FT-CI

Depois do massacre do Qana

Israel intensifica sua ofensiva militar

06/08/2006

Juan Chingo, de La Verdad Obrera

Depois do massacre de Qana e de três semanas de bombardeios aéreos e operações terrestres limitadas no sul do Líbano, na segunda-feira ã noite o Departamento de Estado dos Estados Unidos anunciou um pseudo cessar-fogo aéreo. O objetivo foi ganhar tempo frente ã comoção internacional causada pela morte de 54 civis (37 deles crianças), e lançar sua ofensiva terrestre mais importante até este momento da guerra. Não só entrou no sul do Líbano, como centenas de pára-quedistas caíram na fronteira com a Síria, ao noroeste do país. Israel aspira ganhar terreno, fazer com que o Hizbollah retroceda ao norte do rio Litani, e que em seguida estas posições sejam garantidas por uma “força de interposição”.
Esta operação estratégica e de grande escala busca reverter a relação de forças na qual, apesar de sua enorme superioridade militar Israel ainda não conseguiu deter os ataques dos mísseis lançados pelo Hizbollah sobre as cidades do norte de Israel que, inclusive, têm se intensificado. Israel redobra a ofensiva porque estava se deteriorando a capacidade de dissuasão do Estado sionista e sua imagem de invulnerabilidade, um dos pilares - junto ao apoio do imperialismo norte-americano - de sua capacidade de sobrevivência.

Ao mesmo tempo, o Hizbollah vem se fortalecendo como representante da causa nacional libanesa e com um enorme impacto nas massas árabes, sunitas e xiitas do conjunto do Oriente Médio. Este último elemento obrigou a muitos países árabes como o Egito, Jordânia e Arábia Saudita a mudar sua opinião pública inicial - de dar sinal verde aos objetivos de Israel de debilitar o Hizbollah - que passaram a condenar a destruição selvagem e deliberada do Líbano por parte de Israel. Estes governos estão preocupados com a perspectiva de que a crescente agitação interna em seus territórios não se volte contra eles, que são vistos pelas massas da região como capachos dos EUA e seu agente regional, o estado sionista. Nenhum destes elementos pode ser tolerado por Israel já que afetam qualitativamente sua segurança como estado terrorista frente as massas e estados árabes.

Uma nova fase da guerra

A guerra do Líbano está entrando em uma nova fase. Israel necessita terminar a guerra com uma redução da capacidade operativa militar do Hizbollah. Isto não significa destroçá-lo como força política, mas sim limitar sua força militar e o papel que este joga na rede política e de segurança do Líbano. Ao mesmo tempo, necessita conseguir este objetivo em um tempo curto e com poucas baixas, para não permitir que o Hizbollah reclame a vitória, independentemente das conseqüências para suas próprias forças. Por sua vez, as forças do Hizbollah, segundo distintas informações se encontrariam dispersas e concentradas em túneis e bunkers, com um aparato para longos períodos de combate.

Dessa maneira, e frente ã enorme assimetria militar, buscariam resistir aos embates da artilharia e aviação israelense a partir destas posições fortificadas, e obriga-los a um combate corpo a corpo custoso em tempo e baixas para o exército israelense. Em outras palavras, o Hizbollah parece querer forçar Israel a travar combates “casa por casa”, que favoreçam ações de guerrilha prejudicando ás Forças de Defesas do estado sionista, de maneira que este se veja obrigado a aceitar um compromisso. Se não o consegue, igualmente se configura uma vitória política na qual surja como a única força árabe que obrigou o exército sionista a uma luta de desgaste. A grande interrogante não é só os quão bem preparados estão os combatentes do Hizbollah, qual o estado e a moral de suas forças depois de três semanas de bombardeios constantes. Além disso, é chave se o repúdio aos massacres perpetrados pelo estado sionista fará com que o movimento de massas intervenha de forma superior em relação ao que tem feito até o momento. Os próximos dias começarão a dar respostas a estas perguntas.

