partidária incrustada no Estado e das Forças Armadas e do empresariado provedor do Estado. Ao não poder proteger estes interesses é que as diferenças entre estes setores têm sido resolvidas mediante atentados a figuras públicas, seqüestros extorsivos e altos graus de corrupção.
Ao mesmo tempo, Lugo tenta capitalizar e canalizar um profundo e estendido descontentamento social que abarca não somente aos setores populares, mas também a amplos setores da classe média profissional que vêem frustradas suas expectativas de ascensão social.
Para isso, Lugo tem prometido levar adiante um “Grande Pacto Social, Econômico e Nacional”, ou seja, a conciliação entre os setores latifundiários e industriais e de campesinos e trabalhadores para tirar o Paraguai da crise.
Com este pacto - proposto por Lugo - longe estarão os campesinos sem terra, os povos originários e os trabalhadores de satisfazerem suas demandas mais elementares como terra, território e trabalho genuíno para todos.
Lugo e seus aliados
Lugo ganhou prestígio entre os setores populares por cumprir suas funções eclesiásticas no departamento de São Pedro, um dos mais pobres do país. Seu discurso pró reforma agrária consolidou esta simpatia. No âmbito urbano se alçou sobre suas denúncias contra a corrupção e os integrantes do Poder Judiciário como adeptos do regime. Movimentos campesinos e da sociedade civil, assim como três das centrais sindicais, formam parte de sua coalizão. Diante disto, desde o oficialato e sua imprensa, Lugo tem sido demonizado como “esquerdista” e apontado como “amigo de Chávez”.
Porém, o eixo de sua coalizão é um partido burguês pró-imperialista: o Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA). O candidato ã vice-presidente de Lugo, Frederico Franco, é um admirador confesso do conservador espanhol José Maria Aznar. O PLRA foi o partido que se opôs a Stroessner, ainda que sempre buscando uma saída negociada com a ditadura. Está integrado por algumas das mais tradicionais famílias da oligarquia latifundiária e nos municípios onde governa tem sido privatizador e profundamente antioperário. O PLRA co-governou com o Partido Colorado depois do atentado ao vice-presidente Argaña em 1999, aplicando uma política neoliberal.
Quando a justiça paraguaia deixou livre Oviedo, Lugo em seu afã de consolidar uma ”frente anticolorado”, o chamou a integrar sua coalizão. O ex-golpista tratando de converter-se em árbitro da política nacional rejeitou o convite.
Na coalizão de Lugo os trabalhadores e setores campesinos não têm nenhum peso, estão subordinados aos politiqueiros profissionais que foram funcionais aos colorados nas últimas décadas.
Seu plano de governo
O Paraguai é um dos países mais pobres do continente e com grande parte de sua renda nacional proveniente do mercado informal.
Apenas conhecido seu triunfo já se tem em vista quem será o ministro da Economia de Lugo. Seu nome é Dionísio Borda. Este economista que se apresenta como “independente” tem sido ministro da Fazendo do atual presidente colorado Duarte Frutos. Borda é adepto da chamada “economia de mercado com equidade social” e propõe para salvar as empresas estatais de telefonia e de abastecimento de água potável um plano de capitalização com investimento estrangeiro (privatização) e demissões de empregados públicos.
Lugo sempre se encarregou de aclarar que sua reforma agrária será dentro dos marcos da atual constituição.
Minutos depois de serem conhecidos os resultados, o diário Ultima Hora disse que Lugo, “Tranqüilizou aos empresários (sojeiros, agricultores) ao indicar que será presidente de todos os paraguaios e que está disposto a conversar com ditos setores para ‘consensuar um país que todos nós merecemos’” (22/04/08)
Como vemos as aspirações de terra de milhares de campesinos e a ilusão de que da mão de Lugo se poderia obter esta demanda está seriamente questionada.
– Por uma política independente dos trabalhadores e explorados
Quase todos os analistas políticos coincidem em que será difícil de Lugo governar com a oposição frontal do Partido Colorado (ganhou 10 das 17 disputas em jogo), e com as expectativas que tem difundido ao redor da reforma agrária, quando seu principal aliado, o PLRA, é um partido de latifundiários. Ao mesmo tempo não se descartará desacordos com Brasil pela re-negociação do Tratado de Itaipu para conseguir um preço mais favorável do abastecimento de energia hidroelétrica paraguaia ao Brasil.
Se não prosperar o “Grande Pacto Social, Econômico e Nacional”, o governo de Lugo seguramente estará desacreditado e não poucas crises caracterizarão a sua gestão.
Estas brechas podem chegar a abrir uma grande oportunidade para que os trabalhadores e pobres do campo comecem a se organizar por suas demandas mais sentidas de forma independente. Em primeiro lugar para romper os pactos que atam e subordinam o Paraguai ao imperialismo norte-americano, como a imunidade para as tropas ianques em solo paraguaio e o fim imediato do pagamento da dívida externa.
Em segundo lugar, preparar a mobilização e ocupação de terras por uma verdadeira reforma agrária que satisfaça aos pequenos campesinos e sem terras. Para atacar os interesses dos latifundiários dos agronecócios e lutar pela estatização destes conglomerados. Nessa mobilização será fundamental preparar a autodefesa campesina frente aos seguros ataques dos latifundiários.
O legitimo sentimento de democracia política depois de décadas de regime colorado poderia ser motor da luta pelo julgamento e castigo dos militares assassinos da ditadura e mentores do Plano Condor. Pela dissolução dos serviços de inteligência e forças para-militares do coloradismo.
Os trabalhadores devem exigir de suas centrais sindicais a ruptura e toda aliança com os partidos patronais e convocar a mobilização para impor trabalho genuíno para todos e um verdadeiro plano de obras públicas que solucione para sempre o problema da moradia e da infra-estrutura para o desenvolvimento do país.
Os aliados dos trabalhadores e campesino paraguaios não são nem a OEA, a Igreja nem Chávez nem os Kirchner. Milhões de exilados econômicos paraguaios através de três gerações formam parte dos batalhões da classe trabalhadora Argentina e brasileira. É aí onde encontrarão apoio e solidariedade para dar ao Paraguai uma saída operária a crise, que somente poderá vir da mão de um governo dos trabalhadores e do povo.
Traduzido por: Felipe Lomonaco
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