O tempo corre contra os objetivos reacionários do Estado sionista

Os sofrimentos inauditos que as massas libanesas estão suportando, e os permanentes padecimentos das massas palestinas - sobre as quais se mantém a invasão de Gaza que já custou a vida de mais de 150 pessoas -, estão provocando um salto no ódio das massas árabes contra o Estado sionista e um crescente repúdio no mundo inteiro. Um reflexo disso é que o aiatolá Ali Al Sistani - o líder espiritual xiita -, peça chave que ainda sustenta um equilíbrio cada vez mais precário entre as forças de ocupação norte-americanas e um total descalabro no Iraque, disse que os muçulmanos não vão perdoar todos aqueles que bloqueiam um cessar-fogo no Líbano, onde Israel tem transformado as zonas xiitas em uma mostra de devastação e fogo.

O massacre de Qana pode se converter em um ponto de inflexão. Dezenas de milhares saíram ás ruas para demonstrar seu repúdio em Bruxelas (Bélgica), na Praça Trafalgar em Londres milhares denunciaram o apoio de Blair ã agressão israelense, em Paris centenas fizeram um minuto de silêncio em memória das vítimas de Qana. No Oriente Médio os protestos se multiplicaram. No Cairo (Egito) cerca de mil manifestantes cantaram slogans contra os EUA numa praça, apesar de estarem rodeados pela polícia. Em Amman (Jordânia) mais de mil marcharam ás sedes da ONU gritando “Morte a Israel” e “Abaixo, abaixo os EUA”.

Dezenas de xiitas tomaram as ruas em várias províncias do leste da Arábia Saudita desafiando a proibição de protestos públicos no reino. Centenas de mulheres protestaram na capital Síria, Damasco, algumas levando pequenos caixões simbolizando as crianças mortas. Na cidade de Kuwait centenas se juntaram do lado de fora da embaixada norte-americana exigindo seu fechamento em protesto ao apoio de Washington a Israel. Na cidade de Gaza os palestinos atacaram os centros da ONU até que o presidente Mahmoud Abbas ordenasse ã Guarda Presidencial e ã polícia dispersar o protesto. Até no Iraque ocupado os manifestantes marcharam por Sadr City em Bagdá, levando caixões denominados “Nações Unidas” e “Governos Árabes”.

Também em Israel houve mobilizações acusando o governo de “crimes de guerra”. Por realizar esta denúncia inclusive foi expulso um deputado árabe do Knesset (parlamento israelense).

Até agora os EUA têm bloqueado toda tentativa de cessar-fogo antes que se obtenha um equilíbrio “sustentável” de forças no Líbano, o que para eles significa - depois de Israel ter feito o essencial do trabalho sujo - o desarmamento do Hizbollah, seja pelo exército do Líbano ou entre este e uma força de intervenção sob a bandeira da ONU ou da OTAN. Por isso a escandalosa sessão da ONU em Nova York, na qual os Estados Unidos censuraram qualquer condenação a Israel pelo desapiedado bombardeio a Qana. Entretanto, a pressão internacional sobre a administração Bush, de seus aliados europeus e árabes, pode se converter em intolerável, sobretudo se o exército de Israel não atua com a celeridade e eficácia no campo de batalha que seu “patrão” ordena e deseja. O correr do tempo vai contra os objetivos de Israel depois que dilapidou o enorme respaldo que gozou de todos os países imperialistas e das burguesias reacionárias árabes no início deste confronto.

ONU

Depois do massacre de Qana, o Conselho geral integrado por 15 nações se reuniu em caráter de urgência a pedido do secretário geral da ONU, Kofi Annan e do primeiro-ministro libanês, Fuad Siniora, para considerar uma declaração proposta por Qatar, denominando o ataque como “deliberado” e demandando um cessar-fogo. Mas os Estados Unidos insistiram que a declaração deveria ser alterada, em linha com a sua posição, isto é que “lamenta fortemente a perda destas inocentes vidas e a matança de todos os civis neste conflito” e sublinha a urgência de “assegurar um longo, duradouro e sustentável cessar-fogo”. Por contraste, mais tarde o Conselho de Segurança com 14 votos contra 1 aprovou uma resolução apoiada pelos EUA ameaçando com sanções contra o Irã depois do 31 de agosto, se este não detém o enriquecimento de urânio e abre seu programa nuclear a inspeções internacionais. Enquanto que a resolução, negociada pelos cinco membros permanentes - EUA, Grã-Bretanha, França, China e Rússia - assim como também a Alemanha não impõem sanções imediatas, John Bolton, o embaixador norte-americano na ONU celebra o resultado.

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